segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Robert Fisk no The Independent : Egito, estertores duma ditadura

Via Esquerda.Net de Portugal

Robert Fisk andou em cima de um tanque no Cairo e descreve cenas que fazem lembrar o 25 de Abril. Mas adverte: a “libertação” do Cairo ainda tem que andar, até à consumação. A tragédia ainda não acabou.

Os tanques egípcios, os manifestantes em delírio sentados sobre eles, as bandeiras, os 40 mil manifestantes lacrimejando e gritando vivas na Praça da Liberdade e rezando à volta dos tanques, um membro da Fraternidade Muçulmana sentado entre os ocupantes do tanque. Pode-se talvez comparar à libertação de Bucareste? Subi eu também sobre um tanque de combate, e só conseguia pensar naqueles maravilhosos filmes da libertação de Paris. A apenas algumas centenas de metros dali, os guardas da segurança de Mubarak, de uniformes pretos, ainda disparavam contra manifestantes perto do ministério do Interior. Foi uma celebração selvagem de vitória histórica, os tanques de Mubarak libertando a capital de sua própria ditadura.

No mundo de pantomima de Mubarak – e de Barack Obama e Hillary Clinton em Washington –, o homem que ainda se diz presidente do Egipto deu posse a um vice-presidente cuja escolha não poderia ter sido pior, na tentativa de aplacar a fúria dos manifestantes – Omar Suleiman, chefe-negociador do Egipto com Israel e principal agente da inteligência egípcia, 75 anos de idade e muitos de contactos com Telavive e Jerusalém, além de quatro ataques cardíacos. Não se sabe de que modo esse velho apparatchik doente conseguiria enfrentar a fúria e a alegria de 80 milhões de egípcios que se vão livrando de Mubarak. Quando falei a alguns manifestantes ao meu lado, em cima do tanque, da nomeação e posse de Suleiman, houve gargalhadas.

Os soldados que conduzem os tanques, em uniforme de combate, sorridentes e às vezes aplaudindo os passantes, não fizeram qualquer esforço para apagar das laterais dos tanques os graffiti ali pintados com tinta spray. “Fora Mubarak! Vai-te embora, Mubarak!” e “Mubarak, o teu governo acabou” aparecem grafitados em praticamente todos os tanques que se vêem pelas ruas do Cairo. Sobre um dos tanques que circulavam pela Praça da Liberdade, vi um alto dirigente da Fraternidade Muçulmana, Mohamed Beltagi. Antes, andei ao lado de um comboio de tanques próximo de Garden City, subúrbio do Cairo, onde as multidões subiram aos tanques para oferecer laranjas aos soldados, aplaudindo-os como patriotas egípcios. A nomeação ensandecida e sem sentido de um vice-presidente [o primeiro, em 30 anos, e nomeação que significa que Mubarak desistiu de nomear o filho para substituí-lo no poder (NTs)] e a formação de um “novo” Gabinete sem poder algum, constituído só de velhos conhecidos dos egípcios, evidenciam que as ruas do Cairo viram e vêem o que nem os estrategistas e políticos dos EUA e da União Europeia souberam ver: que o tempo de Mubarak acabou.

As frágeis ameaças de Mubarak de que empregará repressão violenta em nome do bem-estar dos egípcios – quando já se sabe que a sua própria polícia e as suas milícias são responsáveis pelos ataques mais violentos dos últimos cinco dias – só geraram ainda mais fúria entre os manifestantes, vítimas de 30 anos de ditadura várias vezes muito violenta. Crescem as suspeitas de que os piores ataques da repressão foram executados por milícias não uniformizadas – inclusive o assassinato de 11 homens numa vila do interior do país nas últimas 24 horas –, tentativa de dividir o movimento e criar suspeitas contra as intenções democratizantes das manifestações contra o governo de Mubarak. A destruição dos centros de comunicações por grupos de homens mascarados – que se suspeita que tenha sido ordenada por alguma agência da segurança de Mubarak – também parece ter sido obra das milícias não uniformizadas que espancaram manifestantes.

Mas o incêndio de postos policiais no Cairo, Alexandria, Suez e outras cidades não foram obra daquelas milícias. No final da sexta-feira, a 40 milhas do Cairo, na estrada para Alexandria, havia grandes grupos de jovens em torno de fogueiras acesas no meio da estrada e, quando os carros paravam, eram assaltados; os assaltantes exigiam dólares, sempre muitos, em dinheiro. Ontem pela manhã, homens armados roubavam carros, de dentro dos quais arrancavam motoristas e passageiros, no centro do Cairo.

Infinitamente mais terrível foi o vandalismo contra o Museu Nacional do Egipto. Depois que a polícia abandonou o serviço de segurança do museu, houve invasão de saqueadores e vândalos, que roubaram ou destruíram peças de 4 mil anos, múmias e peças de madeira esculpida de valor inestimável – barcos, esculpidos com todos os detalhes e a tripulação, miniaturas magníficas, feitas para acompanhar os faraós na viagem pós-morte. Montras que protegiam trajes milenares foram quebradas, os guardas pintados de preto arrancados e depredados. Outra vez, é preciso registar que há boatos de que os próprios polícias destruíram o museu, antes de fugir na sexta-feira à noite. Lembrança fantasmagórica do museu de Bagdade em 2003. Bagdade foi pior, a destruição foi mais total, mas mesmo assim foi terrível o desastre do museu do Cairo.

Em minha jornada nocturna da Cidade 6 de Outubro até a capital, tive de diminuir a velocidade várias vezes, porque a estrada está cheia de restos de veículos queimados. Havia destroços e vidros partidos pela estrada, e muitos polícias armados, com espingardas apontadas para os faróis do meu carro. Vi um jipe semi-destruído. Os restos do equipamento da polícia antitumulto que os manifestantes expulsaram da cidade do Cairo na sexta-feira. Os mesmos manifestantes que, ontem à noite, formavam círculo gigantesco em torno da Praça da Liberdade para rezar. Gritos de “Allah Alakbar” trovejavam pela cidade no ar da noite.

Há também quem clame por vingança. Uma equipa de jornalistas da rede al-Jazira encontrou 23 cadáveres em Alexandria, aparentemente assassinados pela polícia. Vários tinham os rostos horrivelmente mutilados. Outros onze cadáveres foram encontrados no Cairo, cercados por parentes que gritavam por vingança contra a polícia.

No momento, o Cairo salta em minutos da alegria para a mais terrível fúria. Ontem pela manhã, andei pela ponte do rio Nilo e vi as ruínas do prédio de 15 andares onde funcionava a sede do partido de Mubarak, que foi incendiado. À frente, um imenso cartaz pregava os benefícios que o partido trouxe ao Egipto – imagens de estudantes formados bem sucedidos, médicos e pleno emprego, promessas que o governo de Mubarak sempre repetiu e jamais cumpriu em 30 anos – emoldurados pela fuligem, semi-queimados, pendentes das janelas enegrecidas do prédio. Milhares de egípcios andavam pela ponte e pelos acessos laterais para fotografar o prédio ainda fumegante – e muitos saqueadores, a maioria velhos, que tiravam de lá mesas e cadeiras.

No instante em que uma equipe de televisão escocesa se preparava para filmar as mesmas cenas, foi cercada por várias pessoas que disseram que não tinham o direito de filmar os incêndios, que os egípcios são povo orgulhoso que não roubaria nem saquearia. O assunto foi discutido várias vezes ao longo do dia: se a imprensa teria ou não o direito de divulgar imagens sobre essa “libertação”, que veiculassem ideias menos dignas do movimento. Mesmo assim, os manifestantes mantinham-se cordiais e – apesar das declarações acovardadas de Obama, na sexta-feira à noite – não se viu nenhum, nem qualquer mínimo sinal de hostilidade contra os EUA. “Tudo o que queremos, tudo, exclusivamente, é que Mubarak vá-se daqui, que haja eleições, que nos devolvam a liberdade e a honra” – disse-me uma psiquiatra de 30 anos. Por trás dela, multidões de jovens limpavam o leito da rua, removendo restos de veículos e barreiras postas nas intersecções e esquinas – releitura irónica do conhecido ditado egípcio, de que os egípcios nunca varrerão as próprias ruas.

A alegação de Mubarak, de que as actuais manifestações e actos de delinquência – a combinação foi tema do discurso em que Mubarak declarou que não deixaria o Egipto – seriam parte de um “plano sinistro” é evidentemente o núcleo de seu argumento, na tentativa de não perder o reconhecimento mundial.

De facto, a própria resposta de Obama – sobre a necessidade de reformas e o fim da violência – foi cópia exacta de todas as mentiras que Mubarak sempre usou para defender o seu governo durante 30 anos. Os egípcios riram de Obama – inclusive no Cairo, depois de eleito – quando exigiu que os árabes abraçassem a liberdade e a democracia. Mas até essas aspirações sumiram completamente quando, na sexta-feira, Obama assegurou o seu desconfortável e incomodado apoio ao presidente egípcio. O problema é o de sempre: as linhas do poder e as linhas da moralidade em Washington jamais convergem quando os presidentes dos EUA têm de lidar com o Médio Oriente. A liderança moral dos EUA cessa de existir quando há confronto declarado entre o mundo árabe e Israel.

E o exército egípcio, desnecessário lembrar, é parte da equação. Recebe de Washington mais de 1.300 milhões de dólares de auxílio anual. O comandante desse exército, general Tantawi – que casualmente estava em Washington, quando a polícia tentava esmagar os manifestantes – sempre foi muito amigo, pessoal, íntimo, de Mubarak. Não é bom sinal, parece, pelo menos no futuro imediato.

Assim, a “libertação” do Cairo – onde houve notícias, ontem à noite, de saques no hospital Qasr al-Aini – ainda tem que andar, até à consumação. O fim pode ser claro. A tragédia ainda não acabou.

Robert Fisk é o correspondente estrangeiro britânico mais premiado. Ele recebeu o Prêmio Correspondente Internacional Britânico do Ano sete vezes (as últimas em 1995 e 1996). Também ganhou o Prêmio à Imprensa da Anistia Internacional no Reino Unido em 1998 e 2000. É considerado um dos maiores especialistas nos conflitos do Oriente Médio. Atualmente trabalha para o The Independent de Londres.

domingo, 30 de janeiro de 2011

Música do Domingo -- Sessão Led Zeppelin (Em homenagem a Marcelo Tartarini)

Nesse fim de semana ganhei de Marcelo Tartarini, meu mais que cunhado, mas sim irmão que a vida me deu, o livro “História Ilustrada, Led Zeppelin” da editora Escala. O livro é uma biografia com inúmeras fotos focada na trajetória daquela que consideramos a maior banda de rock de todos os tempos

Para agradecer ao Marcelo e curtir um pouco de música de qualidade aqui vai alguns vídeos do monumental concerto realizado pelo Led em 1973 no Madison Square Garden. As cenas fazem parte do ótimo documentário “The Song Remains The Same”, lançado em 1976.



















sábado, 29 de janeiro de 2011

O que você não lê na mídia oligopolizada: Sem-terra inocentados no caso Cutrale

Pescado do Escrevinhador

Caso Cutrale: trabalhadores sem-terras são inocentados e processo é arquivado

Por Juliana Sada

Em janeiro deste ano, a Justiça decidiu pela libertação dos trabalhadores sem-terra acusados de praticar crimes durante a ocupação de uma fazenda na qual está instalada a empresa Cutrale, produtora de suco de laranja. Além disso, o processo foi arquivado pela 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

De acordo com o desembargador Luis Pantaleão, em seu relatório, não havia indícios que ligassem os acusados aos crimes alegados. Além disso, o desembargador citou problemas no processo. A prisão preventiva foi decretada antes do recebimento da denúncia e ainda com a investigação em curso, para o desembargador não havia indícios de que os acusados trariam algum empecilho ao processo. O encarceramento foi baseado também na suposta “imoralidade” dos trabalhadores, acusação que não sustenta a prisão preventiva.

Já o processo foi trancado por inépcia da denúncia, ou seja, por não possuir os requisitos legais para instauração de um processo.

A ocupação


Em setembro de 2009, cerca de 250 famílias ocuparam uma fazenda pertencente à Cutrale, para denunciar a grilagem de terras pela empresa. De acordo com o MST, a área ocupada pertence à União e a Cutrale estaria se apropriando ilegalmente da terra. A ocupação durou doze dias, entre 28 de setembro e nove de outubro, e terminou por ordem judicial.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Tucano em habitat natural

Durante a última campanha eleitoral o PSDB por diversas vezes acusou o PT de fazer um jogo político espúrio cujo objetivo era instigar a divisão de classes no Brasil. O PSDB dizia que era irresponsabilidade do Partido dos Trabalhadores e, sobretudo do ex-presidente Lula, querer dividir o Brasil em dois: o dos ricos e o dos pobres. Tudo isso como senão fosse outro barbudo, e não Lula, o responsável por decifrar a luta de classes ainda em meados do século XIX.

Os tucanos, ou pelo menos sua “elite” – FFHH, Covas, Montoro, Serra, Jereissati, Aécio, Alckmin, Aloysio Nunes, Bresser Pereira, Pimenta da Veiga ... –, sempre gostaram de posar de finos, educados, letrados e legítimos filhos do que há de (sic) melhor na sociedade tupiniquim. Se por acaso algum teve a desventura de nascer em seio de família sem recursos, não se fez de rogado e através do esforço e dedicação chegou aonde era seu lugar por predestinação.

Na visão tucana a divisão de classes simplesmente não existe porque ela é natural, ela é inata a todas as sociedades. Isso mostra um sério problema: o quão o PSDB tem dificuldade em dialogar com a sociedade em sua essência. Bem diferente de Lula, para quem é algo natural amassar barro, beijar crianças e idosos, comer pastel no boteco da esquina ou implementar programas sociais capazes de tirar vinte milhões de brasileiros da pobreza.

Outro problema sério para o PSDB é que a pose a qual os tucanos estão acostumados parece não agradar a imensa maioria da população dum país cujo cidadão, para usar uma linguagem popular, vende o almoço para comprar o jantar. Então se faz necessário, ao menos em tempos de campanha eleitoral, sair dos gabinetes e escritórios e ir amassar barro, beijar crianças e idosos, comer pastel no boteco da esquina.

Não obstante, inclusive durante períodos eleitorais, os tucanos gostam de mostrar que não são da mesma verve que os simples mortais. FFHH, o deão do tucanato e exemplo acabado do jeito tucano de ser/agir, na campanha de 1994 em pleno sertão pernambucano, confidenciou a um grupo de camponeses que havia perdido sua "cátedra" na USP durante o regime militar! Façamos um exercício de imaginação para descobrir o que aqueles camponeses castigados pelo sol e seca pensaram se tratar de "cátedra".

Agora imaginemos outra situação. O primeiro-ministro francês, britânico ou sueco inaugurando o ano letivo numa escola da rede privada. A menos que eu esteja muito enganado, e posso estar, a repercussão seria extremamente negativa gerando verdadeira estupefação na sociedade local. Afinal esses países há muito tempo que tratam a Educação como prioridade e, portanto, dispõem de polítcas que sabem valorizar tanto educando quanto educador na rede pública. Aliás, nesses países a rede pública de Ensino é parâmetro para as demais.

Mas não é na lógica de tratar a Educação pública como prioridade que age o cérebro dum governante tucano e passada a campanha com a eleição ganha ele pode enfim retornar ao seu habitat natural no meio da elite da qual faz parte.

E assim agiu o governador de São Paulo Geraldo Alckmin ao escolher uma escola da rede privada de ensino para inaugurar o ano letivo de 2011. Obviamente não é uma escola qualquer. O Colégio Dante Alighieri, o escolhido, cobra uma mensalidade de R$1751,00, valor pouco acima da média salarial do professor no Brasil – R$1745,00. Por aí dá para notar o naipe dos pais que bancam o colégio.

O Dante Alighieri, mesmo cobrando uma mensalidade que é mais do triplo do salário mínimo, ficou em 181° no ENEM 2009. O que não deixa de ser uma bela posição. Todavia ficou atrás da Escola Técnica Estadual de São Paulo (116°), do Colégio Técnico e Industrial da UNESP de Guaratinguetá (178°) e da Escola Técnica Estadual Presidente Vargas de Mogi das Cruzes (179°), todas sob responsabilidade da Secretaria de Educação paulista.

Por que cargas d'água Alckmin não prestigiou uma dessas instituições? Talvez porque nessas escolas o tucano não estivesse em seu habitat natural.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Criador do WikiLeaks conversa com internautas brasileiros

Mesmo me sentindo um pouco desconfortável com a figura de Julian Assange, por controversa que é, outro dia participei dum programa na TV Plan daqui de Poços e falei sobre o papel que o WikiLeaks teve na derrubada do ex-presidente tunisiano Ben Ali.

Também tenho um receio, tanto quanto inexplicável, pelo criador do WikiLeaks. Talvez este receio seja pelo fato de Assange escolher Folha de S. Paulo e O Globo como parceiros no Brasil para a divulgação dos documentos vazados, e por Assange se mostrar bastante nebuloso, não dando para decifrar o que tem em mente. Talvez.

Entretanto é fato que os dados revelados até agora pelo WikiLeaks tornam os bastidores das relações tanto exterior quanto interior dos Estados mais transparentes, ainda que essa transparência aconteça à revelia do próprio.

A suposta revolução que o WikiLeaks vem fazendo nessas relações me lembra a utopia de Trotsky após a tomada do poder pelos blocheviques: abolição completa da diplomacia secreta, todos os tratados e acordos acessíveis a cada operário e a cada camponês – aqui não posso deixar de citar e recomendar a leitura de “10 dia que abalaram o Mundo” do jornalista estadunidense John Reed.

De qualquer modo, o WiiLeaks vem promovendo um importante debate sobre as relações internacionais, mas também, e isso considero de longe o mais importante até aqui, vem tornando aos poucos um assunto que antes era de interesse restrito em interesse popular, ainda que de início esse interesse seja apenas curiosidade.

A entrevista que segue pesquei do Blog do Rovai.

Entrevista organizada por Natália Viana

“Não somos uma organização exclusivamente da esquerda. Somos uma organização exclusivamente pela verdade e pela justiça”. Essa é apenas uma das muitas afirmações feitas pelo fundador e publisher do WikILeaks, Julian Assange, em entrevista aos internautas brasileiros.

A entrevista será publicada por diversos blogs – entre eles, o Blog doNassif, Viomundo, Nota de Rodapé, Maria Frô, Trezentos, O Escrevinhador e Blog do Guaciara.

Julian, que enfrenta um processo na Suécia por crimes sexuais e atualmente vive sob monitoramento em uma mansão em Norfolk, na Inglaterra, concedeu a entrevista para internautas que enviaram perguntas a este blog.

Eu selecionei doze perguntas dentre as cerca de 350 que recebi – e não foi fácil. Acabei privilegiando perguntas muito repetidas, perguntas originais e aquelas que não querem calar. Infelizmente, nem todos foram contemplados. Todas as perguntas serão publicadas depois.

No final, os brasileiros não deram mole para o criador do WikiLeaks. Julian teve tempo de responder por escrito e aprofundar algumas questões.

O resultado é uma entrevista saborosa na qual ele explica por que trabalha com a grande mídia – sem deixar de criticá-la -, diz que gostaria de vir ao Brasil e sentencia: distribuir informação é distribuir poder.

Em tempo: se virasse filme de Hollywood, o editor do WikiLeaks diz que gostaria de ser interpretado por Will Smith.

A seguir, a entrevista.


Vários internautas - O WikiLeaks tem trabalhado com veículos da grande mídia – aqui no Brasil, Folha e Globo, vistos por muita gente como tendo uma linha política de direita. Mas além da concentração da comunicação, muitas vezes a grande mídia tem interesses próprios. Não é um contra-senso trabalhar com eles se o objetivo é democratizar a informação? Por que não trabalhar com blogs e mídias alternativas?

Por conta de restrições de recursos ainda não temos condições de avaliar o trabalho de milhares de indivíduos de uma vez. Em vez disso, trabalhamos com grupos de jornalistas ou de pesquisadores de direitos humanos que têm uma audiência significativa. Muitas vezes isso inclui veículos de mídia estabelecidos; mas também trabalhamos com alguns jornalistas individuais, veículos alternativos e organizações de ativistas, conforme a situação demanda e os recursos permitem.
Uma das funções primordiais da imprensa é obrigar os governos a prestar contas sobre o que fazem. No caso do Brasil, que tem um governo de esquerda, nós sentimos que era preciso um jornal de centro-direita para um melhor escrutínio dos governantes. Em outros países, usamos a equação inversa. O ideal seria podermos trabalhar com um veículo governista e um de oposição.



Marcelo Salles –
Na sua opinião, o que é mais perigoso para ademocracia: a manipulação de informações por governos ou a manipulação de informações por oligopólios de mídia?

A manipulação das informações pela mídia é mais perigosa, porque quando um governo as manipula em detrimento do público e a mídia é forte, essa manipulação não se segura por muito tempo. Quando a própria mídia se afasta do seu papel crítico, não somente os governos deixam de prestar contas como os interesses ou afiliações perniciosas da mídia e de seus donos permitem abusos por parte dos governos. O exemplo mais claro disso foi a Guerra do Iraque em 2003, alavancada pela grande mídia dos Estados Unidos.


Eduardo dos Anjos - Tenho acompanhado os vazamentos publicados pela sua ONG e até agora não encontrei nada que fosse relevante, me parece que é muito barulho por nada. Por que tanta gente ao mesmo tempo resolveu confiar em você? E por que devemos confiar em você?

O WikiLeaks tem uma história de quatro anos publicando documentos. Nesse período, até onde sabemos, nunca atestamos ser verdadeiro um documento falso. Além disso, nenhuma organização jamais nos acusou disso. Temos um histórico ilibado na distinção entre documentos verdadeiros e falsos, mas nós somos, é claro, apenas humanos e podemos um dia cometer um erro. No entanto até o momento temos o melhor histórico do mercado e queremos trabalhar duro para manter essa boa reputação. Diferente de outras organizações de mídia que não têm padrões claros sobre o que vão aceitar e o que vão rejeitar, o WikiLeaks tem uma definição clara que permite às nossas fontes saber com segurança se vamos ou não publicar o seu material. Aceitamos vazamentos de relevância diplomática, ética ou histórica, que sejam documentos oficiais classificados ou documentos suprimidos por alguma ordem judicial.


Vários internautas -
Que tipo de mudança concreta pode acontecer como consequência do fenômeno Wikileaks nas práticas governamentais e empresariais? Pode haver uma mudança na relação de poder entre essas esferas e o público?

James Madison, que elaborou a Constituição americana, dizia que o conhecimento sempre irá governar sobre a ignorância. Então as pessoas que pretendem ser mestras de si mesmas têm de ter o poder que o conhecime nto traz. Essa filosofia de Madison, que combina a esfera do conhecimento com a esfera da distribuição do poder, mostra as mudanças que acontecem quando o conhecimento é democratizado. Os Estados e as megacorporações mantêm seu poder sobre o pensamento individual ao negar informação aos indivíduos. É esse vácuo de conhecimento que delineia quem são os mais poderosos dentro de um governo e quem são os mais poderosos dentro de uma corporação. Assim, o livre fluxo de conhecimento de grupos poderosos para grupos ou indivíduos menos poderosos é também um fluxo de poder, e portanto uma força equalizadora e democratizante na sociedade.


Marcelo Träsel - Após o Cablegate, o Wikileaks ganhou muito poder. Declarações suas sobre futuros vazamentos já influenciaram a bolsa de valores e provavelmente influenciam a política dos países citados nesses alertas. Ao se tornar ele mesmo um poder, o Wikileaks não deveria criar mecanismos de auto-vigilância e auto-responsabilização frente à opinião pública mundial?


O WikiLeaks é uma das organizações globais mais responsáveis que existem. Prestamos muito mais contas ao público do que governos nacionais, porque todo fruto do nosso trabalho é público. Somos uma organização essencialmente pública; não fazemos nada que não contribua para levar informação às pessoas. O WikiLeaks é financiado pelo público, semana a semana, e assim eles “votam” com as suas carteiras. Além disso, as fontes entregam documentos porque acreditam que nós vamos protegê-las e também vamos conseguir o maior impacto possível. Se em algum momento acharem que isso não é verdade, ou que estamos agindo de maneira antiética, as colaborações vão cessar. O WikiLeaks é apoiado e defendido por milhares de pessoas generosas que oferecem voluntariamente o seu tempo, suas habilidades e seus recursos em nossa defesa. Dessa maneira elas também “votam” por nós todos os dias.


Daniel Ikenaga -
Como você define o que deve ser um dado sigiloso?

Nós sempre ouvimos essa pergunta. Mas é melhor reformular da seguinte maneira: “quem deve ser obrigado por um Estado a esconder certo tipo de informação do resto da população?” A resposta é clara: nem todo mundo no mundo e nem todas as pessoas em uma determinada posição. Assim, o seu medico deve ser responsável por manter a confidencialidade sobre seus dados na maioria das circunstâncias – mas não em todas.


Vários internautas -
Em declarações ao Estado de São Paulo, você disse que pretendia usar o Brasil como uma das bases de atuação do WikiLeaks. Quais os planos futuros? Se o governo brasileiro te oferecesse asilo político, você aceitaria?

Eu ficaria, é claro, lisonjeado se o Brasil oferecesse ao meu pessoal e a mim asilo político. Nós temos grande apoio do público brasileiro. Com base nisso e na característica independente do Brasil em relação a outros países, decidimos expandir nossa presença no país. Infelizmente eu, no momento, estou sob prisão domiciliar no inverno frio de Norfolk, na Inglaterra, e não posso me mudar para o belo e quente Brasil.


Vários internautas -
Você teme pela sua vida? Há algum mecanismo de proteção especial para você? Caso venha a ser assassinado, o que vai acontecer com o WikiLeaks?

Nós estamos determinados a continuar a despeito das muitas ameaças que sofremos. Acreditamos profundamente na nossa missão e não nos intimidamos nem vamos nos intimidar pelas forças que estão contra nós. Minha maior proteção é a ineficácia das ações contra mim. Por exemplo, quando eu estava recentemente na prisão por cerca de dez dias, as publicações de documentos continuaram. Além disso, nós também distribuímos cópias do material que ainda não foi publicado por todo o mundo, então não é possível impedir as futuras publicações do WikiLeaks atacando o nosso pessoal.


Helena Vieira -
Na sua opinião, qual a principal revelação do Cablegate? A sua visão de mundo, suas opiniões sobre nossa atual realidade mudou com as informações a que você teve acesso?

O Cablegate cobre quase todos os maiores acontecimentos, públicos e privados, de todos os países do mundo – então há muitas revelações importantíssimas, dependendo de onde você vive. A maioria dessas revelações ainda está por vir. Mas, se eu tiver que escolher um só telegrama, entre os poucos que eu li até agora – tendo em mente que são 250 mil – seria aquele que pede aos diplomatas americanos obter senhas, DNAs, números de cartões de crédito e números dos vôos de funcionários de diversas organizações – entre elas a ONU. Esse telegrama mostra uma ordem da CIA e da Agência de Segurança Nacional aos diplomatas americanos, revelando uma zona sombria no vasto aparato secreto de obtenção de inteligência pelos EUA.


Tarcísio Mender e Maiko Rafael Spiess -
Apesar de o WikiLeaks ter abalado as relações internacionais, o que acha da Time ter eleito Mark Zuckerberg o homem do ano? Não seria um paradoxo, você ser o “criminoso do ano”, enquanto Mark Zuckerberg é aplaudido e laureado?

A revista Time pode, claro, dar esse título a quem ela quiser. Mas para mim foi mais importante o fato de que o público votou em mim numa proporção vinte vezes maior do que no candidato escolhido pelo editor da Time. Eu ganhei o voto das pessoas, e não o voto das empresas de mídia multinacionais. Isso me parece correto. Também gostei do que disse (o programa humorístico da TV americana) Saturday Night Live sobre a situação: “Eu te dou informações privadas sobre corporações de graça e sou um vilão. Mark Zuckerberg dá as suas informações rivadas para corporações por dinheiro – e ele é o ‘Homem do Ano’.” Nos bastidores, claro, as coisas foram mais interessantes, com a facção pró- Assange dentro da revista Time sendo apaziguada por uma capa bastante impressionante na edição de 13 de dezembro, o que abriu o caminho para a escolha conservadora de Zuckerberg algumas semanas depois.


Vinícius Juberte - Você se considera um homem de esquerda?

Eu vejo que há pessoas boas nos dois lados da política e definitivamente há pessoas más nos dois lados. Eu costumo procurar as pessoas boas e trabalhar por uma causa comum. Agora, independente da tendência política, vejo que os políticos que deveriam controlar as agências de segurança e serviços secretos acabam, depois de eleitos, sendo gradualmente capturados e se tornando obedientes a eles. Enquanto houver desequilíbrio de poder entre as pessoas e os governantes, nós estaremos do lado das pessoas. Isso é geralmente associado com a retórica da esquerda, o que dá margem à visão de que somos uma organização exclusivamente de esquerda. Não é correto. Somos uma organização exclusivamente pela verdade e justiça – e isso se encontra em muitos lugares e tendências.

Ariely Barata - Hollywood divulgou que fará um filme sobre sua trajetória. Qual sua opinião sobre isso?

Hollywood pode produzir muitos filmes sobre o WikiLeaks, já que quase uma dúzia de livros está para ser publicada. Eu não estou envolvido em nenhuma produção de filme no momento. Mas se nós vendermos os direitos de produção, eu vou exigir que meu papel seja feito pelo Will Smith. O nosso porta-voz, Kristinn Hrafnsson, seria interpretado por Samuel L Jackson, e a minha bela assistente por Halle Berry. E o filme poderia se chamar “WikiLeaks Filme Noire”.

sábado, 22 de janeiro de 2011

Alckmin vem aí

Pois é gente, a vida anda, o mundo gira e a lusitana roda. Mal acabou a campanha presidencial mais baixa de nossa história e ainda falta uma semana para o governo Dilma completar um mês, mas os primeiros sinais da campanha rumo ao Planalto 2014 já apareceram.

Algumas noticias veiculadas pela imprensa durante a semana deixam claro o quão os tucanos estão divididos no seu projeto (legitimo, diga-se de passagem) de retorno ao poder após longos (para eles) doze anos.

Na verdade existe um trilátero disputando a hegemonia dentro do PSDB.

De um lado o ex-governador e presidenciável derrotado José Serra se agarra àquela parcela nada desprezível da mídia oligopolizada que sempre lhe foi favorável em torno dum projeto de oposição aos moldes do “Tea Party” estadunidense. Livre das obrigações que um mandato executivo impõe, tal como o relacionamento em termos civilizados entre as instituições republicanas, enfim José Serra pode fazer uma oposição declarada – coisa que se absteve de fazer, ao menos diante das câmeras, ao longo da recém-findada campanha.

Por enquanto Serra está apenas testando formas de como essa oposição reacionária agirá e acertando o tom da retórica. Exemplo disso é culpar os gastos do governo pelo aumento da taxa de juros, coisa que os sabujos da mídia neoliberal adoram, ou encontrar na incompetência do governo federal a responsabilidade única pela hecatombe ocorrida na região serrana do Rio de Janeiro. Provavelmente dentro em pouco tempo Serra no afã de buscar espaço na mídia oligopolizada (ou Partido do Capital como Gramsci a definia) chamará Dilma de terrorista e não lhe faltarão Índio da Costa ou tropa neointegralista para usar de caixa de ressonância.

De outro lado temos Aécio Neves, seja em pessoa ou na figura de seu “boneco de ventríloquo” o governador mineiro Antonio Anastasia, propondo uma oposição light. Ou como os tucanos ligados a Aécio adoram jactar: uma “oposição propositiva”. Mas ser propositivo já não é inerente ao papel de uma agremiação política? Parece que não é bem assim que pensam Aécio e aliados. Oposição light e propositiva é uma forma eufemística encontrada por Aécio para firmar um pacto entre seus interesses em Minas e a governabilidade do país. Entretanto em algum momento no futuro Aécio será impelido a se posicionar com mais contundência caso de fato almeje a Presidência da República e para que possa por em prática o “pós-lulismo” – como poderá existir “pós-lulismo” se a oposição se negar a superar o “lulismo”? O sociólogo FFHH bem que poderia ajudar o neto de Tancredo a explicar isso.

Portanto, embora Aécio já tenha demonstrado qualidades de estrategista, o modo Aécio de fazer oposição e buscar hegemonia dentro do PSDB carece de ímpeto oposicionista. No mais, por mais que Aécio aposte no desgaste da coalizão que ora ocupa o governo federal – e isso de certo modo faz sentido – falta-lhe a confiança do PSDB paulista e algo que já se mostrou essencial na última pré-campanha, o apoio da mídia oligoplizada concentrada, justamente, em São Paulo.

Do último lado de trilátero está o governador Geraldo Alckmin e quase todo o tucanato paulista, que é quem de fato detêm poder dentro do PSDB. Esse grupo tem arquitetado estratégias no objetivo de romper com o legado deixado por José Serra e enfraquecê-lo onde era forte: entre os donos da mídia. Nesse esforço cabem tanto críticas pontuais ao governo federal em dados momentos como busca por parcerias com o mesmo, o que fica claro no encontro entre Alckmin e o ministro da Justiça – e um dos homens de confiança da Presidenta Dilma – José Eduardo Cardozo para tratarem do tema segurança pública.

Também faz parte da estratégia alckmista alimentar projetos sociais que possam distinguir o modo tucano- alckmista de governar dos modos tucano-serrista e tucano-aecista. Além disso, não me surpreenderá se Alckmin, tido e havido como o mais insosso dos tucanos, se dispuser a realizar um governo populista, aliás, não podemos esquecer que o ex-prefeito de Pindamonhangaba acabou se tornando herdeiro do populismo de direita à la Adhemar de Barros, Jânio Quadros e Paulo Maluf com o qual os paulistas sempre simpatizaram.

Não obstante as pretensões de Alckmin, que tanto pode novamente tentar o Palácio do Planalto ou o dos Bandeirantes em 2014, houve uma discussão entre os pessedebistas sobre quem seria a ave de alta plumagem a protagonizar o primeiro programa de tv do partido que irá ao ar em fevereiro. Chegou-se a conclusão que melhor seria não dar espaço nem a Aécio nem a Serra, mas sim aos oito governadores eleitos pelo PSDB em outubro passado. Por acaso Alckmin está entre esses governadores.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Guilherme Scalzilli -- Cinzeiro de motocicleta

O ótimo Guilherme Scalzilli assina esse pequeno, porém lúcido, texto em seu blog.

Agora que se cogita levar ao STF um dos criadores da Lei da Ficha Limpa, talvez seja útil fazer um balanço frio e realista da iniciativa. Aliás, é curioso como faltam informações a respeito.

Sabemos, por exemplo, que foram cerca de duzentas as candidaturas cassadas em todo o país. Mas quantos vetos ocorreram por irregularidades burocráticas e quantos foram por sérios indícios de corrupção ou desvios legais relevantes? Será que existem suficientes condenações para compensar cada Paulo Maluf absolvido? É possível confiar numa canetada que impede a posse de João e Janete Capiberibe, mas auxilia Geraldo Alckmin a livrar-se do segundo turno?

E a quem interessa conferir tamanhos poderes a esse Judiciário putrefeito, desmoralizado e insuficiente?

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Creedence Clearwater Revival

Os estadunidenses “inventaram” o rock em meados da década de 1950, mas quem melhor soube explorar todo o potencial artístico daquele novo tipo de som foram os britânicos. Pelo menos as melhores bandas sempre foram britânicas. Principalmente a partir da “britsh invasion”. Quase dez anos após a “invenção” do rock o que se viu foi os ingleses tomando conta da cena rock nos EEUU e no Mundo.

Curioso é que por volta de 1964/65 os Beatles estouravam nos EEUU, mas em sua terra natal era o estadunidense Bob Dylan que liderava as paradas de sucesso – sobre isso leia o livro “O que é Rock”, de Paulo Chacon.

Mas no final dos anos 1960 enfim apareceu uma banda estadunidense capaz, pelo menos por algum tempo, de rivalizar com a hegemonia britânica. O Creedence Clearwater Revival . Nenhuma banda oriunda dos EEUU fez tanto sucesso durante a “britsh invasion” quanto o quarteto de El Cerrito (Califórnia).

O Creedence estourou com um estilo musical parido num ambiente psicodélico regado a rhythm & blues, folk , e muito rockabily mergulhado profundamente no country e com letras que invariavelmente descreviam o Sul Profundo de seu país, um dos motivos desse estilo peculiar ter ganhado a alcunha de “swamp rock” (rock do pântano). Assim conseguiram a proeza de entre 1968 e 1972 lançarem sete álbuns de estúdio e paparem nada menos que seis discos de platina e um de ouro.

Tudo isso se deveu principalmente a John Fogerty, seja pelo seu talento na interpretação vocal ou na guitarra, seja pelo fato de ser um dos mais geniais compositores de sua geração (e olha que estou falando da principal geração do rock’n’roll!!!).

Também faziam parte do Creedence o irmão mais velho de John, Tom Fogerty (guitarra e vocais), Stu Cook (baixo) e Doug Clifford (um dos melhores bateristas de todos os tempos).

O sonho acabou para o Creedence em 1972 quando a banda dissolveu definitivamente, um ano após Tom tê-la abandonado. Os antigos integrantes então passaram, entre uma disputa judicial e outra, a seguirem outros projetos sendo que John conseguiu relativo sucesso em carreira solo. Tom morreu vitima de AIDS em 1990 e em 1995 Doug Clifford e Stu Cook formaram o genérico Creedence Clearwater Revisited passando a excursionar pelo mundo.



















sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Sarah Palin e o “libelo de sangue”

Não satisfeita com o sangue derramado em Tucson no último sábado, Sarah Palin apelou para o antissemitismo como forma de se defender das acusações de que ela e seus companheiros de convescote, o Tea Party, terem sido mentores intelectuais do atentado que matou 6 pessoas e feriu outras 14.

Entre os assassinados está uma menina de nove anos e um juiz federal. Já a congressista democrata, a primeira judia eleita para o Congresso pelo estado do Arizona, Gabrielle Giffords continua internada em estado grave, embora tenha apresentado sinais de progresso em sua recuperação.

Num vídeo postado no YouTube Palin usa a expressão “libelo de sangue” para se referir a uma suposta armação da imprensa, de políticos democratas e grupos progressistas no intuito de ligá-la ao derramamento de sangue em Tucson.

Segundo a Folha de São Paulo e de acordo com o dicionário Oxford de religiões do mundo, "blood libel" (libelo de sangue) se refere à tradição quando os judeus usavam o sangue de cristãos, particularmente de crianças, em seus rituais de Páscoa. Esse hábito se estendeu durante a Idade Média e acarretou massacres de judeus.
Também foi um termo amplamente usado na propaganda antissemita durante a Segunda Guerra (1939-1945).

Apenas uma mente doentia e mal intencionada pode fazer crer que não há ligação entre a retórica ultranacionalista e o recente atentado em Tucson. Como bem notou o cientista político argentino Atilio Borón: “não existe a menor intenção de vincular o ocorrido em Tucson com as tendências profundas da sociedade estadunidense, que periodicamente afloram com mais virulência e força”, e eu completo: o Tea Party é, no momento, sintoma dessas tendências.

O fato é que os EEUU vivem um momento delicado de sua história com uma crise econômico-financeira ainda mal compreendida, mas que também perpassa por (ou seria reflexo de???)outras crises em várias instituições devotadas pelo estadunidense médio. Para alguns os EEUU estão a um passo do estado fascista. Para outros esse passo já foi dado (veja aqui uma entrevista esclarecedora de Noam Chomsky).

Sarah Palin é apenas a cara da tendência apontada por Borón e o retrato mal acabado duma sociedade onde os valores individuais se sobrepoem com virulência aos direitos positivos.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Arizona: o M16 abriu fogo

Por Atilio Borón, no Página 12 da Argentina

O criminoso atentado contra a congressista democrata Gabrielle Giffords e muitas outras pessoas próximas – que até agora deixaram seis pessoas mortas, incluindo John M. Roll, juiz federal – manifesta o processo de “fascistização” da sociedade estadunidense. É claro que a explicação politicamente correta que tanto a Casa Branca como os meios de comunicação se encarregam de difundir rechaça essa interpretação. O ocorrido é obra de um “demente” qualquer, mais um da venenosa linhagem que já matou John. F. e Robert Kennedy, Martin Luther King e Malcom X, para não citar outras personalidades altamente significativas da cena pública estadunidense.

Não existe a menor intenção de vincular o ocorrido em Tucson com as tendências profundas da sociedade estadunidense, que periodicamente afloram com mais virulência e força (McCarthy, Reagan, Bush Jr., agora o Tea Party), fazendo novas vítimas. O mesmo ocorreu em casos anteriores: para provar existe o sinistro “Informe Warren – chamado pelo nome do presidente da Suprema Corte dos Estados Unidos que presidiu a comissão investigadora do assassinato de John F. Kennedy – onde se sustentou que só uma pessoa, Lee Harvey Oswald, foi a responsável pelo “magnicídio” e que não houve nenhuma conspiração para executá-lo. Não é um dado alheio lembrar que um dos integrantes dessa comissão era o ex-diretor da CIA, Alan Dulles.

Gabrille Giffords, que ainda luta desesperadamente por sua vida, representa uma corrente progressista dentro dos democratas, algo extremamente perigoso em um estado como o Arizona, cuja governadora, a racista republicana Jan Brewer, promulgou em maio de 2010 uma lei que autoriza a polícia a deter e exigir documentos pessoais que provem a condição legal de residência a qualquer pessoa de aparência suspeita, leia-se “latinos”. Giffords se opôs valentemente a essa iniciativa e não só isso: no Congresso apoiou a Lei de Reforma do Sistema de Saúde e se manifestou a favor da reforma migratória, a investigação com células mãe e as energias alternativas. Ou seja, constitui uma oposição perfeita para a crescente legião de fascistas estadunidenses.

Por isso seu adversário nas recentes eleições parlamentares, Jesse Kelly, um ex-sargento dos “marines”, aparecia em um anúncio de campanha empunhando um rifle M16 e convidando os eleitores a descarregarem seus paints sobre Giffords. Candidato do exército de “freaks” do Tea Party, o nome de seu adversário havia aparecido – como recorda Fidel em sua “Reflexão” – em um anúncio patrocinado por Sarah Palin como uma das bancadas que conquistaram as eleições de novembro passado para o movimento. Seu estado, como outros dezenove, estava marcado por uma mira de fuzil. Essa descarada apologia da violência não perturbou a troca das tão abaladas instituições da república imperial. O trágico desenlace de tanta violência era apenas questão de tempo. Em uma repugnante amostra de hipocrisia, o site de Kelly publicou nesta terça um anúncio dizendo que o autor intelectual do crime rezava pela recuperação da congressista e das vítimas fatais do incidente. Como também fez o presidente Obama, incapaz de arbitrar algumas medidas essenciais para por fim a crise que está destruindo seu país.

Existem alguns pontos que devem ser explorados para que se possa compreender o ocorrido. Em primeiro lugar o mais elementar: um país embarcado em uma enorme militarização internacional requer o cultivo de atitudes patrióticas, fanáticas e violentas para sustentar ideologicamente, de dentro para fora, seus planos de conquista militar. O problema é que é impossível evitar que essas características ganhem o espaço doméstico, o que impossibilita estabelecer um âmbito de debate sereno e racional na política nacional. Isso foi advertido por Tocqueville há mais de um século e meio, e faz mais sentido hoje que ontem. Não é casual que Kelly tenha proposto descarregar o paint de sua M16 sobre Giffords. Alguém tomou nota dessa mensagem e o fez.

Segundo: o papel dos meios de comunicação nos Estados Unidos – e em especial os da cadeia Fox, salvo raras exceções, permanentemente alimentam o racismo, o fanatismo, a intolerância e a violência ante a indiferença das instituições, que deveriam regular o exercício da liberdade de imprensa e que não o fazem sob pretexto de defender a sagrada propriedade privada e a liberdade de expressão, ainda que esta seja utilizada para incitar o “magnicídio”.

Terceiro, a crise econômica que, como se sabe, estimula toda classe de condutas antissociais que tendem a criminalizar e, inclusive, satanizar o outro, o diferente. Um país onde os pobres empobrecem cada dia mais e a classe média sente que se funde à pobreza, enquanto contemplam uma minoria que enriquece escandalosamente, cria um caldo de cultivo inigualável para a aparição de comportamentos e atitudes aterrorizantes que, rapidamente, serão julgadas como normais. Por exemplo, esvaziar simbolicamente um paint de M16 em um adversário político. As consequências estão à vista.

Atilio Borón é Cientista Político e professor de Teoría Política e Social na Faculdade de Ciências Sociais da Universidade de Buenos Aires

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Rinha de tucano

Vejam só como são as coisas. Imaginemos que ex-presidente Lula ao assumir o governo em janeiro de 2003 tivesse dado início a uma auditoria nas contas de seu antecessor FFHH, o que a grande mídia mazombeira não faria? Com certeza a grande mídia (Partido do Capital) tomaria aquilo como golpe de Estado e tentativa petista de implantar uma ditadura no país expurgando da vida pública os sabujos tucanos e pefelistas.

Mas, isso é apenas exercício de imaginação uma vez que Lula optou por ser mais realista que o rei e não teve coragem para tanto -- muito por conta do tal “risco PT” que o próprio Partido do Capital se incumbiu de espalhar.

Pois bem, mas não é que agora nesse ano da graça de 2011 o príncipe do atraso Geraldo Alckmin resolveu pedir auditoria nas contas do ex-governador José Serra e o Partido do Capital tem tratado do assunto como algo trivial! Como diria o marinheiro Popeye: “macacos me mordam”. De fato Alckmin só está retribuindo o favor que Serra lhe fez em 2007 em procedimento análogo e, no entanto, em situação inversa.

Por outro lado que avanço seria para a Democracia caso auditar contas públicas fosse fato corriqueiro e comum entre nós. Por mais que saibamos que a atitude de Alckmin é movida por uma rinhada disputa interna -- dentro do PSDB -- ela não deixa de ser salutar.

Gostaria de ver o “boneco de ventríloquo” Antonio Anastasia fazer o mesmo em Minas com as contas de Aecinho, principalmente em relação à construção da faraônica Cidade Administrativa. Mas aí já é sonhar acordado. E ainda que chegássemos a tanto, provavelmente a imprensa mineira faria ouvidos moucos.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Sinais dos tempos

Ontem ouvi de um amigo que no estatuto do PCdoB deve ter algo do tipo: “no último minuto, venda-se”. É claro que isso é uma piada e de minha parte sempre admirei o PCdoB. Inclusive já votei nesse partido algumas vezes. Em 2006 meu voto ajudou a eleger a deputada federal Jô Moraes – quem eu conheci pessoalmente ano passado durante a greve dos servidores da Educação da rede estadual de Minas e passei a manter certo contato. Em 2006 também votei em Wadson Ribeiro para deputado estadual e mais recentemente em 2010 votei em Zito Vieira para o Senado.

Bom, então por qual razão começo o texto fazendo uma piada, talvez até sem graça, com o PCdoB e depois exponho que já votei nesse partido várias vezes? Pela simples razão de a contradição ser parte intrínseca de nossa existência humana. No entanto, não podemos confundir contradição com incoerência e menos ainda com incongruências e oportunismo. E infelizmente são justamente incoerência, incongruência e oportunismo o que vemos na postura do deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB – SP).

Rebelo foi crítico atroz do governo FHC e ganhou os holofotes ao presidir a CPI da Nike – CPI esta que não chegou à conclusão alguma, basta ver que Ricardo Teixeira completará daqui a dez dias exatos 22 anos ininterruptos à frente da CBF e a Nike continua a ter um enorme poder dentro da instituição que cuida do futebol nacional. Já no governo Lula foi inicialmente líder do governo na Câmara e posteriormente titular da Secretaria de Coordenação Política e Assuntos Institucionais da Presidência da República. Enquanto Secretario de Articulação Política viu o governo Lula passar por momentos de verdadeira desarticulação, muito por conta da sobreposição de tarefas entre sua pasta e a Casa Civil então comandada por José Dirceu. Uma das atitudes de Rebelo nesse período Rebelo, e a que melhor me recordo, foi o longo artigo publicado na Folha de São Paulo onde o “comunista” tecia loas ao ex-presidente José Sarney e o respeito que o califa do Maranhão sempre demonstrou para com a (sic) democracia. Já a desarticulação política daquele período foi responsável pelas piores crises vivenciadas pelo governo Lula ao longo de seus dois mandatos. Além da crise do mensalão, houve a precedente crise na Câmara dos Deputados onde o líder do “baixo clero”, Severino Cavalcanti (PP-PE), galgou o posto de presidente da Casa em 2005. Como Severino Cavalcanti não reunia minimamente qualquer condição de ser presidente da Câmara e caiu por estelionato ao cobrar “mensalinho” de um restaurante, fez-se necessário a realização de eleições extraordinárias para a mesa da instituição e Aldo Rebelo, de volta ao Congresso, acabou sendo eleito presidente da Câmara. O mandato tampão de Rebelo passou quase que despercebido e em 2007 Rebelo passou, a contragosto, a cadeira para Arlindo Chinaglia (PT-SP).

De lá pra cá Rebelo tem se esforçado de maneira sobre-humana para manchar o que poderia haver de bom em sua biografia. Durante o caloroso debate em torno da reserva florestal Raposa Serra do Sol empunhou a bandeira mais conservadora que encontrou e defenestrou com toda a força a demarcação defendida por grupos ambientalistas, humanistas e pelo próprio governo. Em muitos momentos cheguei inclusive a pensar que o antigo comunista havia se convertido à Família Tradição e Propriedade dada à virulência e as palavras utilizadas em sua retórica anti Raposa Serra do Sol.

O desdobramento dessa retórica e da defesa desenfreada de valores que antes Rebelo parecia não comungar ficou ainda mais nítido quando em 2010 foi relator do projeto que altera o Código Florestal brasileiro. Um de seus argumentos em prol da alteração me parece singular: "é melhor alterarmos [o Código Florestal] já que grande número de fazendeiros não o obedece”.

O problema é que as mudanças defendidas pelos representantes do agronegócio vão na contramão de fatores que levaram o Brasil ao menor nível de derrubada na Amazônia Legal em 23 anos. O Código Florestal brasileiro é visto por ambientalistas como uma legislação extremamente avançada em termos de preservação, especialmente se tomado em conta o pioneirismo das medidas implementadas a partir das primeiras décadas do século 20 e consolidadas em 1965. Por isso, as modificações poderiam ter um caráter de incentivo ao desmatamento.

Pela defesa intransigente das alterações no Código Florestal Aldo Rebelo tem recebido muitos elogios por parte do agronegócio ao mesmo tempo que passa a ser visto com desconfiança e suspeita por parte dos setores mais progressistas e de esquerda. Um exemplo: "O Aldo (Rebelo) é um exemplo muito interessante para o Brasil (...) A gente se entende não é de agora. Gosto de repetir que, se não fosse o Aldo Rebelo, ainda não teríamos transgênico funcionando no Brasil", palavras de Kátia Abreu, presidente da Confederação Nacional da Agricultura e famosa por considerar que trabalho escravo no meio rural brasileiro é apenas descumprir certas normas. Quem sabe Aldo, Kátia e demais ruralistas não tenham na verdade uma secreta admiração pelos “fire-eaters” do século XIX (extremistas sul estadunidenses pró escravatura e trafico de negros africanos).

Agora Aldo Rebelo está louquinho pra voltar a sentar na cadeira de presidente da Câmara dos Deputados e vejam só o sinal dos tempos: certamente terá o apoio dos ruralistas nessa empreitada. O que leva a outro sinal dos tempos: um “comunista” na presidência da Câmara dos Deputados pode representar enorme retrocesso para nossas instituições democráticas.