quarta-feira, 17 de junho de 2009

Peru, Irã, Lula, a mídia e a inveja

O Peru está sendo sacudido por uma onda de violência e resistência que já vitimou um sem número de camponeses e alguns policiais, tendo sua gênese nos protestos pacíficos promovidos por grupos indígenas contra a implementação no seu habitat histórico do Tratado de Livre Comércio (TLC) entre o Peru e os Estados Unidos, que permite a exploração por empresas estrangeiras de madeira e minério na região. Estamos falando da região amazônica do Peru, portanto muito próxima da fronteira com o Brasil. Mais, estamos também falando de um tratado visando privatizar a floresta amazônica e o presidente peruano Alan Garcia, num gesto típico de autoritarismo, procurou impor aos camponeses o acordo, sem consultá-los, ato totalmente ilegal, já que infringe o Convênio 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), pelo qual o Estado deve informar e consultar as comunidades quanto a convênios e contratos com empresas transnacionais e outras que desejam apropriar-se de territórios pertencentes aos nativos amazônicos. O Peru inclusive ratificou o referido Convênio da OIT em 1993, mas Garcia, aliado incondicional de Washington, simplesmente ignorou o fato optando pela violência.

Enquanto tudo isso acontece no subcontinente sul-americano, a nossa mídia mazombeira tem se ocupado intensamente nos últimos, dentro do noticiário internacional, a repercutir o que a grande mídia estrangeira tem feito, ou seja, atacar as eleições iranianas. Não importa se para tanto não possuem nenhuma prova substancial de que realmente houve fraudes durante o pleito no país persa. Sobre o assunto recomendo o ótimo artigo de Daniel Lopes para o Amálgama [http://www.amalgama.blog.br/06/2009/a-reeleicao-de-ahmadinejad-e-a-hipocrisia-de-israel/#more-390]


E como o presidente Lula, numa entrevista rápida, explicitou isso, o fato de inexistirem provas de que as eleições iranianas foram manipuladas, a midiazona não perdeu tempo e, outra vez, descarregou sua metralhadora contra o presidente brasileiro. Chegou inclusive a dizer que a declaração de Lula sobre as eleições iranianas não faria qualquer diferença em qualquer parte do mundo.

Só que mais uma vez o castigo veio a cavalo. Enquanto desprezam o nordestino analfabeto, pingaiada e ignorante, ele é tratado, naquilo que a nossa porca elite chama de primeiro-mundo, com o respeito que nenhum outro presidente brasileiro jamais teve.

Em viagem pela Europa – rumo à Rússia, onde participa em Ecaterimburgo da reunião de cúpula do grupo Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) –, Lula participou em Genebra da reunião do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. Teve ainda encontro com sindicalistas e compareceu à 98ª Conferência Internacional do Trabalho. Na Suíça, o chefe-de-estado brasileiro teve a oportunidade de denunciar à recente campanha da direita européia contra imigrantes e foi aplaudido e ovacionado de pé, por membros da OIT e do Conselho de Direitos Humanos. Entre outras coisas disse: "Eu tenho notado que em algumas campanhas políticas o maior instrumento da direita é dizer que vai diminuir a imigração para garantir o emprego no seu país". Continuou, "Não podemos permitir que a direita em cada país utilize o imigrante como se ele fosse um mal da nação ocupando o lugar de uma pessoa do próprio país." E ainda completou, "Nós não podemos permitir que essa visão ideológica tenha lugar no mundo do trabalho. Essa é uma luta muito difícil. Muitas vezes os próprios trabalhadores culpam os imigrantes. Então não é uma luta fácil, mas é uma luta que somente o movimento sindical pode assumir e defender com unhas e dentes."

No mais Lula pôs novamente o dedo na ferida: "Primeiro teve o Consenso de Washington e depois o neoliberalismo, que disse que o Estado tinha de ser o mínimo possível, porque o mercado resolvia qualquer problema. Mas no meio da crise, a quem é que os bancos americanos, os bancos alemães recorreram? Ao Estado. Porque somente o Estado tinha garantia e credibilidade de fazer aquilo que o mercado não conseguia fazer"

Alguém se lembra quando FFHH num gesto de cafonice sem tamanho gastou seu francês discursando na Assembléia Nacional em Paris e a mídia oligopolizada se derreteu toda gritando em coro “esse é meu presidente”.

Quanto a Lula, o tratamento dado é o de sempre, esconder e boicotar a todo o custo o sucesso mundial e a liderança latino-americana do (repito) nordestino analfabeto, pingaiada e ignorante.

E o pior é que isso não é novidade. Mês passado o nome de Lula foi confirmado para receber o Prêmio pela Paz Félix Houphouët-Boigny 2008. O prêmio dado pela UNESCO e que homenageia anualmente pessoas, organizações e instituições que tenham contribuído significativamente para a promoção, a pesquisa, a preservação e a manutenção da paz em conformidade com a Carta das Nações Unidas e a Constituição da UNESCO.

Ao anunciar a decisão, o integrante do júri do prêmio e ex-presidente de Portugal Mario Soares declarou: “Decidimos conceder o Prêmio pela Paz Félix Houphouët-Boigny a Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República do Brasil, por suas ações em busca da paz, do diálogo, da democracia, da justiça social e da igualdade de direitos, assim como por sua valiosa contribuição para a erradicação da pobreza e a proteção dos direitos das minorias”.

Também houve pouca, ou quase nenhuma repercussão, a matéria do diário espanhol El País sobre o desejo de Barak Obama de que Lula assuma o Banco Mundial. Segundo o jornal madrileno representantes do presidente estadunidense teriam consultado informalmente pessoas próximas a Lula para saber qual seria a reação do presidente brasileiro ao convite [para presidir o Banco Mundial]. Ouviram que, no mínimo, Lula se sentiria “honrado”.

Claro, presidir o Banco Mundial está muito longe de ser algo realmente importante, talvez seja até incoerente, para alguém cuja trajetória política de certo modo se confunde com a luta das esquerdas brasileiras desde fins da década de 1970. Entretanto o que direita tupiniquim não aceita é não ser um de próceres o preferido por Obama. Isso deixa nítido o quão incompetentes são e o pouco respeito que desfrutam entre sues pares ideológicos do hemisfério norte, ou pior ainda, o quanto atrasados estão em relação a seus congêneres nos EEUU e na Europa Ocidental.

Sinceramente, não sei ao certo o que move nossa mídia oligopolizada, que por sua vez é reflexo de nossa elite retrograda, se é apenas desprezo (Lula representa o “povinho”) ou inveja pura, por saberem que nunca chegaram aonde Lula chegou.

Fontes:

http://www.brasilia.unesco.org/noticias/ultimas/unesco-homenageia-lula-com-premio-pela-paz

http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2009/06/090615_lulagenebra_pu_ac.shtml

http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/elpais/2009/06/02/ult581u3276.jhtm

3 comentários:

Lucas Rafael Chianello disse...

Valeu Hudson, parabéns! Postagem impecável!

Blog do Morani disse...

19/06/09

Amigo Hudson:

Junto o meu entusiasmo ao do nosso amigo Lucas Rafael Chianello. Parabéns mesmo pelos seus trabalhos. Gostaria de fazer breve comentário, mas não me acho ainda em condições de raciocinar com clareza. Um forte abraço.

RLocatelli Digital disse...

Professor Hudson
A mídia golpista a serviço da elite branca brasileira está visivelmente desesperada. Sim, ela ainda é muito poderosa, mas esse poder está lhe fugindo por entre os dedos, gradualmente.