terça-feira, 29 de julho de 2008

Paulistanização

O egocentrismo paulista fica nítido na forma como a midiazona, alguns políticos e até analistas bem intencionados mas que se deixam levar pela boiada, tratam a disputa pela prefeitura de São Paulo. Uma “paulistanização” da política nacional, como se todas as decisões de âmbito federal passassem única e exclusivamente pelo crivo do eleitorado paulistano, relegando o resto do país a um papel secundário.

Obviamente não podemos negar a força da cidade de São Paulo, não só a maior cidade do Brasil, como também o maior colégio eleitoral, a maior força econômica, produtiva e financeira e onde se concentram as principais redes de comunicação e informação do país. Mas o Brasil não é a Argentina ou o México onde 1/3 de população vive no mesmo município. Aliás, o fenômeno da “paulistanização” vem ocorrendo pelo menos desde a reabertura política,
mostrando-se maléfico para a democracia e para a federação, tumultuando o equilíbrio e a eqüidade entre os entes federativos.

Nesse ano a disputa entre Marta Suplicy e Geraldo Alckmin em alguns momentos toma contornos de disputa nacional, estando na verdade bem longe de tanto. Fico me perguntando, qual o grau de conhecimento que o eleitor baiano, gaúcho ou goiano – eleitor médio – tem sobre a ex-prefeita de São Paulo além do fato de também ser ex-esposa do senador Eduardo Suplicy? Ou então sobre Geraldo Alckmin além do fato de ter sido candidato a presidente em 2006? Qual a verdadeira expressão nacional de ambos, se é que possuem alguma?

Na ultravalorização dada à disputa pela prefeitura da capital paulista fica patente o exagero caso tomemos o cuidado de analisar o desempenho de Lula nas duas últimas eleições presidenciais. Tanto em 2002 quanto em 2006, Lula obteve uma percentagem muito menor de votos em São Paulo se comparado ao conjunto do país. Em 2006 Lula sequer venceu Alckmin na capital, na região metropolitana ou no estado de São Paulo em nenhum dos dois turnos e ainda assim logrou vencedor com cerca de 60% dos votos válidos na contagem geral do segundo turno. Outro exemplo; em 1989 Maluf venceu o primeiro turno na capital paulista e no geral amargou um modesto quinto lugar.

Essa ultravalorização e superdimensionamento das eleições para prefeito de São Paulo apenas denotam um bairrismo vulgar, esdrúxulo e tacanho, incompatível para uma imprensa e uma classe política que se dizem – ou almejam ser – cosmopolita, demonstrando o quão despreparada essa classe esta para governar o Brasil além dos limites da Via Anhangüera ou da Imigrantes.

Afirmar que a eleição na capital paulista é um termômetro para o resto do país é justamente inverter despudoradamente a lógica. Querer usar a disputa paulistana como ensaio para 2010 não passa dum exercício de futurologia, mesmo porque ainda nem sabemos quais serão os candidatos daqui a dois anos e não só a disputa em São Paulo, mas também em outras capitais, o tempo, as alianças e os conchavos é que serão capazes de forjar os nomes presidenciáveis.

O único nome cogitado hoje para a sucessão de Lula que ouso apostar ser candidato de fato é o de José Serra. A raposa Serra já deixou Gilberto Kassab a ver navios graças ao pífio desempenho desse nas pesquisas de opinião de voto e desembarcou na campanha de Alckmin, podendo assim apaziguar seu próprio partido. Mas isso é muito pouco para uma eleição municipal que pretende pautar toda a disputa federal em 2010.

Eleger Serra, Alckmin, Kassab ou Marta inquilino da Granja do Torto apenas baseando-se no resultado das eleições paulistanas é viver ainda nos bons tempos – para a elite paulista – da Republica Velha.

terça-feira, 15 de julho de 2008

Perplexidade

Nos últimos dias a sociedade brasileira ficou entre estarrecida e perplexa com a postura do presidente do Supremo Tribunal Federal, uma postura nada condizente com a altura do cargo exercido por esse cidadão – cidadão sim, como você, eu e todos os outros brasileiros, embora muitas vezes o ilustre cavalheiro não se reconheça como tal ou pelo menos não como nós pobres mortais. Julgar o mérito da questão que levou o meritíssimo Ministro Gilmar Mendes a conceder dois hábeas-corpus a Daniel Dantas não compete a mim enquanto cientista social, pois a maioria de nossos magistrados entende a ciência jurídica como uma ciência exata e não humana.

No entanto gostaria de explanar um pouquinho sobre a formação de nosso Supremo e a indignação de seu presidente.

O Poder Judiciário em países como o Brasil, herdeiros ao longo da história duma sociedade extremamente hierarquizada, somado a pouca tradição de mobilização popular e instituído sobre as bases do pensamento de Auguste Comte, não poderia dar em outra coisa senão nesse Olimpo moderno, modorrento e surreal que é o nosso STF. Esses ministros do STF estão acima do bem e do mal e em tal condição não vêem necessidade de tomarem atitudes plausíveis ou compreensíveis para a sociedade.

O ministro Gilmar Mendes chamou de “espetacularização” e vociferou sobre o perigo do Estado brasileiro tornar-se um Estado Policialesco devido as recentes ações envolvendo a Polícia Federal. Mendes ainda bradava quando foi rapidamente ovacionado pela turba da oposição farisaica e os cães de guarda – esses agora pagos regiamente por Daniel Dantas. Esquecem esses cavalheiros e damas do papel definido por nossa Constituição a Polícia Federal. As ações criticadas pela elite branca nada mais configuram do que uma instituição pública cumprindo o dever para o qual foi justamente criada. O que perturbou o sono Mendes e seus comparsas e nem sequer conseguem esconder ou se esforçam para tanto, é ver alguns de seus iguais algemados. Daí sim a real e única indignação do Ministro, de Arthur Virgílio e C&A – inclusos aí muitos petistas e gente dentro do governo. Não se vê a mesma indignação quando o BOPE sobe os morros cariocas matando crianças, donas-de-casa, trabalhadores em geral ; impõe toque de recolher; sitia favela impedindo seus moradores de se locomoverem por outros bairros ou zonas da cidade até mesmo para trabalhar ou estudar. Não se viu indignação minimamente parecida quando a mídia, polícia paulista e Ministério Público transformaram em folhetim o assassinato duma menina de 6 anos. Ou muito menos quando um Zé Ninguém é espancado e jogado numa pocilga qualquer por roubar galinhas – ou um quilo de fubá, ou um pote de margarina como tristemente já ocorreu.

Agora mexer com Daniel Dantas é mexer em vespeiro, em caixa de marimbondos. Daí o badalar dos sinos da justiça – a Justiça tem sinos ou balança? A julgar pelos nossos grãos magistrados são sinos que retumbam freqüentemente quando um colarinho branco é pego com a boca na botija.

Difícil é o presidente do Supremo Tribunal Federal explicar isso para a sociedade.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Ziggy Stardust

Existem discos e mais discos e existe um disco cujo poder suplanta seu criador. “The Rise And Fall Of Ziggy Stardust And The Spiders From Mars”. Obra prima de David Bowie e do Glam Rock dos anos 1970 o disco não é tão somente um clássico, muito além disso, firmou-se como referência e contra-ponto – negativo ou positivo – para quase todo o tipo de música que o sucederia por longo tempo. Trouxe inovação estética e conspirou em 1972 para alucinações típicas daquele período onde o sentimento de perda da esperança num novo mundo e a queda na cruel realidade muito distinta da imaginada “Era de Aqaurius” punham fim ao flower power. A inspiração de Bowie tornou-se verdadeira sintomatologia da geração pós-Beatles, pós-Woodstock, pós-hippie.

Também é difícil dizer qual a relação exata entre a obra de Bowie e o multidirecional filme de Stanley Kubrick Laranja Mecânica (Clockwork Orange) de um ano antes. No que a obra de Kubrick influenciou o compositor britânico. O certo é a completude de ambos e a riqueza estética inclusa em cada um.

O visual andrógeno e a encarnação por parte de Bowie – então um músico com dois álbuns lançados com pouco ou nenhum impacto na crítica e no público – em um ser de outro mundo caído na terra, guitarrista canhoto e frontman de uma banda extraterrestre, não só primava pela originalidade inusitada como também pela estética inovadora sem puxar para o psicolidelismo.

As letras e músicas escritas com fino esmero, sarcasmo e cinismo, a utilização de aparelhos eletrônicos, a falta de medo da postura escancaradamente pop e a incorporação – quase transcendental – de David Bowie em Ziggy Stardust, transformam o álbum numa relíquia da musica pop. Aclamado no seu tempo, eternizado pela posteridade, o universo musical já lhe rendeu tributos dos mais diversos e Bowie pôde a partir daquele momento trilhar uma carreira das mais notáveis no cenário internacional ao mesmo tempo em que passava por inúmeras mutações sendo conhecido como o “Camaleão” do Mainstream.

Difícil também saber se Bowie encontrou em Ziggy e Lady Stardust um refúgio para suas opções e em suas próprias palavras cantadas “fazendo amor com seu ego”, ou se o objetivo era tirar do armário aquilo que o bom-mocismo e industria cultural de massa tanto queria esconder. Exemplo de artistas perseguidos pela opção sexual nunca faltou – que o diga Hollywood – e no mainstream do universo da musica pop não era diferente.

Quanto às musicas do álbum, bem, como escolher apenas uma ou duas, ou três, ou quatro... para descrever e tentar decifrar nesse espaço? Um álbum não só coeso e possuidor de uma amalgama tão grande capaz de torná-lo indivisível, que para mim seria tarefa árdua fazer tal escolha.

Faixas

1- Five Years
2- Soul Love
3- Moonage Dream
4- Starman
5- It Ain´t Easy
6- Lady Stardust
7- Star
8- Hang On To Yourself
9- Ziggy Stardust
10- Sufragaette City
11- Rock´N´Roll Suicide

sábado, 5 de julho de 2008

O caso “Morro da Providência”

Ano passado, nesse mesmo período, o vôo 3054 da TAM explodia causando comoção em todo o Brasil e a oposição farisaica aproveitava a situação para vilipendiar o governo federal gerando inclusive o movimento Cansei. O movimento deflagrado após o citado acidente que vitimou centenas de pessoas, a maioria de classe média – pois por mais viável e barato que tenha se tornado o transporte aéreo nos últimos anos, ainda é um meio de transporte inacessível para quem se preocupa em pôr comida na mesa todos os dias –, contava com um número grande de personalidades empenhadas, entre outras coisas, na investigação sobre os motivos que levaram ao fatídico acidente e um outro no final de 2006. Então quando Ana Maria Braga, Ivete Sangalo, Regina Duarte, Hebe Camargo e congêneres se uniram em coro sob a batuta de João Dória Jr. no tal movimento, estavam na verdade se unindo em torno da defesa de classe.

Também há cerca de um ano o filme Tropa de Elite do cineasta Antônio Padilha fazia enorme sucesso nas bancas de camelô e depois nas telas do cinema. Na película de Padilha pobre é tratado como a “elite branca” – termo criado por um de seus pares – gosta, ou seja, como pobre. A polícia na trama de ficção tentou ser a mais verossímil possível e mostra torturas, assassinatos e outras práticas perpetradas pelos heróis fardados. Não é de se espantar que a classe média bata palmas efusivas e fique extasiada com a forma encontrada pelo capitão Nascimento para tratar os favelados da ficção, pois é exatamente assim que gostaria de vê-los tratados na vida real.

Já no final do último ano o governador fluminense Sérgio Cabral, responsável por uma “limpeza” social no Rio de Janeiro, recusou-se a receber representantes da ONU vindos ao Brasil a fim de averiguar denúncias de arbitrariedades praticadas pelo estado contra os direitos humanos. A classe média, óbvio, ovacionou o chefe-do-executivo por tal ato de “soberania”.

A polícia carioca mata numa noite de sábado dezenas de jovens pelos mais diversos motivos, ceifa vidas e enlutece famílias, sem que nenhuma providência mais profunda seja tomada. E se isso já não fosse o suficiente para uma sociedade que se diz “civilizada”, agora também o Exercito abdica de suas funções de segurança nacional e vai proteger obras públicas para um Senador ligado a no mínimo polêmica e nebulosa Igreja Universal do Reino de Deus, e aproveita para fazer um pequeno acerto de contas com a comunidade que supostamente teria escondido armas e munição roubadas de um paiol militar em 2006, ano em que o Exército ocupou o Morro da Providência pela última vez.

Quero chegar ao seguinte ponto, como os três jovens covardemente entregues a um bando de traficantes de uma outra comunidade por militares eram moradores do Morro da Providência e não do Leblon ou da Barra, o interesse/pressão da classe média e do PIG sobre a elucidação do caso não passa dos limites da futrica política. Enquanto houver terreno para vincular o caso ao governo federal diretamente ou ao senador Marcelo Crivela e a IURD – hoje com fortes laços junto ao Palácio do Planalto – os jornais darão o espaço e manchetes necessários para manter o caso aceso e bater em seus adversários. Não há então nenhuma razão humanista de justiça ou civilidade quando tratam do caso. Basta ver o tom distinto dos noticiários, a forma vil como o governo foi acusado de causar o último acidente da TAM – uma companhia aérea que coleciona acidentes horrendos – contrastando com a forma quase banal que cobrem o crime cometido por militares.

Talvez um dos motivos também resida no fato de o atual Ministro da Defesa, Nelson Jobim, tratar-se de um prócer da classe dominante, não sendo de se espantar ser desavergonhadamente poupado de críticas.

Mas o que realmente está no cerne dessa questão é o velho e conhecido preconceito de classes. A classe dominante mostrasse unida e organizada em torno da manutenção dos seus direitos e do status-quo. Portanto esperar que João Dória Jr. organize um movimento em prol dos favelados do Morro da Providência é viver em outro mundo. Ele está mais para organizar um movimento em prol, isso sim, dos cãezinhos poodles impossibilitados por algum motivo maior de tomarem banho de ofurô semanalmente.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Dúvidas na Colômbia

Ainda é muito cedo e pretendo evitar tirar conclusões apressadas, mesmo porque as notícias que nos chegam da Colômbia estão em sua maioria nas mãos da midiazona mazombeira em versão PIG e não passam de mero repetidor das agências internacionais. No entanto existe uma complexidade na libertação da senadora Ingrid Betancourt que ainda não consegui decifrar e vem me encabulando desde a tarde de quarta-feira (02/07/2008). Qual teria sido o acordo firmado entre desertores das Farc, governo colombiano e talvez, insisto talvez, a senadora a fim de garantir a soltura dessa e mais alguns outros reféns? Qual o real interesse (repentino) de Uribe em resgatar Betancourt uma vez sabido que há muito tempo ele vem usando de todas as artimanhas para boicotar negociações visando justamente essa libertação?

A ilação mais certa subtraída do recente acontecimento é que as Farc indubitavelmente estão no seu pior momento, em menos de seis meses perderam seu principal negociador (Raul Reyes), um homem-chave (Ivan Ríos) e seu fundador (Manuel Marulanda), além de ver vários desertores e ter ficado no epicentro de uma crise entre Colômbia, Equador e Venezuela. Agora perde sua moeda de troca mais preciosa. Os guerrilheiros das Farc hoje estão encurralados e com força de reação diminuta em relação a poucos anos atrás. Pode-se usar dum ditado bem popular aqui em Minas, “estão num mato sem cachorro”, pois insistindo continuar em armas, fatalmente serão trucidados pelo exército colombiano amparado por Washington e subserviente aos interesses do imperialismo estadunidense. Por outro lado depondo armas e firmando uma trégua qualquer, têm consciência que se tornarão alvo de grupos paramilitares incentivados e com ligações estreitas com o atual governo. Na prática isso já ocorreu na década de 1980 com a importunação e assassinato de vários simpatizantes e integrantes das Forças Revolucionárias e a certeza da repetição de atos tão hediondos faz recair sobre os principais nomes da guerrilha o medo da “legalidade”.

No desenrolar dessa história, embora o fantoche e lacaio de Bush apareça como o grande triunfador no episódio, fica de certa forma exposto o momento de atribulações pelo qual vem passando o governo colombiano. Inegavelmente olhando pela ótica conservadora Álvaro Uribe logrou êxito em alguns pontos com sua virulenta política de combate as Farc, a recusa em qualquer forma de negociação com o grupo e o recrudescimento da perseguição a líderes populares – quantos sindicalistas são mortos por ano na Colômbia? No entanto as recentes denúncias recaídas sobre sua administração e seus aliados – importantes membros da base de sustentação do governo no Congresso e homens próximos ao presidente já foram cassados e encontram-se na cadeia ou fugiram para Miami, enquanto outros enfrentam processos por envolvimento com narcotráfico, chacinas e grupos paramilitares de direita – põem em xeque a condição de paladino da justiça galgada junto à opinião pública interna e externa. Adota-se então como medida de contra-ponto, mas sem nenhuma inflexão, a libertação da líder carismática, o próprio marido de Betancourt acusou Uribe por diversas vezes de dificultar o diálogo para libertação da agora ex-refém.

Além do mais está sendo levado a cabo pelo próprio presidente um projeto de re-reeleição já dado como inconstitucional pela Suprema Corte daquele país, fato que levou Uribe a convocar um plebiscito para consultar o povo colombiano sobre tal alteração na Carta Magna – vale lembrar que a Constituição colombiana não previa a execução de reeleições e o atual presidente a alterou e não teve pudor algum em se beneficiar diretamente de tanto. A taxa de rejeição ao atual mandatário e as instituições políticas anda em baixa no país vizinho, como revelam pesquisas recentes, portanto já que a guerra contra Equador/Venezuela não veio, melhor encontrar outro fato que una a nação, em especial algo bem comovente.

Ficará no ar a dúvida sobre o que realmente motivou a ação do Exército colombiano libertando a senadora e o que move o chefe-do-executivo nesse episódio. O tempo ajudará a elucidar essa dúvida, sobretudo após acompanharmos a postura de Ingrid Betancourt enquanto o lacaio se empenha numa provável campanha por um terceiro mandato.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

As falácias da direita

Incrível como a ditadura do pensamento único, o PIG e demais partidos de direita se aliaram mais uma vez, desta feita no Rio Grande do Sul – onde a governadora Yeda Crusius (PSDB) está atolada num mar de lama e corrupção – para não só criminalizar o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, o que na verdade já fazem há muito tempo, mas para declararem, macumunados com o Ministério Público, a ilegalidade do movimento. Esquecem esses representantes do atraso e do farisaísmo que a luta pela terra é mais antiga que a própria propriedade privada e que o movimento é legal e legitimo. A decisão do Ministério Público não procura em nenhum momento esconder seu viés autoritário assemelhando-se a uma direita degradante e um fascismo rococó. Não basta o Brasil ser exceção por nunca ter realizado aquilo que quase todos os países já fizeram, ou seja, uma reforma agrária de verdade, agora querem enquadrar na Lei de Segurança Nacional – ainda não a ressuscitaram, mas pelo andar da carruagem estão bem próximos disso – aqueles que a defendem.

Nos Estados Unidos a reforma agrária deu-se através da ocupação de amplo território onde as famílias que por mais de cinco anos trabalhassem na terra garantiam o direito de posse. A pequena propriedade foi sem dúvida um dos alicerces para o vigoroso crescimento econômico do Uncle Sam durante o século XIX . No Japão despedaçado e humilhado do pós II Guerra Mundial, os donos de terra doaram toda a propriedade privada rural ao Estado afim desse realizar a reforma agrária e isso somado a outras medidas contribuiu para um drástico salto tornando a “Terra do Sol Nascente” uma pujança econômica capaz de fazer frente ao seu antigo algoz, os EE.UU. Outro exemplo é a reforma agrária realizada no Chile por Salvador Allende. Nesse país sul-americano a pequena propriedade gerou emprego, robusteceu a pequena indústria e funcionou como mola para o crescimento de toda a economia até então baseada no extrativismo e mineração – mas claro, é pedir demais para nossa direita reconhecer tais avanços no Chile de Allende, preferem dizer que Pinochet sim, desenvolveu o país sem explicar como e os métodos utilizados –. Até Israel já fez uma reforma agrária, se bem que dividiu terras que nunca lhe pertenceu.

O setor conservador de nossa sociedade ao mesmo tempo que cultiva horror e ódio pelo MST joga loas de elogios para o famigerado agronegócio baseado no binômio concentração de renda e destruição do meio-ambiente. Ademais o agronegócio hoje em dia mostrasse mais aliado do que nunca aos interesses do grande capital internacional e disposto a entregar a soberania do Brasil desde que isso lhe garanta encher as burras.

Curioso a diferença de tratamento dispensado aos grandes latifundiários e aos sem-terra. Quando os primeiros correm a Brasília para pedir perdão das dívidas – o termo usado por eles não é esse e sim “renegociação”, o que na pratica não passa de eufemismo – boa parte da imprensa, os partidos da direita farisaica e até alguns setores proclamados de esquerda, defendem essa “renegociação” sob pena de ao contrário a agricultura brasileira quebrar e ser esse um setor essencial para a economia e a sociedade com um todo. No entanto ao mesmo tempo em que correm a pedir auxílio ao Estado evocam o direito sob a propriedade privada e seu controle além de se ajoelharem frente ao deus Mercado. Paradoxal essa relação entre latifundiários e Estado no Brasil. Se são empresários liberais – e é o que são em última estância – deveriam resolver seus problemas de forma a não precisar do guarda-chuva do Estado. Vivem num dilema. Quando o “mercado” está bom não querem saber de nenhuma regulação por parte do Estado, mas ao primeiro sinal de crise correm para este lhe salvar do mau tempo prenunciado. Diferentemente do que ocorre na França ou em alguns outros países europeus, onde justamente pela agricultura ser um setor essencial à sociedade, o Estado regula e subsidia a produção de alimentos e produtos agrícolas.

Já quando é o MST que reivindica mais verba ao governo federal é acusado de pegar dinheiro público para gastança, de não saber administrar os recursos que lhe são repassados, de desvios e financiamento de grupos armados no campo. Não passam de um bando de baderneiros e vagabundos acostumados a viver de esmolas dos sucessivos governos. Esse é o discurso dominante e maniqueísta de hoje em dia, tentando provar ser o agronegócio o mocinho da história e o MST o vilão. Triste sina a de um país que se deixa levar por tal maniqueísmo.