sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Aecinho joga a toalha

Noite agitada a de ontem. Aécio Neves entregou carta ao presidente nacional do PSDB, senador Sérgio Guerra, na qual renuncia a pré-candidatura à Presidência da República.

Escrevi semana passada que eu andava meio ressabiado com o “panetonegate”, e que a implosão de José Roberto Arruda poderia ter a ver com declarações de algumas lideranças do DEMO definindo o neto de Tancredo como a melhor opção para o PSDB. Nesse caso a implosão de Arruda seria um aviso para Aecinho, afinal de contas o governador mineiro tem o telhado de vidro, mas se esconde ante uma imprensa entre amordaçada ou devendo-lhe fidelidade canina.

De qualquer modo não podemos dizer que haja exatamente a partir da desistência de Aecinho uma readequação da estratégia política em plano nacional. Nem para a oposição e menos ainda para o lado do governo. Há muito era sabido que Serra detém o controle do PSDB e não abriria mão de ser o postulante da oposição farisaica à Presidência da República. Para tanto conta também com relações quase carnais com a mídia oligopolizada. Portanto, o que causaria uma reviravolta no jogo político seria justamente Aecinho conseguir de alguma maneira solapar a candidatura de Serra. O front governista sabia disso e sempre conheceu as dificuldades de Aécio para se impor dento do PSDB. PT e demais partidos que gravitam em torno do governo Lula sempre contaram com Serra como adversário em 2010, nunca com Aécio. Volto a dizer, uma candidatura de Aécio, fosse pelo PSDB ou pelo PMDB como foi ventilada algumas vezes, bagunçaria o xadrez político.

Resta agora saber se Aecinho disputará uma eleição certa ao Senado por Minas Gerais, o que lhe deixaria numa situação bastante confortável ou se preferirá grudar seu nome ao de José Serra e aceitará a condição de vice-presidente na chapa do atual governador paulista.

Caso Aécio ceda à pressão da alta cúpula do PSDB – e nesse instante também de boa parte do DEMO – para ser coadjuvante de Serra, o que realmente ele lucraria? A promessa de José Serra de não tentar a reeleição em 2014 e, portanto , dele se firmar como o nome natural dentro do consórcio demo-tucano? Isso me parece, por ora, muito pouco. Quem garante que Serra não venha a sofrer pressão por parte de fortes setores paulistas para que faça valer o seu direito à reeleição?

Já se Aécio optar pelo Senado terá todas as condições de se tornar um dos homens forte no Congresso em um eventual governo José Serra. Mais ainda, pode barganhar o apoio a Serra em troca de posições de relevância dentro da máquina administrativa e dos ministérios, talvez ele próprio ocupando algum ministério de visibilidade e se cacifar cada vez mais para uma futura disputa à Presidência.

Ademais, se um eventual governo José Serra, pelas mais diferentes razões, vier a naufragar Aécio Neves estará a uma distância de segurança, enquanto que na condição de vice-presidente essa distancia se torna quase inexistente.

Agora, noutro cenário, caso Dilma Rousseff suplante José Serra em outubro de 2010, um Aecinho senador se tronaria o aglutinador de todas as forças da oposição conservadora. Ocuparia naturalmente o espaço hoje ocupado justamente pelo governador paulista e faria os demo-tucanos comerem em sua mão podendo pleitear o que bem entender.

Para finalizar é bom salientar que a desistência de Aécio Neves não deixa de ser uma vitória para o Brasil. Porquanto Aécio Neves representa de forma muito mais consistente que qualquer outro dos atuais nomes ventilados para a disputa da Presidência um projeto neoliberal arcaico, cheio de desvarios, porém travestido num falso discurso alternativo. Destarte ganha o Brasil e perde o PSDB. Aécio era também a única alternativa dentro da oposição farisaica capaz de dividir a base de apoio do governo Lula. Para onde iriam PSB e PDT com Aecinho presidenciável? Eis uma bela incógnita. Isso sem falar que, no mínimo, a aliança formal entre PT e PMDB ficaria mais distante.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Em ritmo de festa

Às vezes é mais fácil encontrar um texto onde aquilo que você pensa já está sintetizado e materializado em palavras escritas. É óbvio que isso também não passa duma desculpa esfarrapada para a preguiça intelectual típica do final de ano.

Porém -- ah! que felicidade sempre podermos usar o porém para iniciar uma argumentação -- quem acompanha meu blog sabe o quanto o ano de 2009 foi produtivo, inclusive com a colaboração de vários companheiros. Durante o ano além de artigos de minha autoria e de outros enviados por colaboradores especialmente para o blog, também recolhi na internet alguns outros artigos que por ventura considerei interessantes e que vinham de encontro com a proposta desse espaço criado por mim. Agora chegou a vez de postar um pequeno texto – por tão sucinto e direto que é realmente não precisava de maiores delongas – do jornalista e escritor Georges Bourdokan.

(Só para constar, realmente já estou entrando em clima de férias, enquanto digito essas linhas ouço o Clash como há algum tempo a pressão do dia-a-dia não me deixava ouvir, por coincidência nesse instante Mick Jones está cantando I’ not down em meu media player.)

Salvar o planeta ou salvar a humanidade?

Por Georges Bourdoukan, no Blog do Bourdokan
http://blogdobourdoukan.blogspot.com

Continua em Copenhague o espetáculo da inutilidade. Governantes e seus patrões, os empresários, querem salvar o planeta.

Como se o planeta precisasse da humanidade para se salvar...

Vocês conseguem imaginar algo mais cínico?

Se os governantes sequer conseguem resolver problemas de saúde, educação, exclusão, alimentação, moradia, etc, etc, como é que vão resolver o problema planetário?

E os empresários, então? A única relação que entendem é explorar o próximo até a última gota de sangue.

Os países ricos falam em oferecer 30 bilhões de dólares de ajuda aos países pobres. Alguém acredita que esse dinheiro vai chegar ao seu destino?

A História ensina que quando os países ricos oferecem ajuda, na verdade eles tiram dinheiro de seus pobres para doá-los aos ricos dos países pobres.

Alguém duvida?

O planeta não está morrendo e nem precisa ser salvo. Quem está morrendo e precisa ser salvo é a humanidade.

Graças a esse sistema putrefato.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Shit

Por NaT, no Portal Luis Nassif
http://blogln.ning.com/profiles/blogs/2189391:BlogPost:227635?xgs=1&xg_source=msg_share_url

Amigos, estou completamente pasma com a repercussão desproporcional que a pronunciação da palavra "merda" tem causado na mídia (escrita e virtual). Podem colocar no Google a frase "tirar o povo da merda" que verão dezenas e dezenas de sites repercutindo tamanha insignificância.

É falta de assunto ou realmente o brasileiro não costuma dizer palavrões? Digo, porque eu, como argentina cresci ouvindo palavrões desde pequenina, é que lá na minha terrinha o povo adora um palavrão, eles tem até uma conotação artística...Rsss!

Alguns significados para a palavra merda...

Merda!: Alguma coisa deu errada.
Que merda!: Não gostamos do resultado de algum trabalho.
Puta Merda!: Surpresa tanto negativa como positiva.
Merda: Sinônimo de sorte para atores de teatro.
Merda: Cocô mesmo...
E tantas outras...

Agora imaginem se os americanos repercutirem cada vez que alguma figura pública diz : Shit! Rsss!

Tudo bem...reconheço, estou com falta de assunto, também. Mas não se preocupem, o domingo está acabando e vou dormir logo! Rsss!

Comentário meu: NaT, isso é o máximo que a oposição farisaica consegue fazer!!! Pegar frases soltas do Lula e jogá-las na imprensa como se estivessem envergonhadas de ter um presidente analfabeto. Será que vão pedir uma CPI da "merda"?


Outro dia desceram a lenha em Lula porque ele afirmou que criminosos são seres "anormais". Estamparam a frase de forma jocosa como se o presidente em sua infinita ignorância tivesse dito algo estapafúrdio, sem nexo. Não é que agora estou lendo "Vigia e Punir" de Michel Foucautl (será que algum especialista ou analista político da grande mídia já ouviu falar num dos maiores filósofos franceses da segunda metade do século passado?) e ele afirma exatamente isso. O criminoso é um ser "anormal" porque rejeita o Contrato Social.


Agora, o que é mais obsceno, Lula dizer que está lutando para tirar o povo da merda ou FFHH na campanha de 1994, em pleno sertão pernambucano, contar a um grupo de camponeses que havia perdido sua "cátedra" na USP durante o regime militar? É até difícil imaginar o que aqueles camponeses pobres pensaram que fosse uma "cátedra". Isso quem narra é Leandro Fortes [http://brasiliaeuvi.wordpress.com/2009/11/23/adeus-fhc/]


Será que o maior problema do Brasil hoje é o presidente da República repetir um palavrão tão comum em nossa sociedade?

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Crise no DEMO

Esperei um pouco para dar o meu pitaco sobre os últimos acontecimentos no Distrito Federal. Afinal como bom mineiro que sou, sempre fico ressabiado com algo que não consigo compreender muito bem. No caso especifico do governador José Roberto Arruda e o “panetonegate” até agora não compreendi o porquê da mídia oligopolizada gastar tanta tinta e imagens. Obviamente não estou criticando o direito da imprensa de divulgar um esquema de corrupção dos maiores que vimos nesses últimos tempos. Pelo contrário, até aí não só acho louvável e aplaudo, como gostaria que essa mesma imprensa fizesse desse exercício algo de praxe, o que infelizmente não ocorre. Para comprovar isso basta lembrar que no Rio Grande do Sul o mar de lama (xô Carlos Lacerda) jorra varrendo o (des)governo Yeda Crusius. Ou então a forma tímida (sic) como a imprensa cobriu a cassação do governador paraibano Cássio Cunha Lima. Ou, voltando ao “panetonegate”, o porquê da midiazona não apurar pra valer a ligação entre o esquema montado por Arruda no DF e empresas que prestam serviço para a prefeitura da capital paulista.

Entretanto depois das cenas de truculência praticadas pela Polícia Militar ao reprimir o sagrado direito de manifestação da população contra um governo eleito por ela própria, resolvi dividir com meus leitores algumas dúvidas. Aliás, por falar em truculência da polícia nos governos demo-tucanos, me parece que essa é uma das marcas registradas dessas administrações. Invasão do campus da USP pela tropa de choque da PM paulista, governo José Serra. Repressão a manifestantes e assassinato pelas costas de um integrante do MST pela Brigada Militar gaucha, governo Yeda Crusius. Expulsão e humilhação, permeados por atos de terrorismo de Estado praticados pela PM mineira contra sem-terras num acampamento em Campo do Meio, governo Aécio Neves. Disseminação de preconceito contra povos indígenas e movimentos sociais roraimenses, além de leniência com atos de vandalismo perpetrados por arrozeiros contra bens da União (explosão de pontes,por exemplo), governo José Anchieta Júnior. Em comum todos esses governadores têm o ninho do qual saíram para administrar seus respectivos estados, o ninho tucano. Como Arruda foi o único governador eleito pelo PFL, atual DEMO, só faltava ele pra mostrar seu lado autoritário. Esse é modo demo-tucano de governar.

Falando sobre o “panetonegate” há muitas dúvidas, algumas elucubrações, porém poucas certezas até o momento. Uma das certezas é a de que realmente foi instalado no DF um enorme esquema de corrupção. No entanto penso ser cedo ainda para afirmar que esse esquema fora de fato montado no atual governo. O passado de Joaquim Roriz, ex-governador do DF, mostra-nos o quanto é provável que esse esquema venha de antes. Aliás, como os eleitores do DF têm uma capacidade para eleger e ressuscitar figuras tão funestas! Roriz parecia fadado ao estertor político na metade dos anos 90, mas voltou e numa das eleições mais apertadas da história recente do país sobrepujou o então governador Cristovam Buarque, candidato a reeleição. Elegeu e reelegeu-se para depois conquistar uma cadeira no Senado. A essa cadeira teve de renunciar para não ser cassado poucos meses após assumi-la, pois se vira acossado por diversas suspeitas de caixa dois usando como fonte o Banco de Brasília.

Arruda também já teve a sua “volta por cima”. Em 2001 o então líder do governo FFHH no Senado viu seu nome envolvido na violação do painel eletrônico do Senado Federal, utilizado na votação que cassou o mandato do ex-senador brasilense Luís Estevão. Negou, chorou e apresentou como álibi uma declaração do hoje blogueiro Ricardo Noblat de que haviam jantado juntos na noite em que ocorrera o crime. Porém, ao final, encurralado, usou a tribuna do Senado para admitir a culpa e depois para renunciar ao cargo, evitando assim o processo de cassação do seu mandato, que poderia torná-lo inelegível por aproximadamente nove anos.

No ano seguinte trocara o PSDB pelo PFL (o que na prática não muda nada) e voltou de forma triunfante para o Congresso Nacional. Dessa vez eleito deputado federal com mais de trezentos mil votos e a maior votação proporcional do país. Em 2006 leva ainda no primeiro turno o governo do DF e é congratulado pela nossa mídia oligopolizada como o homem que “deu a volta por cima”, do inferno ao paraíso.

Desde então até o final do mês passado era tratado como administrador sério e conciso, ciente do papel reservado ao Estado frente o capitalismo moderno e exemplo de gestor público. Lideranças tanto do DEMO (PFL) quanto do PSDB corriam a Brasília para elogiar o governador Arruda, selar acordos e contratos de parceria, e aproveitavam para tirar fotos ao seu lado. O governador do DF estava no seu auge e bem na fita. Era inclusive cotado para assumir a vaga de vice numa eventual chapa de José Serra como presidenciável tucano.

Por que então depois de ser tão ovacionado pela mídia, essa mesma resolveu mostrar a podridão e a lama fétida que tomaram conta do Palácio dos Buritis? Será que ninguém no DF nunca ouviu falar, nem de longe, num esquema tão grande? Um esquema assim não surge do dia para a noite. Será que a imprensa foi descuidada ao ser tão benevolente com Arruda mesmo sabendo do seu passado nada auspicioso, sobretudo quando analisamos sua proximidade com Roriz?

É também curioso que o DEMO tenha seu único governador atingido por um mega-escândalo no momento em que algumas lideranças do partido vêm o público externar a preferência por Aécio Neves como cabeça de chapa na disputa pela presidência da República no próximo ano. E mais, são justamente essas lideranças, Cesar Maia e o filho Rodrigo, que têm mostrado uma posição mais ambígua sobre a expulsão ou não de Arruda.

A exposição das fraquezas do DEMO em rede nacional vem a calhar a partir do instante em que ele pretende interferir nas decisões tucanas contrariando o que almeja o governador paulista. Cesar Maia chegou a afirmar, em entrevista concedida ao Último Segundo do IG que José Serra lembra os piores caudilhos. “Um caudilho do passado apontava o dedo para o candidato. Agora o próprio candidato aponta o dedo para si.”
[http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2009/11/16/cesar+maia+elogia+aecio+e+diz+que+serra+lembra+os+piores+caudilhos+9104950.html]

Contudo não seria uma tática suicida essa? Afinal as denúncias contra Arruda podem respingar não só na formação da aliança PSDB-DEMO como pode atiçar ainda mais o fogo amigo. Mas também pode ser uma jogada da ala tucana liderada por Serra para minar o DEMO do DF e buscar a formação de um palanque com Roriz – há algum tempo rompido com Arruda – candidato declarado a governador e líder nas pesquisas de intenção de voto. Pode ser.

Pode ser também que o escândalo do “panetonegate” já estivesse prestes a explodir e tenham resolvido detoná-lo (ou seria correto dizer implodi-lo???) agora, um anos antes da eleição, assim têm mais tempo para limpar a sujeira.


Tampouco descarto a possibilidade da implosão do governo Arruda ser um aviso de Serra a Aécio Neves. O governador mineiro, concorrente de Serra na disputa pela indicação tucana ao Planalto tem o telhado de vidro, porém, manteve a imprensa de seu estado entre amordaçada e devendo-lhe fidelidade canina durante os últimos sete anos. Imaginem vocês se alguém, na mídia nacional, se interessa em escafunchar as ligações de Aecinho com as empreiteiras contratadas para a construção da maior obra que os tucanos fizeram por Minas, a Cidade Administrativa? Quem sabe se não há ali um potencial tremendo de soterrar as aspirações futuras do neto de Tancredo? Curiosamente, foi só o “panetonegate” ser detonado que Aécio adotou um discurso mais conformado com a eventualidade de Serra ser o presidenciável de seu partido. Inclusive já deixou no ar a possibilidade de retirar a pré-candidatura ainda nesse ano.

São dúvidas que dificilmente terão respostas a curto prazo, por isso ando tão ressabiado que nem escrevi no começo do texto.

Antes de terminar gostaria de ressaltar aqui é a postura de vestal do DEMO dizendo que nessa crise terá a oportunidade de se diferenciar do PT que não expulsou seus “mensaleiros”. Nem vou entrar no mérito da questão em si, afinal como posso ter certeza que o “mensalão” petista existiu da forma como foi denunciado por Roberto Jefferson? A denúncia de Jefferson é o que há de mais concreto, e abstrato, sobre o mensalão petista, a denúncia dum deputado ressentido e com interesses escusos. Todavia, mesmo que o DEMO venha a expulsar Arruda e expô-lo para suplícios em praça pública isso não torna a legenda mais ética e honesta que qualquer outra. Foi o PFL, agora repaginado para o nome de DEMO, quem abrigou e saudou Arruda como novo herói após a violação do painel do Senado. No mais, o comparsa de Arruda naquele crime foi ACM, que além de também renunciar ao mandato para não ser cassado, foi novamente eleito senador pela Bahia e continuou por até a morte como um dos caciques do partido, inclusive deixando herdeiros.

Em tempo.
José Roberto Arruda tem o direito de se defender frente as acusações que lhe recaem no momento, ainda que o caso pareça indefensável. Só assim se poderá afirmar que houve justiça de fato. Além disso, o ideal é que não paire dúvidas sobre a culpabilidade do réu para que mais tarde não seja tratado como falso mártir, o que não parece muito difícil dadas as circunstâncias. Contudo, em casos como esse, o problema pode ser a dilatação do prazo para a defesa, cabe ao DEMO definir um prazo razoável para o desfecho do caso, pelo menos de sua parte. Expulsão sumária como parte de mídia, da sociedade e do DEMO querem, apenas reforça a reminiscência de vezos autoritários. O direito a defesa e ao contraditório fazem parte do rito democrático, no entanto algumas pessoas e instituições ainda não se acostumaram a tanto.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Atílio Boron: Por que Evo ganhou?

Por Atilio A. Boron no Pagina 12 da Argentina, via Revista Fórum
http://www.revistaforum.com.br/sitefinal/NoticiasIntegra.asp?id_artigo=7835

Uma semana atrás celebrávamos o triunfo de Pepe Mujica no Uruguai. Hoje temos renovadas – e também mais profundas – razões para festejar a notável vitória de Evo Morales. Tal como assinala o analista político boliviano Hugo Moldiz Mercado, o rotundo veredito das urnas marca pelo menos três feitos importantíssimos na história da Bolívia.

a) É o primeiro presidente democraticamente eleito para dois mandatos sucessivos;

b) É o primeiro, também, a melhorar a percentagem de votos que obteve da primeira vez (53,7%);

c) É o primeiro a obter uma esmagadora representação parlamentar, na Assembleia Legislativa Plurinacional. Além do que, quando saírem os resultados definitivos, não disponíveis no momento, talvez concretize a obtenção de dois terços no Senado, o que lhe permitiria nomear autoridades judiciais e aplicar a nova Constituição sem oposição.

Tudo isso converte Evo Morales, do ponto de vista internacional, no presidente mais poderoso da convulsionada história da Bolívia.

Obviamente, isso não vai impedir o Departamento de Estado de reiterar suas conhecidas críticas à "defeituosa qualidade institucional" da democracia boliviana, o "populismo" de Evo e a necessidade de melhorar o funcionamento político do país para garantir a vontade popular. Como se faz por exemplo na Colômbia, onde cerca de 70 parlamentares do uribismo foram investigados pela Corte Suprema de Justiça e a Procuradoria, por seus supostos vínculos com paramilitares, e 30 deles enviados à prisão, com sentença passada por esse motivo.

O desempenho eleitoral do líder boliviano é impressionante: triunfo consagrador na convocatória da Assembleia Constituinte, em julho de 2006, que assentaria as bases institucionais do futuro Estado plurinacional; outra esmagadora vitória em agosto de 2008 (67%), no Referendo Revogatório forçado pelo Senado, com o aberto propósito de derrubá-lo; e em janeiro de 2009 62% do eleitorado aprovou a nova Constituição Política do Estado.

O que há por trás dessa impressionante máquina de ganhar eleições, indestrutível apesar do desgaste de quatro anos de gestão, dos obstáculos colocados pela Corte Nacional Eleitoral, da hostilidade dos Estados Unidos, das campanhas de desabastecimento, tentativas de golpe de estado, ameaças separatistas e planos de magnicídio?

O que há é um governo que cumpriu as suas promessas eleitorais e, por isto mesmo, desenvolveu uma política social ativa: Bolsa Juancito Pinto, que chega a mais de 1 milhão de crianças; Renda Dignidade, um programa universal para todos os bolivianos com mais de 60 anos que não possuam outra fonte de renda; Bolsa Juana Azurduy, para as mulheres grávidas; que erradicou o analfabetismo aplicando a metodologia cubana do programa Sim Eu Posso, que alfabetizou mais de 1,5 milhão de pessoas, levando a Unesco,(não os partidários de Evo), em 20 de dezembro de 2008, a declarar a Bolívia território livre do analfabetismo.

O solidário internacionalismo de Cuba e da Venezuela também permitiu a construção de numerosos hospitais e centros médicos, enquanto milhares de pessoas recuperaram a visão graças à Operação Milagre. Importantes avanços se registrararam também na realização da reforma agrária.

A nacionalização das riquezas básicas (hidrocarbonetos) e a gestão macroeconômica permitiram à Bolívia, pela primeira vez na história, contar com reservas de divisas estimadas em US$ 10 bilhões, e uma situação de bonança fiscal que, unida à colaboração da Venezuela nos marcos da Alba, permitiu a Morales realizar diversas obras de infraestrutura nos municípios e financiar sua ambiciosa agenda social

Naturalmente, muita coisa resta por fazer. Mais tudo isso, somado à permanente preocupação de Evo em conscientizar, mobiliar, organizar sua base social – deixando de lado os desmoralizados aparatos burocráticos que, tal como na Argentina, não mobilizam a ninguém –, tornou possível seu rotundo triunfo. Seria conveniente tomar nota desta lição.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Parabéns a todos nós flamenguistas

Quem acompanha meus textos e postagens no Dissolvendo No Ar, ou os mais antigos que me acompanham desde o antigo Blog do Hudson, sabem que o futebol não é para mim um tema recorrente. Prefiro escrever sobre política, filosofia e música (embora reconheça que escrevo menos sobre este último tema do que gostaria). O futebol sequer é hoje um de meus passatempos favoritos. Embora no passado já tenha sido um dos principais, há muito que prefiro o prazer da leitura, do cinema, da música e tantas outras coisas mais.

No entanto como o Flamengo, após 17 anos de jejum no campeonato brasileiro, sagrou-se campeão numa competição onde até um mês atrás pouquíssimos acreditavam na sua capacidade e competência e ainda acabou com uma hegemonia de cinco anos dos clubes paulistas, eu não poderia deixar de comemorar o título. Ainda mais do modo emocionante como se deu a conquista – sem dúvidas o mais empolgante da curta história dos pontos corridos – e depois de enterrar o meu medo de testemunhar um "maracanazo", dada a celebração antecipada do título.

Então viva aos heróis Adriano,Il Imperatore, que reencontrou a vontade de jogar e alegria de viver. Viva a Dejan Petkovic, o gringo nascido na antiga Iugoslávia do Marechal Tito e um dos maiores ídolos do clube. Viva a Ronaldo Angelim, autor do gol do título e exemplo de superação e garra. Viva a Andrade, ex-craque formado no próprio clube, um dos principais nomes da geração de ouro do Flamengo – cuja trajetória de glorias me transformou num mineiro torcedor do mais querido clube do Brasil – um dos jogadores que mais vezes foi campeão brasileiro e agora o primeiro técnico negro a levantar o mais importante título do futebol nacional.

Mas principalmente viva a torcida, pois além de ser o 13º jogador é também a responsável pela existência do próprio futebol e o resquício duma época quando o esporte bretão era jogado por amor e paixão e não apenas mais um negócio.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

A decepção de José Arbex Jr (e minha também) com César Benjamin

José Arbex Júnior, autor dos livros Showrnalismo - A Notícia Como Espetáculo e O jornalismo canalha, ambos da editora Casa Amarela, antigo militante trotskista e editor especial da revista Caros Amigos, é um dos principais intelectuais da esquerda brasileira. Desde os primeiros meses do governo Lula que Arbex Júnior se notabiliza como ferrenho opositor, porém sem abandonar a lucidez e coerência, de algumas das medidas adotadas pelo ex-companheiro de partido, sobretudo no tocante à política macroeconômica. Inclusive quem quiser comprovar isso, pode acessar a rádio Vi O Mundo [http://www.viomundo.com.br/radio/jose-arbex-o-governo-lula-e-neoliberal/] e ouvir da boca do próprio jornalista suas bem fundamentadas críticas.

Além de tudo isso, resta eu dizer que Arbex Júnior é dono de uma escrita espicaçante, franca e inteligente, que nos faz parar no meio da leitura para bater palmas e reverenciar seu autor. Sempre faço isso quando tenho a oportunidade de ler um texto dele.

Hoje foi mais um desses dias. José Arbex Júnior, além de colocar as coisas no seu devido lugar, em relação ao texto produzido por Cesár Benjamin para a Folhona no último dia 27 de novembro, ainda consegue sintetizar em poucas linhas o que é a esquerda hoje e o que Lula representa de positivo para a esquerda no Brasil e no Mundo.

Mais não falarei, afinal deu de presente aos meus leitores um texto primoroso e irretocável.

A César o que é de César

Por José Arbex Jr, no site NovaE
http://www.novae.inf.br

Quando comecei a ler o já famoso texto de César Benjamin: “Os filhos do Brasil”, publicado pelo jornal Folha de S. Paulo em 27 de novembro, fiquei orgulhoso de ser da esquerda. E mais ainda: de ter compartilhado com o autor do texto alguns momentos emocionantes de nossa luta comum, como o final da marcha do MST para Brasília, em 1997, quando me encontrei pessoalmente com ele, pela primeira vez. Os parágrafos iniciais do texto são primorosos. Muito bem escritos, compõem uma narrativa densa, sedutora, que vai criando no leitor uma vontade de querer saber mais sobre uma história que nunca foi contada direito: a história da ditadura militar, dos porões, das torturas, das prisões, dos seres humanos condenados à ignomínia. Benjamin soube retratar com grande humanidade os seus companheiros temporários de cela. Resgatou-lhes a história, a identidade, a face profundamente humana.

Mas aí, veio a facada, o golpe inesperado, a decepção, a tristeza profunda. Benjamin relatou, no mesmo texto, uma conversa supostamente mantida com Luís Inácio Lula da Silva, em São Paulo, em 1994, durante a campanha à Presidência do Brasil. Lula teria “confessado”, então, entre amigos, que, na prisão, tentou seduzir, sem sucesso, um militante de uma organização de esquerda. Benjamin faz uma comparação entre o assédio descrito por Lula e o temor que ele mesmo, Benjamin, sentiu, quando preso, de ser “currado” por outros detentos.

Não entendi nada. Li de novo, reli, tentei buscar alguma ironia oculta, algo que justificasse, no plano do próprio texto, o absolutamente injustificável paralelo entre estupradores que pululam nas prisões brasileiras – em geral, seres humanos reduzidos a condições quase completamente animalescas pelo próprio sistema carcerário, e/ou por uma vida anterior mergulhada na mais profunda miséria econômica, ideológica e afetiva – e Lula, que não estuprou ninguém, mas que, supostamente, comentou ter sentido o desejo de manter relações sexuais com um companheiro de cela que não cedeu aos seus desejos. Não quis acreditar que alguém dotado com os recursos intelectuais de Benjamin, adquiridos ao longo de sua longa história de luta pela liberdade e pela dignidade humana, pudesse cair em um pântano tão sórdido e profundo. Mas não encontrei nada no texto de Benjamin que permitisse uma interpretação positiva. Ou melhor: encontrei “o” nada: o vazio absoluto; vazio de sentido, o vazio da total falta de perspectivas, o vazio de um rancor desmedido.

(Antes de prosseguir, esclareço logo: não sou e nunca fui “lulista”; não sou mais já fui petista; não simpatizo com a maioria das medidas de governo adotadas por Lula, e por isso sou totalmente favorável à crítica de esquerda ao seu governo. Mais precisamente, creio que Lula pode e deve ser criticado por aquilo que fez, mas acho muito estranho ele ser atacado por aquilo que NÃO praticou.)

Vamos agora considerar, por um segundo, que Lula realmente fez o que supostamente disse ter feito. Isto é, que em dado momento tentou seduzir – seduzir, note bem, não estuprar -- o colega de cela. E daí? O que se pode concluir disso? Qual seria, nesse caso, o crime de Lula? O exercício, o desejo da homossexualidade? Estaremos, então, diante de um texto homofóbico?

Ainda segundo o próprio Benjamin, como já observado, Lula teria comentado o caso numa roda de amigos. Estamos, então, diante de um gravíssimo precedente, aberto pelo próprio Benjamin. De hoje em diante, todos teremos que suspeitar dos nossos amigos, teremos que nos policiar para que nossas palavras não sejam, eventualmente, atiradas contra nós por algum “traíra”, algum “dedo duro”, algum “cagueta”, algum Judas, algum oportunista que resolva tirar proveito de uma situação de cumplicidade. Revivemos, então, a era da delação (Premiada? Que o prêmio, no caso, teria sido pago a Benjamin?), a era da intriga, da fofoca, da futrica, da artimanha, da safadeza. Que vergonha! (Isso tudo me faz lembrar a famosa oração de Marco Antônio, no brilhante texto de Shakespeare: “Poderoso César, terás então descido a tão baixo nível?”)

Benjamin utilizou a imprensa dos patrões para atacar um expoente do movimento de esquerda do Brasil. Claro, claro, claro: sempre se pode alegar que Lula não é de esquerda, como ele mesmo já disse e como eu, pessoalmente, avalio. Mas há um abismo entre considerações de caráter individual, feitas por indivíduos privados e isolados, ou mesmo por grupos e seitas, e a realidade política concreta, historicamente determinada pela luta de classes. No contexto brasileiro, em que as alternativas concretas ao governo Lula (e à sua imagem refratada Dilma Rousseff) são figuras sinistras como as de José Serra e Aécio Neves, Lula surge como um expoente à esquerda do espectro político, com algumas conseqüências importantes para a luta de classes na América Latina: por exemplo, a condução exemplar do governo brasileiro no caso de Honduras (embora feiamente chamuscada pelo desastre no Haiti), a recusa em avalizar o acordo das bases militares estadunidenses com a Colômbia e a denúncia permanente do bloqueio de Cuba. Para não mencionar o fato de que a figura de Lula, malgré lui même, inspira movimentos de resistência ao capital em todo o mundo. Disso não se conclui, automaticamente, que a esquerda deva, necessariamente, apoiar o governo Lula, ou mesmo apostar na eleição de Dilma. Ao contrário, deve aproveitar as contradições, os paradoxos e as ambigüidades para fortalecer o seu próprio campo. Mas Benjamin preferiu fortalecer as correntes representadas pelo jornal dos campos Elíseos.

Não por acaso, a Folha de S. Paulo cedeu o espaço todo pedido por Benjamin. Cederia mais, se necessário fosse. Benjamin conhece a teoria marxista e sabe, com Gramsci, que a mídia dos patrões é o verdadeiro organizador coletivo, é o grande partido do capital. Triste é o fato de ele ter arregaçado as mangas para trabalhar por tal partido. E pior: Benjamin sabe que o falso paralelo que tentou traçar entre os predadores das prisões da ditadura e o prisioneiro Lula seria muito mais verdadeiro se, no lugar de Lula, ele colocasse os donos dos jornais para os quais hoje escreve.

Todo o encanto produzido pelos primeiros parágrafos do texto de César Benjamin foi transformado em fel a partir do momento em que se instaurou a delação, o oportunismo, o absurdo. Lula não estuprou o seu companheiro de cela, mas Benjamin violentou, com alto grau de sadomasoquismo, a própria consciência e uma história repleta de glórias. Requiescate in pace.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Arcebispo de Mariana demite e manda recolher jornal

Agencia Brasil de Fato
http://www.brasildefato.com.br/v01/agencia/nacional/arcebispo-de-mariana-demite-e-manda-recolher-jornal

Decisão é motivada por conteúdo que faz duras críticas a prefeitos da região e ao governador Aécio Neves

Dom Geraldo Lyrio Rocha, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e arcebispo de Mariana (MG), demitiu parte do conselho editorial do Jornal Pastoral e mandou recolher os exemplares da edição do mês de setembro, proibindo assim sua circulação. O periódico, com tiragem de aproximadamente 2 mil exemplares, é de responsabilidade da diocese de Mariana e tem circulação garantida em aproximadamente 70 municípios da região.

Segundo religiosos envolvidos no caso, entrevistados pelo Brasil de Fato e que não se identificaram temendo perseguições, o que levou dom Geraldo a adotar tal medida foi o conteúdo do editorial da edição de setembro. Intitulado “Do toma lá dá cá ao projeto popular”, o texto faz duras críticas a prefeitos da região e ao governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB). De acordo com um dos religiosos, o texto estava totalmente pautado no pensamento da Igreja. “O editorial condiz com o que pensa a Igreja voltada para o compromisso social. Por isso, avaliamos que esta é uma posição pessoal do bispo”, completa.

Questionamento

Em trechos, o editorial questiona as despesas da prefeitura de Piranga (MG), que gastou aproximadamente R$ 375 mil nas obras de uma praça. O valor gasto pela administração do prefeito Eduardo Sérgio Guimarães (PSDB) estaria em média R$ 225 mil acima do valor de mercado, como informou um laudo técnico do engenheiro Carlos Alberto Gomes Beato. Saindo do âmbito regional, o editorial desenvolve críticas à administração do governo mineiro apontando que “levantamento publicado no jornal Estado de Minas do dia 30/08/2009 mostra que em 81 dos 85 municípios com menor índice de desenvolvimento [renda, emprego, saúde e educação] a pobreza caminha de mãos dadas com a corrupção”.

Em outro momento, o nome do governador mineiro é citado: “O governo Aécio, sob a diligência da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, canalizou recursos da ordem de R$ 15 bilhões, em grande parte recursos públicos, para quatro empresas [Vallourec, Sumitomo, CSN e Gerdau] ampliarem ou consolidarem seus próprios negócios na região do Alto Paraopeba. O dinheiro é suficiente para a construção de 700 mil casas populares ao preço de R$ 20 mil cada, quase quatro vezes mais do que os R$ 4 bilhões reservados pelo governo federal para programas de moradia em todo o Brasil. Se esse recurso fosse distribuído para as três cidades Congonhas, Ouro Branco e Jeceaba, onde as empresas ‘sortudas’ estão instaladas, que somam 70 mil habitantes, tocariam perto de R$ 219 mil para cada pessoa ou quase R$ 1 milhão por família.

Os nomes envolvidos no editorial também seriam motivos para a tal atitude de dom Geraldo. “O texto cita nomes de políticos e esses políticos citados poderiam cobrar a igreja por meio do bispo uma satisfação sobre o editorial. Isto foi uma motivação política e não religiosa. O bispo quer manter o seu lado do poder, ele não quer perder isso”, explica um dos nossos entrevistados.

Resgate

O editorial também faz um histórico dos financiamentos do governo de Minas em empresas privadas desde o ano de 2003. “As ricas áreas desapropriadas e entregues de mão beijada às minerados e siderúrgicas em Jeceaba e Congonhas chegam a 4 mil hectares. E, de 2003 a 2008, foram canalizados R$ 199 bilhões para as empresas em todo o estado de Minas Gerais, em negociatas de compadrio e cumplicidade tipo ‘unha e carne'”, finaliza.

“Não concordo...”


Em resposta, no mês de outubro, dom Geraldo afirma em editorial do Jornal Pastoral, que “não concordo, não aceito e não aprovo o editorial do Jornal Pastoral do mês de setembro. A Arquidiocese de Mariana não se responsabiliza pelas afirmações e acusações aí expressas. Seja essa a última vez que o Jornal Pastoral incorre em erro tão grave. A fé cristã implica em compromisso social e a Igreja Católica nunca renunciará à sua missão de ser advogada dos pobres e injustiçados”.

Esse trecho, segundo religiosos ouvidos pelo Brasil de Fato, evidencia a postura de uma parte dos lideres católicos. “Ele tem uma visão de Igreja. E nessa visão ele tem preocupação de manter o nome da Igreja. E qualquer coisa que venha colocar em questionamento a posição da Igreja ele teme e foge do conflito. Pois grande parte da Igreja ainda tem medo do conflito e tem medo de se colocar contra a posição do poder político. E na hora desse conflito eles se colocam do lado de quem detém o poder”, observa.

Contrário

Os religiosos acrescentam que essa posição e essa atitude de dom Geraldo não causaram estranhamento. “Acreditamos que essa posição do bispo não é a mais importante de toda a situação. Ele tem posição contrária diante da Romaria dos Trabalhadores, posição contrária em relação à denuncia contra corrupção, posição de afastamento de padres que se envolvem com pautas de movimentos sociais e populares. Então, há uma série de coisas que vão definindo o rumo da diocese e a linha de trabalho dele” lamenta.

Segundo eles, esse posicionamento é contraditório com o atual momento vivido pela Igreja Católica, que apóia o projeto Ficha Limpa e que tem como tema da Campanha da Fraternidade de 2010 “Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro”. “Essa posição é contraditória, pois bate de frente com o momento vivido pela Igreja, que é o posicionamento contra a corrupção política. O editorial condena pessoas politicamente corruptas. A posição do bispo em relação a isso é uma contradição e acaba ficando contra a coleta de assinaturas para o projeto de Ficha Limpa. Ele ficou preocupado com a imagem diante do Senado Federal, na pessoa representada por José Sarney, diante do Estado e dos políticos citados pelo texto”.

Fé em movimento


No Brasil, mesmo estando em queda, os católicos ainda são maioria. De acordo com última pesquisa realizada em 2007 e divulgada pelo Datafolha, aproximadamente 64% dos brasileiros se dizem católicos. O número é 11% menor que uma pesquisa realizada pelo mesmo instituto em 1994. Soma-se a isso o crescimento dos evangélicos pentecostais e não pentecostais, que somam mais de 22%. Esses dados preocupam os religiosos, tendo em vista que muitas vezes o caminho da Igreja é traçado por pessoas como dom Geraldo. “Esse posicionamento dificulta muito a caminhada da Igreja. Por outro lado, eu acredito que a força da Igreja está se manifestando nos movimentos populares. Uma atitude como essa não demora muito tempo a ruir” completa.

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O Brasil de Fato entrou várias vezes em contato com o arcebispo dom Geraldo Lyrio Rocha, mas ele não atendeu e nem retornou as ligações.