Essa semana completou-se
80 anos da chegada de Hitler ao poder. Talvez este tenha sido o fato divisor de
águas do século XX, afinal após Hitler
chegar ao poder e colocar em prática uma aparentemente bem sucedida estratégia
de reerguimento da economia alemã baseada em vultuosos investimentos do Estado
tendo como foco a preparação de uma colossal máquina de guerra, o mundo se viu então dividido num primeiro momento entre uns que enxergavam no führer a encarnação
do líder que o libertaria do perigo bolchevique e reconstruiria o sistema
capitalista abalado pelo crash de 1929 e entre outros menos lunáticos e mais realistas – vide
Escola de Frankfurt – que viam no nazismo uma forma totalitária de
governo na qual toda e qualquer crítica ou oposição ao Estado era imediatamente
tratada como crime de traição.
Num segundo momento, com
o totalitarismo alemão chegando ao seu ápice e já com a sua máquina de guerra tomando quase toda a Europa, é constituída uma impensável aliança anti-nazismo entre os liberais-capitalistas
do Ocidente e o regime stalinista soviético, contendo também muito mais que a simpatia dos autênticos socialistas das mais variadas vertentes espalhados pelo planeta.
A aventura nazista – que prometia um “reich de mil anos” – findou
em 1945 com a tomada de Berlim pelo Exercito Vermelho. No entanto a Alemanha
até hoje sofre com as marcas daquele período abjeto e ignominioso,
tendo inclusive algumas feridas não cicatrizadas. Por exemplo, a Alemanha
continua a ter tropas estadunidenses em seu território e sua reserva em ouro “guardada”
nos EUA.
Li a matéria
abaixo no sítio português Resistir. Info e resolvi tunga-la.
As bases americanas na Alemanha e a
base ouro
Por Antal E. Fekete
[*] no Resistir.Info
A Alemanha não é nem independente nem soberana, apesar das
pretensões habituais. Ela tem tropas americanas no seu solo por razões
inexplicadas e inexplicáveis após a retirada de todas as tropas soviéticas há
quase 25 anos atrás. Igualmente significativo é o facto de que a fatia do leão
da reserva ouro alemã esteja sob a custódia americana. Se o Bundesbank pediu a
repatriação de uma parte simbólica daquele ouro durante um longo período de
tempo, podemos considerar como garantido que isto foi feito sob instruções
americanas.
Mas por que os americanos pediriam ao Bundesbank para
requerer o retorno de uma parte do ouro alemão armazenados na
"segurança" dos porões do Federal Reserve Bank of New York na parte
baixa de Manhattan? Certamente não porque os porões estejam cheios de ouro
americano e eles tenham de arranjar espaço para mais.
É tudo grande teatro. Há uma agenda oculta que tem de ser
camuflada. O melhor meio de fazer isso é montar um show. O público fica
fascinado por imagens com tramas de ouro de bancos centrais.
Uma razão, talvez a principal para este exercício, é que os
administradores do sistema de moeda fiduciária (fiat money) global estão a
preparar-se para a próxima confrontação decisiva, a cortina final sobre o que
há alguns anos atrás chamei de The Last Contango in Washington. Por outras
palavras, os decisores políticos estão a preparar-se para (ou a tentar
defender-se da) a permanente escassez ( backwardation ) nos mercados futuros de
ouro de todo o mundo que está a ameaçar rasgar em pedaços o actual e desgastado
sistema de pagamentos mundial que repousa na fé (make-belief).
A multa por atraso ( contango ) é a condição normal dos
mercados futuros de outro quando o preço spot do ouro está com um desconto em
relação ao preço de contratos futuros. O contango demonstra que está disponível
muito ouro para satisfazer a procura actual. As pessoas estão confiantes em que
promessas de entrega de ouro serão honradas. A condição oposta à situação de
contango é chamada de escassez (backwardation) que se verifica quando os preços
futuros perdem o seu prémio em relação ao preço spot e ficam menores. No
mercado de ouro esta condição é altamente anómala porque, face a isto, permite
aos comerciantes ganharem lucros sem risco. Eles vendem ouro spot com um prémio
e compram-no de volta com um desconto para entrega futura. Contudo, lucros sem
risco são efémeros uma vez que a própria acção de comerciantes os eliminará
instantaneamente. O que isto sugere é que escassez permanente de ouro nunca
poderia acontecer pela própria natureza do caso.
Mas sem o conhecimento do público geral um perigo muito
grande está a surgir, perigo semelhante a um que não ameaçava o mundo desde o
colapso da parte ocidental do Império Romano há mais de 1500 anos atrás. Este
perigo, se se materializar, marcaria o fim da nossa civilização e princípio de
uma nova Idade Média (Dark Age). Estou a falar acerca da ameaça do súbito e
completo colapso do comércio mundial. Isto seria anunciado pela escassez
permanente de ouro, algo que alegadamente nunca poderia acontecer. Directamente
nos seus calcanhares seguir-se-ia o colapso do sistema de pagamentos em dólar.
O comércio por trocas (barter), naturalmente, começaria entre países vizinhos,
mas o comércio mundial tal como o conhecemos desapareceria junto.
O indicador pelo qual a viragem do contango para a escassez
(backwardation) poderia ser medido é chamado a base ouro. É o prémio sobre o
preço do ouro para entrega futura de acordo com o contrato que o acompanha
relativo ao preço spot. Portanto a base ouro negativa é equivalente a escassez.
Mal se passaram uns 40 anos de história de orientação pela base ouro, porque
não havia comércio organizado de futuro de ouro antes de a América incumprir
suas obrigações internacionais de ouro em 15 de Agosto de 1971.
O comércio de futuros começou com uma base ouro robusta. O
contango estava no seu pico. A base ouro não pode ser mais elevada do que o
pleno encargo de armazenagem (carrying charge) (também conhecido como o custo
de oportunidade de possuir ouro, cujo principal componente é o juro). Mas
bastante cedo a base ouro começou a erodir-se e a erosão continuou até hoje.
Isto foi um processo agourento e que foi ignorado por todos os políticos,
economistas e jornalistas financeiros.
O desvanecimento da base ouro é ainda mais curioso uma vez
que tem estado a acontecer contra o pano de fundo de um avanço constante no
preço do ouro. Os manuais de teoria económica ensinam que um avanço no preço
sempre e em toda a parte chama novas oferta. Contudo, os manuais de teoria
económica são impotentes quando se trata de ouro. Para o ouro, o verdadeiro é
exactamente o oposto: um avanço no preço faz a ofertar contrair; e um avanço
muito grande pode fazer a oferta desaparecer totalmente. A razão para este
paradoxo é que o ouro é um metal monetário. Toda a difamação do ouro por
economistas pagos por governo não alterará este facto. Nesta altura o declínio
foi tão longe que a base ouro é praticamente zero, com ocasionais afundamentos
em território negativo.
A academia evita ostensivamente investigar a base ouro,
pretendendo que ela tem tanta relação com a economia mundial quanto a base para
carcaças de porcos congelados. O público é mantido na ignorância total. Mas só
se pode ignorar a base ouro correndo perigo. Trata-se do único indicador
disponível que mostra a deterioração progressiva do sistema de moeda
fiduciária. Como é bem sabido, em toda a história nunca houve um experimento
com êxito de moeda fiduciária. E nem foi por falta de tentativas. Todos estes
experimentos ou foram abandonados quando governos esclarecidos decidiram
retornar a divisa a uma base metálica, ou acabaram em fracasso absoluto
provocando tremendo sofrimento económico para o povo quando a moeda fiduciária
estava a perder rapidamente todo o seu poder de compra.
A implacável contracção da base ouro significa que o ouro
disponível para entrega futura está a desaparecer rapidamente. O ouro está
constantemente a mover-se para mãos fortes que o agarram e não o abandonarão
mesmo em face de altas de preços abruptas. Finalmente a oferta de ouro secará e
a escassez esporádica dará lugar à escassez permanente. As minas de ouro
recusam-se a receber papel-moeda pelo seu produto. Se quiser ter ouro, terá de
recorrer ao barter.
Escassez permanente significa que a confiança na divisa
fiduciária em papel e nas promessas do governo de pagar evaporaram-se. Afinal
de contas, considerando a sua origem, notas de banco irresgatáveis são nada
mais do que promessas desonradas de pagar ouro. Uma vez estilhaçada a
confiança, todos os cavalos do rei e todos os homens do rei não podem juntar
Humpty Dumpty outra vez. A escassez permanente é como um buraco negro. Não há
caminho para dele sair. Nem mesmo um raio de luz pode escapar das suas garras.
Eis como os buracos negros ganharam sua fama. "Escassez permanente"
não é um nome tão sugestivo como "buraco negro", mas mesmo assim pode
devorar a economia mundial.
A base ouro é afim à eficiência do dinheiro de suborno. A
princípio o suborno é aceite sem se fazerem perguntas. Mas quando se torna uma
característica regular do comércio de ouro, a sua efectividade é perdida. No
fim o suborno é recusado quando se percebe que o objectivo é trapacear o
proprietário e retirar-lhe a sua posse de ouro. Um sistema de comércio
construído sobre o suborno é um castelo de cartas. Ele é desonesto. Depende do
engano e de tramas falsas.
Isto traz-me de volta à reserva ouro alemã. Como a escassez
esporádica em ouro torna-se cada vez mais frequente, os cavalheiros
responsáveis pelo andamento do sistema mundial de moeda fiduciária ficam
alarmados. O único meio de pacificar o mercado é libertar cada vez mais ouro de
bancos centrais. Ouro físico. A besta deve ser alimentadas. O ouro de papel não
o fará (mas, naturalmente, estes cavalheiros continuarão a tentar inundar o
mercado com ele).
Libertar ouro americano directamente do Fed para os mercados
de futuros está fora de causa. Isso confirmaria a suspeita, já desenfreada, de
que o dólar é um colosso com pés de barro sustendo-se com água até os joelhos.
Assim, deixem os estados clientes da América fazerem a libertação. Os alemães
têm a reputação de favoráveis à divisa forte. Eles estão relutantes em aderir à
"corrida para a base" das divisas. A Alemanha é a escolha natural
para alimentar mercados futuros de ouro num esforço para proteger o dólar
contra o último assalto que está a perfilar-se.
Durante muito tempo a América tem estado a torcer o braço de
outros países, incluindo o Reino Unido e a Suíça, fazendo-os vender centenas de
toneladas de ouro do banco central, ao passo que a América não estava a vender
nem uma onça. "Faça como eu digo, não como eu faço!" Durante todo
este tempo a Alemanha tão pouco estava a vender. Era mantida a aparência de que
esta decisão foi tomada na Alemanha. Não foi; ela tem, ao invés, a marca "made
in USA". O ouro alemão é a última defesa do dólar. Por esta altura
praticamente todos os bancos centrais ignoram o canto de sereia da América. De
vendedores eles se tornaram compradores de ouro. De acordo com o plano mestre
americano a Alemanha é a última fortaleza [a impedir] a desintegração do
sistema global de moeda fiduciária. A Alemanha não falhará: é para isso que se
mantêm tropas americanas no solo alemão. A Alemanha cumprirá obedientemente a
tarefa de alimentar com ouro os mercados de futuros num esforço para defender-se
da escassez permanente. A repatriação de uma parte a reserva de ouro alemã é um
balão de ensaio. Se os mercados ficarem com medo e verificar-se pânico de
vendas antes de o Bundesbank começar a vender, então muito melhor. Mas se a
trama falsa fracassar e a marcha do mercado mundial de ouro rumo ao
entesouramento privado continuar constante, então deixem o Bundesbank, não o
Fed, sangrar ouro. O ouro da América deve ser poupado apesar de todos os
riscos.
Sobre tais truques e enganos está fundamentado o sistema
monetário internacional.
Qual é, portanto, a solução? Como pode ser impedida a morte
súbita do comércio mundial? Felizmente, ainda há políticos erectos. Godfrey
Bloom do Parlamento Europeu, deputado pelos círculos de Yorkshire e North Lincolnshire
no Reino Unido, sugere que a Alemanha deveria repatriar TODO o seu ouro e
reinstaurar um marco alemão ouro.
A causa subjacente da crise financeira mundial é dívida
desenfreada. O ouro é o único extintor final de vida. A partir da sua expulsão
do sistema monetário internacional a dívida total no mundo só pode crescer,
nunca contrair. Para travar o crescimento canceroso da dívida o ouro deve ser
reinstaurado na sua antiga posição como o guardião da qualidade de dívida.
Se, em desafio dos desejos americanos, a Alemanha tomar a
iniciativa de criar um marco ouro e abrir a Cunhagem Alemã ao ouro em que todos
os que se apresentarem possam converter seus lingotes de ouro em moeda de ouro,
o curso da história mundial será mudado. Seria o mais admirável momento da
Alemanha. A civilização terá sido salva e o arranque da nova Idade Média
impedido. O marco-ouro poderia circular lado a lado com o euro e dólar
irresgatáveis. Deixem as pessoas decidirem se querem ser pagas em divisas
fiduciárias tendentes à crise ou, talvez, se preferem a estabilidade da moeda
de ouro respeitada pela sua antiguidade. Não há dúvida do que seria a escolha
das pessoas.
A iniciativa alemã porá em funcionamento uma reacção em
cadeia de actos virtuosos semelhantes por parte dos principais bancos centrais
do mundo, a fim de impedir a depreciação fatal das suas divisas contra o
marco-ouro. Este tornar-se-á a divisa mais cobiçada do mundo para comércio
internacional. O sistema financeiro será salvo do suplício das desvalorizações
competitivas de divisas e do efeito corrosivo de défices governamentais sempre
em expansão. Governos serão forçados a enfrentar a realidade e viver
responsavelmente dentro dos seus meios como toda a gente. Agricultores já não
serão pagos para não cultivar a terra e trabalhadores fisicamente aptos para
não trabalhar. O desemprego juvenil, em particular, será coisa do passado.
Há um precedente. Em 1948 a Alemanha desafiou a força
ocupante quando criou o Deutsche Mark sem se aborrecer a pedir permissão em
Washington.
Mas não será o padrão tendente à deflação? Na década de 1930
o padrão ouro internacional entrou em colapso por causa disto mesmo, não foi?
Como disse o pai do Deutsche Mark, Wilhelm Röpke
(1899-1966): não foi o padrão ouro que fracassou, mas aqueles a cujos cuidados
estava confiado.
[*] Nasceu em
Budapeste, Hungria, em 1932. Matemático e cientista monetário. Em 1958 foi
nomeado professor assistente de Matemática e Estatística na Memorial University
de Newfoundland, Canadá e em 1993 reformou-se como Professor Titular. Em 1974
fez uma palestra sobre ouro no seminário de Paul Volcker na Universidade de
Princeton. Posteriormente, foi investigador visitante (Visiting Fellow) no
American Institute for Economic Research e editor sénior da American Economic
Foundation. Em 1996 o seu ensaio, Para que o ouro? (Whither Gold?), que se
encontra em http://www.fame.org/htm/Fekete_Anatal_Whither_Gold_AF-001-B.HTM ,
ganhou o primeiro prémio no concurso internacional sobre divisas patrocinado
pelo Bank Lips, da Suíça. Durante muitos anos foi perito em vendas e hedging de
barras de ouro de bancos centrais, e os seus efeitos sobre o preço do ouro e da
própria indústria da sua mineração. Dedica-se agora a escrever e fazer
palestras sobre reforma fiscal e monetária, com ênfase especial no papel do
ouro e da prata no sistema monetário.
No sítio web do
jornalista Lars Schall consta também esta entrevista do prof. Fekete: "
Gold: Permanent Backwardation Ahead! "
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