Antes de qualquer coisa é preciso deixar algo claro: impeachment
é um instrumento previsto na Constituição, portanto legal. Porém, faz-se
necessário que, para haver impeachment, haja de fato algum crime de
responsabilidade e as tais “pedaladas” fiscais são, por ora, motivo de intenso
debate e controvérsia entre juristas.
Inclusive havendo uma corrente que defende o julgamento do mérito pelo
Supremo Tribunal Federal. Dito isso sigamos adiante.
A incrível derrota sofrida pela jovem Democracia brasileira
no último domingo foi também a pá de cal no nosso presidencialismo de coalizão,
termo cunhado pelo cientista político Sérgio Abranhes. Não seria de todo ruim,
caso houvesse algo a disposição para sucedê-lo. Ao contrário, parece que o que
nos reserva o futuro é, se levarmos em conta as intenções de quem financiou o
golpe – FIESP e Instituto Millenium à frente – uma “democracia” sem sindicatos,
movimentos sociais, partidos populares, uma sociedade onde não haja o equilíbrio
gerado por conflitos e tensões. Ou seja, algo parecido com o que Albert Camus
um dia chamou de “afirmação total”, a afirmação do status-quo e a negação da
revolta. Portanto, algo muito distante de qualquer tipo de sociedade em que se
busque de alguma forma, ainda que tímida, reverter o processo de acúmulo do capital e
distribuí-lo de maneira mais honesta e racional.
C.B. McPherson, cientista político canadense, autor de "A teoria política do individualismo possessivo", limitou a
democracia representativa como sendo uma democracia formal. Essa seria o conjunto do Estado
com suas instituições regradas por governantes/representantes eleitos em
eleições regulares e periódicas. O contraponto a essa democracia seria a
“democracia substancial”, aquela onde se encontra efetiva participação popular
e o empoderamento da sociedade se dá de forma contínua. Com certeza FIESP e Instituo
Millenium não anseiam uma democracia substantiva, pois, para tanto, é
necessário respeitar alguns direitos básicos e a própria dignidade humana.
Mas voltando ao show de horrores que tivemos o desprazer de
assistir no domingo passado. Restou claro e patente que a História sempre
cobrará em algum momento a fatura pelas nossas escolhas. É extremamente
emblemático notar que todos os deputados
do PSOL – que nos últimos dez anos foram inúmeras vezes motivo de deboche e
chacota por parte dos petistas – se
posicionaram de forma contundente contra o golpe de Estado elaborado por
Eduardo Cunha, Michel Temer, Aécio Neves et caterva. Tão emblemático quanto foi
ver Ronaldo Lessa (PDT-Alagoas) ser o
último a votar e votar contra o golpe. Lessa para quem não sabe ou não se lembra,
foi governador de Alagoas e por diversas e reiteradas vezes traído pelo PT. Continuando nessa linha não podemos deixar de
citar o trabalho de Flávio Dino, governador do Maranhão, que nos dias que
antecederam o show de horrores trabalhou incessantemente contra o golpe. Justo
ele que quando digladiou contra a oligarquia Sarney foi abandonado e traído
pelo PT. Por outro lado, também emblemático e sintomático, foi a postura dos
aliados preferenciais do PT nos últimos tempos. Figuras como Paulo Maluf,
Sarneyzinho e Newton Cardoso Jr. (para ficarmos em três exemplos bem representativos)
votaram a favor do golpe travestido de impeachment.
A traição por parte dos neoaliados do PT era previsível e
anunciada. André Singer no ótimo “As raízes do lulismo – reforma gradual e
pacto conservador” (2009) já mostrava profundas preocupações sobre os limites do
consenso formado em torno de uma agenda de inserção social e equilíbrio
político que claramente primava pelo consenso e a não ruptura. Vladimir Safatle
escrevendo uma série de artigos para a revista Carta Capital antes das jornadas
de junho de 2013, já alertava sobre o apodrecimento de nosso presidencialismo
de coalizão e a radicalização política que se aproximava.
Quando o PT se reinventou no governo, deixando de ser um
partido firme na defesa das propostas do campo democrático popular e grande
formador de quadros para se tornar um partido adepto do presidencialismo de
coalizão, do governismo de gabinete e tocado na base da liberação de verbas e
emendas, ele se tornou apenas um partido um pouco menos distante dos movimentos
socais, sindicatos e sociedade civil organizada do que os seus antecessores no
poder.
Isso explica bastante a razão dos pequenos discursos
proferidos pelos parlamentares petistas não terem sido tão contundentes se
comparados com os dos deputados do PSOL ou do PCdoB. Falta-lhes, a maioria dos parlamentares
petistas, a energia de quem luta por um sonho, o sonho de transformar o mundo e
não apenas o mundo ao seu redor. Falta-lhes utopia. Sobra-lhes pragmatismo.
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