sábado, 15 de maio de 2010

Solução da crise grega é implementação de ultra-neoliberalismo

Do Blog do Rovai

A crise fiscal grega está levando a Grécia a uma solução ultra-neoliberal imposta pelo FMI e pela União Européia para que o país não entre em default. O empréstimo de 110 bilhões de euros será pago não apenas com juros considerados altos, de 5%, como com congelamento de salários, liberalização de direitos trabalhistas, redução nos valores de aposentadorias do setor público, fusão de fundos de pensão, aumento do número de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza, como também uma previsão de queda no PIB de 4% em 2010 e de 2,6% em 2011.

As medidas levaram o deputado europeu Daniel Cohn-Bendit, que faz parte do Partido Verde Alemão e foi um dos líderes dos protestos estudantis de 1968 na França, a dizer que a União Européia enlouqueceu ao colocar tais medidas como condição para que o empréstimo fosse concedido.

O objetivo é fazer com que o déficit público do país que é de 13,6% seja reduzido para abaixo de 3% em 2014.

Nesta semana estive em Atenas e Salônica, a primeira e a segunda cidades gregas. Em Atenas no dia 5, quarta-feira, havia acontecido o maior protesto das últimas décadas no país. Líderes do movimento social local afirmam que aproximadamente 300 mil pessoas estiveram na passeata. O evento, porém, não teve um desfecho favorável. Alguns manifestantes lançaram uma bomba de gasolina em um banco e três bancários morreram sufocados. Uma delas estava grávida de quatro meses. O fato causou comoção no país, em especial em Atenas, e está sendo explorado pela mídia e pelo governo. Isso pode levar os protestos a perderem força e apoio popular. Antes desse episódio, uma pesquisa apontava que aproximadamente 2/3 da população era contra as medidas e a favor das manifestações para que o acordo com a União Européia não fosse implementado nos termos que foi anunciado.

Em Salônica, não se vê indícios das manifestações, mas em Atenas muitas lojas de grifes e principalmente bancos estão com suas vitrines e portas vidros quebradas e pichadas. Há uma parte mais radicalizada do movimento social que tem como bandeira principal a nacionalização do sistema financeiro como uma das soluções para enfrentar a crise. Isso explica em parte o ataque às agências bancárias e a tragédia que levou à morte os três bancários.

A crise grega ainda não foi solucionada com o empréstimo de 110 bilhões de euros pelo FMI e pela comunidade européia. A solução apresentada pelo mercado é exageradamente neoliberal e dura com trabalhadores e aposentados e por isso deve resultar em uma forte reação popular. Quando as medidas começarem a ser implementadas e seus efeitos passarem a ser sentidos no dia a dia, tudo indica que os protestos podem ser ainda mais duros e radicais.

Conheça as principais medidas que têm motivado os protestos:



- Os benefícios dos trabalhadores do setor público serão reduzidos em 8%, enquanto os salários dos empregados em empresas estatais sofrerão corte de 3%;


- Os bônus de férias dos servidores públicos civis que ganham mais de 3 mil euros por mês serão cortados para até 1 mil euros, sendo que serão pagos da seguinte forma (250 euros no Natal, 250 na Páscoa e 500 nas férias);


- Os salários e aposentadorias do setor público serão congeladas por 3 anos;


- Corte de 13º e 14º salários no setor público;


- Drástica revisão da legislação trabalhista, que permitará pagamentos de salários menores que o mínimo e elimina adicional de hora extra, por exemplo;


- Aumento da idade mínima para aposentadoria para 65 anos para homens e mulheres. Sendo que a idade média aumenta em função do aumento da expectativa de vida.

Comentário meu: A crise que a Grécia e outros países da Europa – Portugal, Espanha e Bélgica, por exemplo – passam agora é ainda desdobramento da crise mundial eclodida em 2008. Num primeiro momento surgiu o Estado como única força capaz de salvar um sistema desregulado caminhando a passos largos para um futuro incerto, talvez até mesmo para a sua débâcle. Resultado: A Inglaterra praticamente estatizou seu sistema financeiro. Nos EUA, onde há uma forte tradição liberal de não intervenção estatal na economia, foi feito algo similar com grandes bancos e, sobretudo, com a indústria automobilística, para citarmos apenas dois casos.

Ainda em dezembro de 2008 as instituições financeiras já haviam recebido por cada dólar que tinham em depósito antes do deflagrar da crise o equivalente a “sessenta” dólares. Essa quantia, gasta por governos nacionais a fim de sanar tais instituições, já ultrapassara naquele momento, segundo dados da FAO (Food and Agriculture Organization), três vezes o valor necessário para erradicar a fome no planeta.

Não obstante a crise persistiu de forma selvagem após um curto período onde parecia domesticada e retornou com ímpeto, só que agora os governos nacionais e as organizações internacionais não dispõem de quantias o suficiente para contra-atacá-la e impedir um novo alastramento. A solução: aprofundar as políticas neoliberais, justamente as principais responsáveis pela eclosão e desencadeamento posterior da crise.

Mas e se essas medidas levarem a um agravamento exponencial da crise e a uma convulsão social no seio da Europa? Ah... nisso os grandes economistas do FMI e da União Europeia não querem nem pensar.

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