sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Sobre o ENEM

Se analisarmos a passagem de Paulo Renato de Souza pelo Ministério da Educação –1995 a 2003 – e apontar algo realmente de bom realizado por ele, com certeza esse “algo” será o ENEM. Por razões partidárias o mesmo ENEM que Paulo Renato tem se esforçado em desqualificar.

Obviamente que o governo Lula e seus ministros da Educação – Cristovam Buarque, Tarso Genro e Fernando Haddad – deram ao ENEM um papel muito maior nos últimos anos, mas isso também fazia parte da proposta inicial de FFHH e Paulo Renato, que por inúmeros motivos (interesses) não avançaram nela.

O ENEM tal qual está apresentado hoje significa não apenas um avanço no sentido de abranger um número cada vez maior de estudantes e instituições que o aceitam como parte do processo de seleção. Antes, o ENEM dá a Educação um caráter de política pública social séria e voltada para a diminuição da desigualdade social. Entretanto, uma política mais clara, e nacionalizada é importante ressaltar isso, de acesso a Universidade Pública ou de obtenção de bolsas, acaba inevitavelmente se chocando com interesses de grupos econômica e politicamente organizados.

Há quanto tempo ouvimos falar da famosa “indústria” dos cursinhos pré-vestibulares? Uma mina de dinheiro que passou a ver seus interesses baterem de frente com o Novo ENEM. É sintomático duma sociedade onde existe de fato um fosso social capaz de criar uma segregação secular e, pior, cujo fenômeno da segregação está na própria formação desta sociedade, a franca artilharia contra políticas públicas focalizadas na desconstrução dessa desigualdade. Na torpe visão elitista tanto ENEM quanto Cotas Raciais são crimes de lesa patrimônio perpetrados pelo Estado contra o status-quo.

Os problemas verificados na aplicação do ENEM nos dois últimos anos tomaram proporções dantescas nas páginas e imagens da mídia oligopolizada justamente por ela ser aquilo que Gramsci definiu como “Partido do Capital”. As falhas que houveram, e inegavelmente houveram, são incapazes de desqualificar todo o processo ou a proposta do exame. Essas falhas são inadmissíveis? De certo modo sim, uma vez que têm o potencial de prejudicar estudantes que se prepararam ao longo de todo o ano. Mesmo assim o percentual de estudantes prejudicados é ínfimo se considerarmos que foram cerca de 3,3 milhões de exames aplicados e somente dois mil apresentaram problemas.

Não obstante aos problemas ocorridos e às soluções propostas – uma delas seria a descentralização do ENEM, o que à primeira vista me parece deixar o processo mais vulneral a falhas e vazamentos, todavia não deixa de valer uma discussão mais aprofundada – como professor de escola pública e coordenador de curso pré-vestibular comunitário voltado a estudantes de baixa renda, enxergo como grande mérito do ENEM o fato de privilegiar o raciocínio à memorização de conteúdos. O que por sua vez permite ao ensino aplicado nas escolas ir além do preparo para enfrentar provas de uma ou outra universidade, tornando-se um instrumento mais justo e ao mesmo tempo menos excludente de acesso às universidades.

Ademais é importantíssimo frisar que o ENEM é fator de melhoria da qualidade do ensino médio e mecanismo de democratização do acesso à educação superior a milhares de jovens das escolas públicas. Isto acontece porque teve a ousadia de reconhecer que independentemente dos estudantes que tiveram acesso aos conteúdos programáticos dos vestibulares tradicionais, existe também o estudante intelectualmente apto a entrar numa universidade pública, mas que não teve acesso a estes conteúdos ao longo da vida escolar.

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