domingo, 26 de agosto de 2012
domingo, 19 de agosto de 2012
Os gloriosos anos FFHH pra nossa high society
Acabei de assistir uma reportagem da TV Folha na Cultura.
Sei que muitos vão pensar assim TV Folha + Cultura = Tucanada. Mas não é bem
assim, é quase isso, mas não é!
A reportagem em questão
é uma prova de como as privatizações e a quebra da soberania nacional
durante os período FFHH foi benéfica pra uma parte da sociedade brasileira. Pra
ser mais exato, pra nossa high society, a nossa elite. Pra esses o governo FFHH
foi um primor, um verdadeiro divisor de águas num país já marcado pela profunda
desigualdade social.
Vejam só. O ex-secretário da Pesca do governo FFHH se
empenhou e ajudou a modificar a legislação nacional a fim de facilitar a
autorização de pesca em águas brasileiras por embarcações estrangeiras.
Além do atentado a nossa soberania o que chamou a atenção e
mereceu tal reportagem foi o chamado
"pulo do gato". O maior beneficiário dessa "abertura" foi o
próprio ex-secretário de FFHH, Gabriel de Araujo, atualmente o maior
arrendatário de barcos japoneses que pescam atum na costa brasileira.
Leiam a matéria na Folha Online.
quinta-feira, 16 de agosto de 2012
Maria Izabel Noronha: Os professores são mesmo despreparados?
Por Maria Izabel Azevedo Noronha no Viomundo
A divulgação das notas médias que compõem o Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), publicadas no dia 14 de agosto pelo
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (INEP) do Ministério da Educação
aponta uma melhora na qualidade do ensino, que vem se desenvolvendo ano a ano.
Devemos,
no entanto, rememorar que, desde o ano de 1999 vem ocorrendo por parte de
setores do Estado brasileiro um processo de culpabilização dos professores
pelos problemas e deficiências da educação nacional. Somos submetidos a
avaliações excludentes e tachados de despreparados por alguns governantes.
O
fato, porém, é que essas deficiências e problemas da educação decorrem das
políticas e medidas educacionais implementadas por autoridades e gestores
educacionais em vários estados e municípios, entre eles o Estado de São Paulo,
como a “aprovação automática” dos alunos, cujas consequências o nosso Sindicato
denunciou e denuncia desde o início da sua implementação.
Nós,
professores, defendemos que a aprendizagem dos alunos seja avaliada, não para
reprová-los, mas para contribuir com o seu sucesso escolar, localizando suas
dificuldades e agindo sobre elas. Da mesma forma, tendo em perspectiva a
qualidade do ensino, lutamos pela valorização dos professores e demais
profissionais da educação.
Para
nós, qualidade do ensino e valorização dos professores são faces de uma mesma
moeda. A qualidade do ensino está intrinsecamente ligada às condições de
trabalho dos professores e às condições de ensino-aprendizagem dos alunos. Para
nós, os resultados do IDEB evidenciam o papel dos professores e a necessidade
de avançarmos em políticas que assegurem a melhoria da educação brasileira.
Devemos
nos perguntar, então: ao que podemos atribuir este processo progressivo de
melhoria da qualidade do ensino na educação básica?
Consideremos,
em primeiro lugar, que a estrutura das escolas da rede estadual nada mudou em
muitos anos. Ao mesmo tempo, diante de nossas reivindicações salariais, o
governo respondeu com um reajuste escalonado em quatro anos, sendo que, na
parcela de 2012, anunciou um índice de 10,2% mas, efetivamente, pagou apenas
5,2%, pois os demais 5% se referem à incorporação da Gratificação por Atividade
de Magistério, objeto de lei específica, aprovada em 2009 pela Assembleia
Legislativa. Finalmente, como resultado de nossa luta histórica, conseguimos a
incorporação de todas as gratificações ao salário base e lutaremos para que não
retorne este tipo de “política salarial” que, na verdade, corrói nosso poder
aquisitivo.
O
reajuste escalonado e a incorporação das gratificações significam ainda muito
pouco diante da desvalorização do poder de compra de nossos salários. Nós, da
APEOESP, dizemos que, apesar das condições existentes, o pouco de qualidade que
existe na rede estadual de ensino se deve ao trabalho e compromisso dos
professores e não às políticas educacionais do Estado. Por isto, indagamos:
como esperar melhorias mais substanciais em São Paulo, que não possui sequer um
Plano Estadual de Educação.
Falta
em São Paulo um Plano elaborado democraticamente por um Fórum Estadual de
Educação, assim como em nível nacional existe o Fórum Nacional de Educação.
A
análise dos resultados do IDEB, particularmente no Estado de São Paulo, deve se
refletir em mais reajustes salariais, na democratização da gestão educacional e
em tratamento mais digno para os professores, sobretudo no caso dos
temporários, denominados de “categoria O”, que não tem praticamente nenhum
direito profissional. Deve levar também à imediata aplicação da jornada do
piso, com a destinação de 33% da jornada de trabalho para atividades como
preparação de aulas, elaboração e correção de provas e trabalhos, formação
continuada no local de trabalho. Queremos ainda, de imediato, a recomposição do
reajuste de 10,5% prometido para 2012 e a reposição de 36,74%, referente as
nossas perdas salariais acumuladas.
No
que se refere ao ensino médio, os resultados mostram que este é um dos maiores
desafios educacionais do País. Desta forma, deve mesmo o Estado de São Paulo
insistir em implementar escolas de ensino médio de período integral ou deveria
investir na melhoria de todas as escolas de ensino médio, para alavancar este
nível de ensino, o que se refletirá na melhoria geral da educação?
Lançamos
um desafio: se o governo se sensibilizar com nossas demandas e propostas, de
valorização profissional e condições de trabalho, não teremos uma nota média de
5,4 no ensino fundamental, mas poderemos chegar à nota 8,0. A nossa categoria,
então, será aplaudida de pé por toda a sociedade.
*Maria
Izabel Azevedo Noronha é presidenta da APEOESP, vice-presidenta da Câmara
de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação e membro do Fórum Nacional
de Educação.
domingo, 12 de agosto de 2012
Música de Domingo - Pais e Filhos (Legião Urbana)
Não é clichê, mas sim uma homenagem aos da minha geração e que hoje são pais.
A banda preferida de 11 em cada dez adolescentes dos anos 80 com sua música simples e letra intimista.
A banda preferida de 11 em cada dez adolescentes dos anos 80 com sua música simples e letra intimista.
quinta-feira, 9 de agosto de 2012
Noam Chomsky: Na sombra de Hiroshima
Por Noam Chomsky, publicado por Esquerda.net
O 6 de
agosto, aniversário de Hiroshima, deveria ser um dia de reflexão sombria, não
só pelos terríveis acontecimentos dessa data em 1945, mas também pelo que
revelaram: que os seres humanos, na sua busca dedicada de meios para aumentar a
sua capacidade de destruição, finalmente tinham conseguido encontrar uma forma
de aproximar-se do limite final.
Os atos em
memória desse dia têm, este ano, um significado especial. Têm lugar pouco antes
do 50º aniversário do momento mais perigoso na história humana, nas palavras de
Arthur M. Schlesinger Jr, historiador e assessor de John F. Kennedy, ao
referir-se à crise dos mísseis cubanos.
Graham
Allison escreve na edição atual de “Foreign Affairs” que Kennedy ordenou ações
que sabia que aumentariam o risco não só de uma guerra convencional, mas também
de um confronto nuclear, com uma probabilidade que ele calculou em cerca de
50%, cálculo que Allison considera realista.
Kennedy
declarou um alerta nuclear de alto nível que autorizava aviões da Otan,
tripulados por pilotos turcos (ou de outro país), a descolar, voar para Moscou
e deixar cair uma bomba.
Ninguém
ficou mais surpreendido pela descoberta dos mísseis em Cuba que os homens
encarregados de mísseis semelhantes que os Estados Unidos tinham colocado
clandestinamente em Okinawa seis meses antes, seguramente apontados à China, em
momentos de crescente tensão.
Kennedy
levou o presidente soviético Nikita Krushov até mesmo à beira da guerra nuclear
e ele assomou-se da beira e não teve estômago para isso, segundo o general
David Burchinal, então alto oficial de planeamento do Pentágono. Ninguém pode
contar sempre com tal prudência.
Krushov
aceitou uma fórmula proposta por Kennedy, pondo fim à crise que estava à beira
de se converter em guerra. O elemento mais audaz da fórmula, escreve Allison,
era uma concessão secreta que prometia a retirada dos mísseis norte-americanos
da Turquia no prazo de seis meses, depois da crise ter sido evitada. Tratava-se
de mísseis obsoletos que estavam sendo substituídos por submarinos Polaris,
muito mais letais.
Em resumo,
mesmo correndo o elevado risco de uma guerra de inimaginável destruição,
considerou-se necessário reforçar o princípio de que os Estados Unidos têm o
direito unilateral de colocar mísseis nucleares em qualquer parte, alguns
apontando à China ou às fronteiras da Rússia, que previamente não tinha
colocado mísseis fora da URSS. Deram-se justificativas, certamente, mas não
creio que aguentem uma análise.
Juntamente
com isto estava o princípio de que Cuba não tinha o direito de possuir mísseis
para a sua defesa contra o que parecia ser uma invasão iminente dos Estados
Unidos. Os planos para os programas terroristas de Kennedy, Operação mangoose (mangusto),
estabeleciam uma revolta aberta e o derrube do regime comunista em outubro de
1962, mês da crise dos mísseis, com o reconhecimento de que o êxito final
requereria uma intervenção decisiva dos Estados Unidos.
As operações
terroristas contra Cuba são habitualmente descartadas pelos comentadores como
manobras insignificantes da CIA. As vítimas, como é de supor, veem as coisas de
uma forma muito diferente. Pelo menos podemos ouvir as suas palavras em “Vozes
do outro lado: Uma história oral do terrorismo contra Cuba”, de Keith Bolender.
Os
acontecimentos de outubro de 1962 são amplamente elogiados como o melhor
momento de Kennedy. Allison considera-os como um guia sobre como diminuir
perigo aos conflitos, gerir as relações das grandes potências e tomar decisões
acertadas acerca da política externa em geral. Em particular, aos atuais com o
Irã e a China.
O desastre
esteve perigosamente próximo em 1962 e não houve escassez de graves riscos desde
então. Em 1973, nos últimos dias da guerra árabe-israelita, Henry Kissinger
lançou um alerta nuclear de alto nível. Índia e Paquistão estiveram muito perto
de um conflito atômico. Houve inumeráveis casos em que a intervenção humana
abortou um ataque nuclear momentos antes do lançamento de informações falsas de
sistemas automatizados. Há muito em que pensar sobre o 6 de agosto.
Allison
junta-se a muitos outros ao considerar que os programas nucleares do Irã são a
crise atual mais grave, um desafio ainda mais complexo para os decisores
políticos dos Estados Unidos do que a crise dos mísseis cubanos, devido à
ameaça de um bombardeamento israelita.
A guerra
contra o Irã está já em andamento, incluindo o assassinato de cientistas e
pressões econômicas que chegaram ao nível da guerra não declarada, segundo o
critério de Gary Sick, especialista em Irã.
Há um grande
orgulho sobre a sofisticada ciberguerra dirigida contra o Irã. O Pentágono
considera a ciberguerra como ato de guerra, que autoriza o alvo a responder
mediante o uso da força militar tradicional, informa o The Wall Street
Journal. Com a exceção habitual: não quando os Estados Unidos ou um seu
aliado é quem o leva a cabo.
A ameaça
iraniana foi definida pelo general Giora Eiland, um dos maiores responsável
pela planificação militar de Israel, “um dos pensadores mais engenhosos e
prolíficos que [as forças militares israelitas] produziram”.
Das ameaças
que define, a mais crível é que qualquer confronto nas nossas fronteiras terá
lugar sob um guarda-chuva nuclear iraniano. Em consequência, Israel poderia
ver-se obrigado a recorrer à força. Eiland está de acordo com o Pentágono e com
os serviços de segurança dos Estados Unidos, que consideram a dissuasão como a
maior ameaça que o Irã coloca.
A atual
escalada da guerra contra o Irã aumenta a ameaça de uma guerra acidental em
grande escala. Alguns perigos foram ilustrados no mês passado, quando um barco
norte-americano, pertencente à enorme força militar estacionada no Golfo,
disparou contra um pequeno navio de pesca, matando um membro da tripulação
indiana e ferindo outros três. Não se necessitaria muito para iniciar outra
guerra importante.
Uma forma
sensata de evitar as temidas consequências é procurar a meta de estabelecer no
Oriente Médio uma zona livre de armas de destruição massiva e de todos os
mísseis necessários para o seu lançamento, e o objetivo de uma proibição global
sobre armas químicas – que é o texto da resolução 689 de abril de 1991 do
Conselho de Segurança, que os Estados Unidos e a Grã-Bretanha invocaram no seu
esforço para criar uma tênue cobertura para a sua invasão do Iraque, 12 anos
depois.
Esta meta
foi um objetivo árabe-iraniano desde 1974 e por estes dias tem um apoio global
quase unânime, pelo menos formalmente. Uma conferência internacional para
debater formas de levar a cabo um tal tratado pode ter lugar em dezembro.
É improvável
o progresso, a menos que haja um apoio massivo no Ocidente. Ao não se
compreender a importância desta oportunidade alargar-se-á uma vez mais a
fúnebre sombra que obscureceu o mundo desde aquele terrível 6 de agosto.
Artigo
de Noam Chomsky, publicado no jornal mexicano La Jornada. Tradução de Carlos Santos para Esquerda.net
domingo, 5 de agosto de 2012
quinta-feira, 2 de agosto de 2012
Mensalão e Judicialização da Política: a metáfora da mesa
Por TarsoGenro, via Carta Capital
O grande
legado da chamada “era Lula” não é o “mensalão”. Nem este é o maior escândalo
da história recente do país. Se a compra de votos para a reeleição do
Presidente Fernando Henrique Cardoso - que certamente ocorreu à revelia do
beneficiário - tivesse a mesma cobertura insistente da mídia e se os processos
investigativos tivessem a mesma profundidade das investigações do chamado
“mensalão”, a eleição que sucedeu aqueles eventos poderia ter sido inclusive
anulada e um mar de cassações de mandatos e de punições pela Justiça poderia
ter ilustrado, ali sim, o maior escândalo institucional da República.
Tratava-se da nulidade de um mandato presidencial, cuja viabilidade teria sido
literalmente comprada.
Assim como o
impedimento do Presidente Collor foi feito dentro do Estado Democrático de
Direito, o processo do mensalão” também o foi. Isso é bom para o país e bom
para a democracia. A compra de votos para a reeleição, porém, foi diluída em
termos de procedimento penal e logo arquivada também politicamente. Naquela
oportunidade a política não foi judicializada, consequentemente, não foi
“midiatizada” e, como sabemos, na “sociedade espetáculo” de hoje o que não está
na mídia não está na vida política.
O fato de
que o Estado de Direito funcionou em todos estes casos não quer dizer que isso
ocorreu de maneira uniforme. O tratamento não foi igual para todos os
envolvidos. As ações e providências políticas no Estado de Direito refletem no
espaço midiático de forma diversa e não cumprem finalidades meramente informativas.
São “mercadorias informativas” cujo objeto não é promover necessariamente
decisões judiciais perfeitas e justas, apenas passam o “olhar” dos detentores
do poder de informar. A Justiça, como a renda, é sempre distribuída
desigualmente, porque sobre a distribuição da Justiça e a distribuição de renda
incidem fatores externos às suas normas de repartição ideal, que se originam da
força política e econômica dos grupos envolvidos nos conflitos políticos.
O Estado
Democrático de Direito é o melhor não porque ele é o Estado perfeitamente
justo. O Estado de Direito é o desejável porque ele oferece melhores
possibilidades de preservar direitos e acolher demandas e porque ele é a melhor
possibilidade para preservar os direitos humanos e as liberdades públicas. O
processamento dos réus do “mensalão” deve ser considerado, assim, como uma
normalidade do Estado Democrático de Direito, mas o que não pode ser
considerado como aceitável é o massacre midiático que já condenou os réus e
condenou o PT e os petistas de forma indeterminada, antes do pronunciamento do
STF. E isso não foi feito de maneira ingênua.
Vejamos
porque isto ocorre. O grande legado da “era Lula” foi, além do início da
mudança do modelo econômico anterior, o início de uma verdadeira “revolução
democrática” no país, o que fez o seu governo ser tão combatido pela direita
neoliberal, cujas posições refletem na maior parte da grande mídia, que é
plenamente posicionada nos conflitos políticos e econômicos do país.
Mas o que é
esta “revolução democrática”? Suponhamos que a democracia seja uma grande mesa
onde todos, abrigados no princípio da igualdade formal, sentam-se para
viabilizar seus interesses e disputar algo da renda socialmente gerada pelo
trabalho social. Nesta grande mesa (resultado aqui no Brasil da Constituição
Democrática de 88), entre a promulgação da Constituição e os governos FHC,
todos sentavam nos lugares reservados por aquele ordenamento. Obviamente,
porém, alguns sentavam em bancos mais elevados, viam toda mesa, observavam o
que estava em cima dela para adquirir, para comprar, para “pegar” pela pressão
ou pelo Direito. Conversavam entre si de maneira cordata, transitavam
“democraticamente” os seus interesses, tendo na cabeceira da grande mesa os
Presidentes eleitos.
Outros
estavam sentados em bancos tão baixos que não viam o Presidente, não
participavam do diálogo, não sabiam o que estava em cima da mesa. Não tinham
sequer a quem se reportar em termos de exercício do seu poder de pressão.
Estavam só formalmente na mesa democrática, sem poder e sem escuta. O que Lula
promoveu foi apenas a correção da altura dos bancos, que agora permite aos
trabalhadores, sindicalistas ou não, com as suas grandezas e defeitos, os
“sem-terra” e “sem-teto”, os que não contavam nas políticas de Estado, os excluídos
que não podiam ascender na vida (inclusive os grupos empresariais e setores
médios que não tinham influência nas decisões do Planalto) verem o que sempre
esteve em cima da mesa.
O simples
fato de ver e dialogar permitiu que estes contingentes sociais passassem a
disputar a posse de bens e uma melhor renda. A democracia em abstrato tornou-se
um jogo mais concreto. Os governos Lula, assim, levaram a uma nova condição o
princípio da igualdade formal, que começa pelo direito das pessoas terem a sua
reivindicações apreciadas pelo poder, impulsionadas pelo conhecimento do que
pode ser repartido e do que está “em cima” da mesa da democracia.
Isso foi
demais. Significou e significa um bloqueio à ruína neoliberal que perpassa o
mundo e, embora tenha sido um projeto também negociado com o capital
financeiro, trouxe para a política, para o desejo de mudar, para a luta por
melhorias concretas, milhões e milhões de plebeus que estavam fora do jogo
democrático. Estes passaram a comer, vestir, estudar e reduzir os privilégios
da concentração de renda.
A
“plebeização” da democracia elitista que vigorava no Brasil é o fator mais
importante do ódio à “era Lula” e do superfaturamento político do “mensalão”.
Este é o motivo do superfaturamento, que pressiona o STF para que este não faça
um julgamento segundo as provas, mas faça-o a partir de juízo político da “era
Lula”, que cometeu o sacrilégio de “sujar” com os pobres a democracia das
elites.
Para não
entrar em debates mais sofisticados sobre Teoria Econômica, situo como premissa
- a partir de uma ótica que pretende ser de grande parte da esquerda
democrático-socialista - o confronto político sobre os rumos da sociedade
brasileira, após a primeira eleição do Presidente Lula: de um lado, tendo como
centro aglutinador os dois governos do Presidente Fernando Henrique, um bloco
político e social defensor de um forte regime de privatizações, alinhamento
pleno com os EEUU em termos de política global -inclusive em relação ao combate
às experiências de esquerda na América Latina- com a aceitação da sociedade dos
“três terços” (um terço plenamente incluído, um terço razoavelmente incluído e
um terço precarizado, miserável ou totalmente fora da sociedade formal, alvo de
políticas compensatórias), experiência mais próxima do projeto de
sócio-econômico dos padrões neoliberais, que hoje infernizam a Europa; de outro
lado, tendo como centro aglutinador os dois governos Lula, um bloco político e
social que “brecou” o regime de privatizações, reconstruiu as agências
financeiras do Estado (como Bndes, Banco do Brasil e Caixa Federal, para
financiar o desenvolvimento), estabeleceu múltiplas relações em escala mundial
-libertando o país da tutela americana na política externa- protegeu as
experiência de esquerda na América Latina e desenvolveu políticas públicas de
combate à pobreza, programas de inclusão social e educacional amplos, tirando
40 milhões de brasileiros da miséria, com pretensões mais próximas das
experiências social-democratas, adaptadas às condições latino-americanas.
Estes dois
grandes blocos têm no seu entorno fragmentos de formações políticas que ora se
adaptam a um dos polos, combatem-se, ou fazem alianças pontuais sem nenhuma
afinidade ideológica. Como também fazem alianças as direitas liberais com a
extrema esquerda e o centro, ora com a esquerda, ora com a direita. Mais
frequentemente estas alianças foram feitas para paralisar iniciativas dos
governos Lula, que sobrevivem até o presente, como as políticas de valorização
do salário-mínimo, as políticas de implementação do Mercosul, a política
externa quando valoriza os governos progressistas latino-americanas e as
políticas, em geral, de combate às desigualdades sociais e regionais.
Atualmente
perpassa, na maioria da mídia tradicional, uma forte campanha pela condenação
dos réus do “mensalão”, apresentando-os como quadrilheiros da impureza
política. A mídia seleciona imagens e produz textos que já adiantam uma
condenação que o Poder Judiciário terá obrigação de obedecer, pois “este é o
maior escândalo de corrupção da história do país”, o que certamente começou com
o Partido dos Trabalhadores e seus aliados no governo.
Os réus do
“mensalão” e o PT já estão condenados. Já foram condenados independentemente do
processo judicial, que muito pouco acrescentará ao que já foi feito, até agora,
contra os indivíduos e o partido, sejam eles culpados ou não, perante as leis
penais do país. O processo judicial, aliás, já é secundário, pois o essencial é
que o combate entre os dois blocos já tem um resultado político: o bloco do
Presidente Lula, em que pese a vitória dos seus dois governos, tornou-se -
partir do processo midiático - um bloco de políticos mensaleiros, cujas
práticas não diferem, no senso comum, de qualquer dos partidos tradicionais.
Vai ser muito duro recuperar estas perdas. Mas elas serão recuperadas, pois o
povo já se acostumou a ver o que está em cima da mesa da democracia e sabe que
ali tem coisas para repartir.
Tarso Genro
é atualmente Governador do Estado do Rio Grande do Sul
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