Após vários dias, semanas até, sem escrever nada – primeiro por absoluta falta de tempo, resultado de uma troca de emprego e logo em seguida pela convalescença e morte de minha mais que estimada avó, na verdade minha segunda mãe – começo a sentir saudades do hábito de expressar meus pensamentos através da escrita. Enquanto não volto a postar um texto meu, deixo com vocês essa pequena homenagem assinada pelo Professor Emir Sader a um dos homens mais valiosos do século passado.
Carlos: mulato, baiano, comunista, brasileiro
Por Emir Sader na Carta Maior
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=16218
Carlos Marighella é o protótipo do brasileiro. Amado na sua Bahia, com quem o povo baiano se identifica, como se identifica com Caimmy, com a Menininha do Gantuá, com tudo o que é expressão genuína daquelas terras tão brasileiras.
Filho de uma negra escrava, Maria Rita, linda, com pai de origem italiana, Augusto, Carlos é uma das expressões mais genuínas da mestiçagem do povo brasileiro. As conversas com os vizinhos da casa modesta onde nasceu e cresceu, em Salvador, as fotos com os colegas de escola, com os amigos, revelam o mulato sestroso, conversador, gentil, sensível, típico dos bairros populares da velha São Salvador.
Como quem chegou à adolescência naqueles anos-chave da década de 30, Carlos se identificou profundamente com os projetos revolucionários da década, antes de tudo com a lideranca de Prestes no PCB, depois da aventura extraordinária da Coluna. Viveu Carlos aí a primeira grande experiência, que o marcaria pelo resto da vida, consolidando nele a opção revolucionária.
Não protagonizou com sua participação os grandes debates no seio do PC ao longo das décadas seguintes. Seu protagonismo ficou reservado para os momentos mais difíceis vividos pelo Partido, logo depois do golpe de 1964. Já sua resistência à prisao na Cinelândia, no Rio, poucos dias depois do golpe, demonstrava a atitude de rebeldia e de resistência que Carlos imprimiria à sua atitude e à que convocava aos brasileiros.
Dessa vez Carlos foi o principal protagonista dos debates internos do PCB, sobre as razões do golpe e os novos horizontes de luta da esquerda brasileira. Ele se identificou de forma direta com a dinâmica proposta pela Revolução Cubana, que aparecia como uma alternativa real para os países em que as elites dominantes apelavam para a ditadura, diante das ameaças dos movimentos populares, optando pelo projeto norteamericano da Doutrina de Segurança Nacional.
Carlos conclamou a resistência a aderir ao projeto da luta armada, sob a forma da guerra de guerrilhas, rompendo assim com o PCB e fundando a ALN. Junto com a VPR, dirigida por Carlos Lamarca, protagonizaram a versão mais radical da resistência clandestina à ditadura militar, de que o espetacular sequestro do embaixador dos EUA – com a libertação de 15 militantes da resistência e a leitura de declaração contra a ditadura em cadeia nacional de rádio e televisão – foi uma de suas mais expressivas manifestações.
Os 40 anos passados desde sua morte na luta revolucionária de resistência à ditadura, só multiplicaram a imagem de Carlos Marighella, como dirigente revolucionário brasileiro e latinoamericano. Carlos, mulato, baiano, comunista, brasileiro.
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