segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Fraude em Honduras

‘Há uma enorme manipulação dos dados’, afirma investigador social.

Site Adital

http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=43439

Honduras viveu ontem (29) uma eleição marcada pela abstenção. No entanto, os representantes do governo de fato seguem manipulando os dados e afirmando que 61% dos eleitores participaram do processo. Isto é o que afirma o investigador social Ricardo Arturo Salgado em entrevista a ADITAL. De acordo com Salgado, a fraude destas eleições é evidente e ajuda a revelar a crise política vivida pelo país, onde não há mais democracia.

Mesmo com a manifestação e a resistência do povo hondurenho, o Golpe de Estado segue sem solução em Honduras. O investigador social destaca o papel dos Estados Unidos como cúmplices deste golpe e a triste participação da Organização de Estados Americanos (OEA) na busca de uma saída adequada à situação hondurenha.


Ademais, nesta entrevista, Ricardo Salgado fala das repressões do governo de fato à população em resistência e da importância de outras instâncias latino-americanas, como União das Nações Sul-americanas (Unasul) e Aliança Bolivariana dos Povos de Nossa América (Alba), para a desarticulação da OEA e, assim, conseguir uma situação melhor aos países da América Latina. "Para que [a região] latino-americana sobreviva política, econômica, ambiental e socialmente, a OEA deve desaparecer", considera.

Adital - Há muitas informações sobre o índice de abstenção e o não-respaldo às eleições. Qual sua impressão sobre a participação da população hondurenha e os dados divulgados pelo Tribunal Eleitoral?

Ricardo Arturo Salgado - Eu visitei centros eleitorais em Tegucigalpa em áreas populares e era evidente que a participação foi limitada, baixa. Os índices de abstenção apresentados ontem pelo TSE [Tribunal Supremo Eleitoral] apresentam inconsistências muito claras. Por exemplo: eles argumentam que houve uma participação de 61% dos eleitores registrados. No entanto, de acordo com o padrão eleitoral, havia 4,7 milhões de votantes registrados e votaram 2,5 milhões. Uma simples operação matemática demonstra que a participação não foi a que eles dizem. Há uma enorme manipulação dos dados.


Adital - Detenções arbitrárias, repressões… o processo foi amplamente militarizado. Quais as consequências dessa militarização ante um momento que deveria ser democrático?

Ricardo Arturo Salgado - Houve repressão durante toda a semana prévia, intensificada em 28, culminando em muitos atos intimidatórios ontem. Inclusive há um jornalista uruguaio, creio, ferido. Deve ficar claro perante todo o mundo que o processo de ontem não foi democrático. A repressão foi, é, e seguirá sendo uma parte da estratégia global utilizada para destruir a democracia em Honduras. Como tudo isso, as consequências são terríveis, mas nos dá lugar a um melhor posicionamento da luta popular. A fraude é tão evidente que podem promover o que queiram sem que o povo hondurenho deixe de entender que aqui não há democracia e que vivemos um circo de fato.

Adital - Como está o clima hoje após os resultados das eleições?

Ricardo Arturo Salgado - Agora mesmo há duas atividades da Resistência: uma assembleia e uma caravana à tarde. Até agora não se produzem incidentes. Se não há cobertura jornalística, é possível que deixem todo o avanço com normalidade. Do contrário, é possível que reprimam a caravana. No resto do país também há atividades, mas não se informam problemas até agora. É preciso não esquecer que não importa que números sejam corretos, o ganhador disto foi o povo que não compareceu no voto. A maioria ainda está pendente dos acontecimentos e segue em luta.

Adital - A posição dos Estados Unidos de reconhecer as eleições foi definitiva para legitimar o Golpe de Estado e a ditadura em que atualmente vive o povo hondurenho?

Ricardo Arturo Salgado - Estados Unidos foi cúmplice do golpe; esteve envolvido no mesmo desde o ano 2008. Reconhecer as eleições é parte do roteiro que eles mesmos escreveram. Estabeleçamos que o reconhecimento tácito ao golpe se dá quando se passa o "balão" a Oscar Arias; nesse momento deixam de lado as resoluções da OEA e da ONU [Organização das Nações Unidas] que exigiam restituição imediata e incondicional do Presidente Zelaya. Mesmo OEA tem feito um papel triste em tudo isso e não podemos descartar que seja cúmplice ativo incorporado a posteriori.

O jogo do consenso foi mais daninho que qualquer posição gringa. Este é dos Estados Unidos, e eles são responsáveis diretos do que passou e seguirá passando em Honduras. Fixe-se que a empresa da enquete que contratou o TSE é financiada por USAID. Eles estiveram envolvidos até na fraude de ontem à noite de maneira ativa.

Havendo fixado meu ponto de vista, minha resposta a sua pergunta é que a decisão de dar um golpe de estado, tomada pelo pentágono e o departamento de estado dos Estados Unidos da América foram de pseudo legitimação da ditadura. Mas outra coisa muito distinta é o que pensam os povos; deles emana a legitimidade ou não das ações de seus dirigentes.

Adital - O senhor crê que Unasul, Alba e outras instâncias sejam capazes de reverter ou de fazer um chamamento mais firme sobre a atual situação?


Ricardo Arturo Salgado - Eu estou convencido que os países da América Latina devem adotar uma posição mais firme e dar um passo adiante na desarticulação da OEA. A história desse organismo sempre resultou em graves consequências para nossos povos. Penso que se os países da Unasul, da Alba, apresentam uma postura contundente frente à existência mesma da OEA, há uma opção, uma possibilidade de que o golpe em Honduras se reverta e, sobretudo, evitem mais agressões contra outros países do continente.

Nossos governos devem apresentar sua retirada da OEA se não se retificam as ações cometidas contra o povo hondurenho. Se países como Brasil, Venezuela, Equador, e muitos outros rompem as cadeias históricas com esse monstro chamado OEA, teremos melhores opções de viver em paz, sempre vigiando nossas fronteiras e nossos frentes internos, mas em paz. Para que [a região] latino-americana sobreviva política, econômica, ambienta e socialmente, a OEA deve desaparecer.

Esta é minha opinião. Hoje depende da Unasul, da Alba, aceitando as consequências imediatas, que significarão a divisão entre governos populares e de direita em nossa América.

Nenhum comentário: