sábado, 6 de fevereiro de 2010

Weisbrot: Porque os Estados Unidos querem derrotar o PT nas eleições de outubro

O texto que segue é dum primor só. Agradeço ao Luiz Carlos Azenha através do Vi o Mundo e a internet por nos dar a oportunidade de ler um artigo desses, coisa que eu dificilmente tomaria conhecimento em outros tempos. Sob o título original de “The US game in Latin America”, o quase bicentenário diário britânico The Guardian traz uma excelente análise sobre como os EEUU pretendem manter seu imperialismo América Latina a fora e o papel que os ianques podem desempenhar nas próximas eleições brasileiras. É bom lembrar que essa é uma análise dum economista estadunidense – Mark Weisbrot. Portanto, não é nem petista e nem foi cooptado pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva.


O jogo dos Estados Unidos na América Latina


Inteferência dos Estados Unidos no Haiti e em Honduras são apenas os exemplos mais recentes das manipulações de longo prazo na América Latina

Por Mark Weisbrot*
, no jornal britânico Guardian, via Vi o Mundo
http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/weisbrot-porque-os-estados-unidos-querem-derrotar-o-pt-nas-eleicoes-de-outubro/

Quando eu escrevo sobre a política externa dos Estados Unidos em lugares como o Haiti ou Honduras, geralmente recebo respostas de pessoas que acham difícil acreditar que os Estados Unidos se preocupam suficientemente com esses países para tentar controlar ou derrubar seus governos. Estes são países pequenos, pobres, com poucos mercados ou recursos. Por que os formuladores de política de Washington deveriam se preocupar com quem os governa?

Infelizmente, eles se preocupam. Eles se preocuparam suficientemente com o Haiti para derrubar o presidente eleito Jean-Bertrand Aristide não apenas uma vez, mas duas. Da primeira vez, em 1991, foi feito de forma encoberta. Só descobrimos depois que as pessoas que lideraram o golpe foram pagas pela Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos. E então o Emmanuel Constant, o líder do mais notório esquadrão da morte -- que matou milhares de apoiadores de Aristide depois do golpe -- disse à rede CBS que ele, também, foi financiado pela CIA.

Em 2004, o envolvimento dos Estados Unidos no golpe foi muito mais aberto. Washington liderou um boicote de quase toda ajuda econômica internacional ao Haiti por quatro anos, tornando o colapso do governo inevitável. Como o New York Times informou, enquanto o Departamento de Estado dos Estados Unidos dizia a Aristide que ele deveria fazer um acordo com a oposição política (financiada por milhões de dólares de dinheiro do contribuinte americano), o Instituto Republicano Internacional [Nota do Viomundo: braço de política externa do Partido Republicano] dizia à oposição que não deveria fazer acordo.

Em Honduras no último verão e outono, o governo dos Estados Unidos fez tudo o que pôde para evitar que o resto do hemisfério fizesse uma política eficaz de oposição ao golpe em Honduras. Por exemplo, bloqueou uma decisão da Organização dos Estados Americanos de que não reconheceria as eleições que fossem realizadas sob a ditadura. Ao mesmo tempo, o governo Obama se dizia publicamente contrária ao golpe.

Isso foi apenas parcialmente bem sucedido, do ponto-de-vista das relações públicas. A maioria do público dos Estados Unidos acha que o governo Obama foi contra o golpe em Honduras, embora em novembro do ano passado foram publicadas várias reportagens e editoriais críticos dizendo que Obama tinha cedido à pressão dos republicanos e não tinha feito o suficiente. Mas isso era uma leitura equivocada do que aconteceu: a pressão republicana de apoio ao golpe hondurenho mudou a estratégia de relações públicas do governo Obama, não sua estratégia política. Quem acompanhou os eventos de perto desde o início pode ver que a estratégia política era bloquear e adiar quaisquer tentativas de restaurar o presidente eleito [Manuel Zelaya], enquanto se pretendia que o retorno à democracia era o verdadeiro objetivo.

Entre os que entenderam isso estavam os governos da América Latina, inclusive os peso-pesados como o Brasil. Isso é importante porque demonstra que o Departamento de Estado estava disposto a pagar um preço político significativo para ajudar a direita em Honduras. Isso convenceu a grande maioria dos governos da América Latina de que [o governo Obama] não era diferente do governo Bush em seus objetivos no hemisfério, o que não é um resultado prazeiroso do ponto-de-vista diplomático.

Por que se preocupar com a forma com que esses países pobres são governados? Como qualquer bom jogador de xadrez sabe, os peões contam. A perda de alguns peões no começo de um jogo pode fazer a diferença entre quem vence e quem perde. Eles olham para esses países como uma questão de poder bruto. De governos que concordam com a maximização do poder dos Estados Unidos no mundo, eles gostam. Daqueles que tem outros objetivos -- não necessariamente antagônicos aos Estados Unidos -- eles não gostam.

Não é surpreendente que os aliados mais próximos do governo Obama no hemisfério são os governos direitistas da Colômbia ou Panamá, embora Obama não seja ele próprio um político de direita. Isso demonstra a continuidade da política de controle. A vitória da direita no Chile, a primeira vez que venceu uma eleição em meio século, foi uma vitória significativa para os Estados Unidos.

Se o Partido dos Trabalhadores de Lula perder a eleição presidencial no Brasil no outono, isso seria outra vitória para o Departamento de Estado. Embora autoridades do Departamento de Estado sob Bush e Obama tenham mantido uma postura amigável em relação ao Brasil, é óbvio que eles se ressentem profundamente das mudanças na política externa brasileira que aliaram o Brasil a outros governos social-democratas do hemisfério e se ressentem da posição independente do Brasil em relação ao Oriente Médio, ao Irã e a outros lugares.

Os Estados Unidos intervieram na política brasileira tão recentemente quanto em 2005, organizando uma conferência para promover mudanças legais que tornariam mais difícil para legisladores mudar de partido. Isso teria fortalecido a oposição ao Partido dos Trabalhadores (PT) do governo Lula, já que o PT tem disciplina partidária mas muitos políticos da oposição, não. Essa intervenção do governo dos Estados Unidos só foi descoberta no ano passado através de um pedido de informações sob o Freedom of Information Act [Nota do Viomundo: Lei americana que permite obter, na Justiça, informações sigilosas do governo] apresentado em Washington. Há muitas outros intervenções por todo o hemisfério das quais não sabemos. Os Estados Unidos tem estado pesadamente envolvidos na política do Chile desde os anos 60, muito antes de organizar a derrubada da democracia chilena em 1973.

Em outubro de 1970, o presidente Richard Nixon andou gritando no Salão Oval, sobre o presidente social democrata do Chile, Salvador Allende: "Aquele filho da puta!", disse Richard Nixon no dia 15 de outubro. "Aquele filho da puta do Allende -- vamos esmagá-lo". Algumas semanas depois ele explicou:

A maior preocupação no Chile é que [Allende] consolide seu poder e a imagem projetada para o mundo será de seu sucesso... Se deixarmos líderes em potencial da América do Sul pensarem que podem se mover como o Chile, teremos dificuldades.


Este é outro motivo pelo qual peões contam e o pesadelo de Nixon se tornou verdadeiro 25 anos depois, quando um país depois do outro elegeu governos de esquerda independentes que Washington não queria. Os Estados Unidos acabaram "perdendo" a maior parte da região. Mas estão tentando ganhar de volta, um país por vez. Os menores e mais pobres e mais próximos dos Estados Unidos são os que mais correm risco. Honduras e o Haiti terão eleições democráticas um dia, mas apenas quando a influência de Washington sobre a política deles for reduzida.

* Mark Weisbrot é co-diretor do Centro de Pesquisa Política e Econômica de Washington

Um comentário:

Blog do Morani disse...

Meu caro Hudson:

O seu comentário, abordando as palavras ditas por Weisbrot a respeito da intervenção do Estados Unidos nas próximas eleições aqui dentro do Brasil, para a Presidêndia da República, está coberto de verdades inquestionáveis. Lula deveria pensar três vezes, antes de se postar ao papel de "aliado" ou de um "estadista" sul-americano que recebeu o presidente iraniano - inimigo público dos EUA e de Israel. Ora, o "Este é o cara" passou dos limites aos olhos do Barak Obama. Então Lula não terá conhecimento ao intervencionismo do país da bandeira estrelada, em relação aos chamados países do Cone Sul? Eles sempre tiveram essa vocação e jamais a perderão. Faltou a Lula, mais uma vez, a humildade e o bom senso para saber que em casa de maribondo não se cutuca com vara curta, nem comprida. Os EUA, ainda são, quer queiramos ou não, o maestro dessa banda de cá dos continentes americanos. Acho que Lula está se fiando demais em sua popularidade dentro desse Brasil - eterno vassalo aos governos norte-americanos - dando um passo perigoso em direção ao apoio velado à política do enriquecimento de urânio iraniano.
Tem razão, você, em reafirmar o que disse Weisbrot: eles irão intervir, sim, no processo eleitoral brasileiro e com muita
força coercitiva. Não se brinca com os EUA. Infelizmente, ainda são o termômetro que indica esse ou aquele caminho a ser tomado por governos sul-americanos, e mais os nossos. Lula já terá esquecido o
famigerado "Plano Condor?" Não devia, mas ele está muito preocupado em fazer de Dilma Roussef sua substituta ao cargo mais elevado da política brasileira, e erradamente e, ainda, contra todos os princípios das Leis Eleitorais vigentes em nosso país.