*Por Tiago
Barbosa Mafra
Foto:
Giulianne Martins
A população de Poços de Caldas,
excetuando a elite, está exausta das mesmas discussões e da falta de solução
para os problemas. Desde 2005, manifestações tomam as ruas contra os sucessivos
aumentos da empresa concessionária do transporte coletivo e nada se modifica.
Circulamos em torno do problema e pouco é feito.
Neste fim de ano de 2012, a
juventude deu o pontapé inicial e aglomerou em torno da causa do transporte os
trabalhadores, idosos, portadores de necessidades especiais, crianças, enfim a
população de modo geral. Uma sequência de manifestações e reivindicações
fundadas na realidade vivida e na legislação vigente colocou em pauta mais uma
vez o aumento da tarifa do transporte coletivo no município. O diferencial é
que desta vez, para o delírio de muitos e desespero de poucos, nada parece ser
isolado. Os manifestantes estão mais organizados e batem no cerne da questão: a
relação do poder público (contratante) com a empresa (contratada).
Na audiência pública do orçamento
2013, ocorrida na última quarta feira (14/11/2012) na Câmara Municipal, os
manifestantes lotaram o recinto e cobraram dos vereadores uma postura mais
enérgica quanto ao custeio do meio passe estudantil e da possibilidade de
reajuste da tarifa.
Foi colocada em discussão uma
proposta simples: a busca de um mecanismo de previsão no orçamento do próximo
ano de custeio do meio passe estudantil, previsto numa lei aprovada pela
própria Câmara, mas em descumprimento desde sua promulgação.
No entanto, não basta apenas
agregar ao orçamento um meio de custeio. Faz-se necessário alguns apontamentos.
Primeiramente, é sempre bom lembrar que a garantia do meio passe está embasada
em lei, mesmo que a empresa use as gratuidades como argumento de legitimação do
reajuste, culpabilizando estudantes, idosos e portadores de necessidades
especiais. Mesmo que a empresa comprove que é onerada pelas gratuidades, o
poder público pode e tem o dever de encontrar formas de arcar com esses gastos,
de forma a não lesar nem os beneficiários das gratuidades, nem os demais
usuários.
Nesse sentido é possível passar
ao segundo ponto. A lei 2724 (1978) que regulamenta a concessão, no seu artigo
5º prevê: “As tarifas de ônibus serão fixadas e revistas pelo Executivo
Municipal, ‘ad referendum’ da Câmara Municipal, e mediante solicitação da
concessionária, devidamente fundamentada”. Chega-se então ao cerne do
problema do transporte e dos reajustes em Poços de Caldas: a fundamentação a
que a lei se refere. O grande problema nessa fundamentação é sua origem. A
fiscalização da empresa, que dá corpo às planilhas e tabelas que embasam os
reajustes, é um produto da própria empresa, com pouca ou nenhuma interferência
do Executivo Municipal. A prefeitura é a contratante e, portanto, deveria como
tal acompanhar efetivamente o desenvolvimento do serviço prestado, mas não é o
que ocorre.
Atitudes simples, que demandam
mais vontade política do que procedimentos burocráticos, não são colocadas em
prática porque a sede de lucro de uma empresa privada vem sendo sobreposta ao
interesse coletivo.
Um exemplo de como esta lógica
pode ser quebrada ocorreu em São Paulo, na gestão da prefeita Marta Suplicy,
que após uma fiscalização verdadeira, orientada pela prefeitura, com seus
próprios fiscais, lacres em odômetros, catracas e tacógrafos, comprovou a
existência de erros nas planilhas e prestação de contas de empresas do
município e descredenciou de uma só vez, nove empresas que descumpriam suas
obrigações.
Que fique claro que em nenhum
momento, alego que a empresa em Poços frauda seus dados, mas que é necessária
uma mudança na forma de coleta de dados que embasam o reajuste. O diretor da
empresa requer isenção de impostos e que o poder público arque com as
gratuidades. Que seja primeiramente reformulada a forma de fiscalização e
acompanhamento da empresa, que deve ser pautada a partir do interesse público,
não pautá-lo.
A Câmara Municipal pode até
inserir no orçamento do próximo ano verba para o meio passe, ou convocar a
comissão de tarifas a prestar esclarecimentos, mas se não pressionar
politicamente para que o Executivo Municipal mude a lógica de relacionamento
poder público-empresa, essas medidas apenas injetarão mais recursos em uma
empresa que já tem uma das tarifas mais caras do interior do país.
O transporte coletivo nas cidades
é de uso dos trabalhadores, que já arcam com uma tarifa absurda e que pode vir
a ser ainda maior.
O povo demonstrou sua
insatisfação, foi às ruas, parou o trânsito, enfrentou as feições fechadas de
PM´s (à serviço dos poderosos) e descontentes de empresários (os próprios
poderosos). Foi à Câmara, cobrou postura mais firme dos legisladores,
apresentou propostas. O povo cansou de circular, de girar em torno de um
problema sem saber por onde começar, por onde sair. O povo compreendeu que o
público está acima do privado.
Finalizo, com a frase que ecoou
pelas ruas da cidade nas últimas semanas, na boca de jovens e trabalhadores:
Três reais é roubo!
*Tiago Barbosa Mafra é professor de Geografia e História na rede
pública municipal e coordenador do curso pré-vestibular comunitário Educafro
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