Estou horrorizado com o modo com que a Folhona atacou a memória de tantos brasileiros que padeceram durante a ditadura militar. Inclusive iniciei um pequeno artigo sobre o tema, mas, sinceramente, não sei se terei estômago para terminá-lo.
Enquanto isso utilizo esse espaço para parabenizar Sean Penn pelo seu segundo Oscar de melhor ator.
Não. Tampouco tenho estômago para assistir a cerimônia de entrega da estatueta, acho-a banal, vulgar, desinteressante e um desfile de futilidades. O próprio valor do Oscar é relativo. Até mesmo de pouco valor para quem realmente ama a sétima arte, conhecendo de antemão o interesse comercial que o cerca e a existência de muitas outras premiações e festivais mais consistentes e sérios, porém menos glamorosos e importantes perante a indústria de massas.
Também não tive a oportunidade de assistir a “Milk – A voz da igualdade”. O filme lançado recentemente aqui no Brasil, conta a história de Harvey Milk, um corajoso ativista dos direitos civis, em especial dos homossexuais, nos EE.UU. da década de 1970. Todavia soube por gente que já o assistiu e entende de cinema melhor que eu, que a obra se baseia no tripé roteiro, escrito por Dustin Lance Black e inspirado numa história real; na direção do habilíssimo Gus Van Sant (lembram-se de Drugstore Cowboy e Gênio Indomável?); e claro, na forte interpretação de Sean Penn.
Mas, realmente, o que de fato me levou a escrever essas linhas sobre Sean Penn, além dele ser, em minha conta, o melhor ator em atividade em Hollywood e um dos menos hollywoodianos deles – quem já assistiu Sobre meninos e lobos (Mystic river), Natureza Selvagem (In to the wild) ou o remake de A grande ilusão (All the king's men), todos protagonizados por Penn, há de concordar comigo – é sua postura política e humana sem flashes ou elaborada por algum marqueteiro.
Fiquei entusiasmado com a possibilidade (realizada) de Penn levar outro Oscar. Em 2004 já levou pela descomunal performance do pai atormentado em Sobre meninos e lobos, e outro agora faria jus ao seu currículo. No entanto mais que isso simplesmente, uma nova estatueta para ele, viria a corroborar com a imagem que a ultraconservadora e hipócrita sociedade estadunidense está mesmo passando por um processo de transformação. Embora eu confesse não saber decifrar exatamente que tipo de transformação é essa. Mas, enfim, tanto por Penn em si quanto pelo papel e o que Harvey Milk representa, simbolicamente seria o enterro da “Era Bush”.
Penn foi até Bagdá em dezembro de 2003 a fim de ver in loco a destruição e massacre comandado pelos senhores da guerra do Pentágono e retornou declarando que a Casa Branca só decidiu atacar o Iraque porque o país não tinha as tais armas mortíferas que o governo Bush apregoava. ‘Vamos manchar covardemente nossas mãos de sangue inocente’, advertiu o ator. Depois ainda clamou o impedimento do presidente George Cowboy Bush e do vice Dick Cheney.
Antes disso, naquele mesmo ano, a Screen Actors Guild, o sindicato das estrelas e dos anônimos de Hollywood, divulgou comunicado denunciando pressões dos estúdios contra profissionais do cinema que ostentavam em público suas opiniões políticas – desde que, é claro, elas estivessem contrárias ao consenso fabricado em Washington. Não por acaso Sean, filho de Leo Penn, diretor perseguido pelo marcatismo durante a década de 1950 e boicotado por suas posições políticas, se viu vítima de perseguição durante a nova versão marcatista, o bushismo. Teve projetos engavetados e enfrentou a retaliação por parte da mídia neocon estadunidense.
Em 2007 o ator esteve na Venezuela para, em suas palavras, “observar por si mesmo a situação venezuelana”. Em várias ocasiões se encontrou com Chávez, com quem, entre outras coisas, percorreu bairros pobres de Caracas e visitou Pueblo Encima, cidade próxima à fronteira com a Colômbia. Encontros com o presidente da Asemblea Nacional Cubana, Ricardo Alarcón, e com o produtor espanhol José Ibáñez – responsável pela produção do documentário de Oliver Stone sobre Fidel Castro, intitulada Comandante – também fizeram parte de sua agenda naqueles dias.
Em novembro último, antes das eleições presidenciais ianques, a revista The Nation publicou entrevista de Raul Castro concedida a Sean Penn em Havana, na qual o líder cubano abordou a possibilidade de um eventual diálogo com Barack Obama onde tratariam temas como Guantánamo e o covarde bloqueio a ilha do Caribe.
E, é, justamente pela sua atividade política, pela sua firmeza na defesa das próprias opiniões, pelos papéis nada fáceis de ser interpretados e pela sua indelével qualidade como ator, que me senti rejubilado ao saber que a Aacaemy Awards tenha lhe concedido o Oscar de melhor ator também agora em 2009.
Muito embora eu tenha certeza que Sean Penn, hoje, seja muito maior que a própria academia.
Um comentário:
SEAN PENN – Um astro a serviço do “Good Sense”
Hollywood não é uma fábrica apenas de heróis fictícios. Embora durante décadas os tenha criado – sendo vários dos mais comuns mortais aos imbatíveis homens voadores invulneráveis – para deleite de platéias ávidas por super-homens que lhes acendessem a auto-estima e o desejo de a tudo sobreviverem, sem o desejar, no íntimo legaram às multidões verdadeiros homens superiores que fazem de suas existências, longe dos focos dos “spots”, das câmeras e dos gritos de diretores, uma verdadeira estrada que os desnudam a fundo, mostrando que não estamos diante de simples mortais, mas de cidadãos desligados dos palcos e dos cenários montados para a realização de sonhos e imbuídos de seus verdadeiros papéis de cidadãos do mundo.
Sean Penn é um desses poucos. A fibra de seu pai, o diretor Leo Penn, perseguido pelo macartismo na década de 50, passou, através do DNA, para o astro agora premiado com a estatueta Oscar que, como diz bem o senhor Hudson, tem valor relativo e não valoriza realmente, a não ser à roda de outros tantos astros e atrizes medíocres, que se escondem nas conchas dos sucessos efêmeros.
Realmente, suas andanças com fins humanitários – e porque não dizer políticos? – se evidenciam em suas visitas aos países massacrados pelo grande Bush o mais novo General MacCarthy, perseguidor contumaz de mentes brilhantes e que destronado de seu poder não deixou saudades. É verdade: a nação estrelada só invadiu o Iraque por já saber que lá não existiam armas químicas, sendo o único objetivo o de executar Saddam Hussein.
Sean Penn valoriza seu pai, como diretor e cidadão fiel aos seus princípios, e a si mesmo, pela igual fidelidade aos seus. Ele não precisa de um Oscar; o que ele precisa é que as pessoas livres de todas as nações dêem ouvidos aos seus apelos significativos, com a sua presença aos países perseguidos pelo poderio político, econômico e bélico dos EUA. A VIDA tem nele o seu maior ator e o seu mais valoroso defensor, o que faz dele maior que “Awards Academy”, no dizer do sociólogo e eclético comentarista Hudson Luiz Vilas Boas.
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