Nesse mês de maio, no dia 23 para ser mais exato, se passarão 40 anos desde a edição do disco-duplo Tommy da banda britânica The Who.
O mundo mudou, e muito, de lá pra cá. O homem foi a Lua (?), o Brasil já foi tri, tetra e agora é penta. O cinema foi substituído pelo vídeo-cassete, que foi substituído pelo DVD e que agora está dando a vez ao blu-ray. O Muro de Berlim caiu assim como o deus “Mercado” se mostrou feito de barro. A America Latina deixou de ser um conjunto de republiquetas de bananas, todas dominadas por milicos reaças, para se tornar ambiente fértil aos movimentos populares e democráticos. O Brasil elegeu e reelegeu um metalúrgico presidente da República – e não fosse esse metalúrgico a nossa desigualdade social ainda seria igual à de 1969. Entre avanços progressistas e sucessivas reações conservadoras, a Terra continuou a girar em torno do Sol e algumas continuam mui parecidas. (O golpismo da elite tupiniquim é exatamente o mesmo)
Contudo, temos também coisas boas que permanecem mais ou menos da mesma forma. Por exemplo, os fãs da “banda mais barulhenta de todos os tempos” seguem ouvindo a saga poética do garoto que não pode falar ouvir ou enxergar.
“Pete Townshend, Roger Daltrey, John Entwistle e Keith Moon – um dos quartetos mais poderosos da História do rock – conseguiram fazer da estória do garoto surdo, mudo e cego (deaf, dumb and blind kid) que se torna um ‘‘mago do pinbal” e falso messsias, uma obra atemporal. A ópera-rock Tommy se configuraria nos idos futuros num dos mais populares álbuns de Hard Rock – antes mesmo da invenção do Hard Rock.
A trama que se desenrola cadenciada pelo baixo elegante de John Entwistle e a batera de Keith Moon nos leva a uma viagem psicodélica. A gostosa sensação de curtir músicas com letras arrojadas – não sei se é bem esse o termo, mas na falta de outro que me venha a cabeça, fica esse mesmo – é fascinante. A crueza e crueldade do mundo se apresenta de forma alegórica e caricata. A instituição religião, seus dogmas e a fé dos humildes de coração formam uma tragicomédia lírica e algumas vezes assustadora. A sordidez do ser humano emana das letras compostas (quase todas) pelo gênio de Townshend e cantadas por Roger Daltrey – sem sombra de dúvidas um dos maiores vocalistas do tempo em que os deuses do rock caminhavam sobre a Terra.
É como se do fundo das canções do disco, algo de nosso ser mais mesquinho e corrupto implorasse por misericórdia e quem sabe por uma lobotomia. Vale à pena ouvir e prestar atenção na odisséia do jovem mago.
Tommy pode até não ser a obra-prima do The Who – há controvérsias em meu âmago sobre se é este ou então Who´s Next – mas com certeza é o mais autoral e foi o mais difícil de ser realizado, além de ter sido predecessor importante para outras obras do próprio quarteto (Quadrophenia) e outras bandas.
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