A esquerda indubitavelmente saiu enfraquecida do recente processo eleitoral. Ora porque entrou no processo de forma bastante tímida, ora porque sequer chegou a participar do decorrido processo. Onde, de fato, houve campanha de esquerda, essa viu-se resumida a uma campanha tartamuda.
A esquerda foi incapaz de afirmar contundentemente que o processo eleitoral, no molde tal como está, não passa de sofisma da ideologia dominante, qual seja, da burguesia. E esse sofisma é justamente o espaço encontrado pela burguesia para legitimar suas ações, seus interesses e conter o avanço das causas populares. Portanto é lógico que ao adentrar de cabeça no processo eleitoral burguês a dita esquerda desqualifica-se e torna-se esquálida diante dos partidos conservadores – muitos desses partidos conservadores enrustidos com o verniz de progressistas – e vê suas propostas e projetos abandonados ao ostracismo pela grande imprensa empresarial.
Não obstante os partidos de esquerda com potencial eleitoral, ainda que limitado, muitas vezes se viram no mesmo balaio dos partidos de direita ao não tocarem em temas mais profundos e não mostrarem projetos autênticos.
Os partidos de esquerda à medida que avançam dentro do processo eleitoral burguês tendem a distanciar de seus programas originários para adquirirem o discurso e o modus operanti burguês de administrar. Não por acaso os brasileiros, e mesmo os mais antigos na Europa Ocidental, há muito já não atendem as suas expectativas iniciais.
Além de cada vez mais abandonarem um programa partidário que lhes defina como bastião das causas populares em contraste aos partidos conservadores, ainda caem em descrédito, a desgraça total para o representativismo eleitoral, quando, enfim chegam ao poder executivo, seja em qual esfera for, e insistem na continuação das mesmas políticas que os adversários conservadores sempre fizerem e na qual possuem uma expertise. Expertise essa que os ditos esquerdistas não possuem. Insistem em deixar políticas públicas e inovadoras para caírem no conceito simples, desbotado, vazio e nada arrojado do “bom administrador”. Realmente torna-se mais fácil aliar-se e aceitar o sistema, querendo no máximo reformar ou humanizar o capitalismo – ingloriamente –, que pregar a revolução quando já se está no poder.
Esse o verdadeiro equívoco da dita esquerda no Brasil. Querer fazer uma reles administração municipal, estadual ou federal e relegar ao discurso de palanque – quando muito – um governo inovador com participação dos cidadãos e gestão popular. Isso num país marcado culturalmente pela falta de participação popular nas decisões políticas, o que com o tempo se transformou em resignação. Assim a massa ao comparar a esquerda com a direita não encontra distinção substancial entre ambas.
Analisando sobre a óptica de Gramsci todo o processo eleitoral burguês, o projeto partidário e a constituição da burocracia administrativa não passam de “pequena política”, cujo limite não passa de administrar o existente. Faz parte desta redução o esforço para subtrair ao debate público as opções de política econômica, aquelas que envolvem um questionamento dos próprios lineamentos da ordem social. Enquanto isso a “grande política”, aquela que põe em questão as estruturas de uma sociedade, é desqualificada por ser “ideológica”, “utópica”, “universalista”.
A esquerda ainda não tomou ciência, ou a perdeu, como preferirem, que num processo eleitoral burguês o seu papel consiste em fazer uma campanha didática alvejando as classes sociais. Uma campanha de conscientização sobre o embate Trabalho x Capital – ainda mais quando vivemos uma das piores crises do capitalismo dos últimos decênios, ou talvez até do último século, sendo esse um momento bastante propício para trazer a tona tal tema.
No mais não há como existir partido de esquerda que não esteja concomitante à movimentos sociais. E os movimentos sociais no Brasil encontram-se numa letargia contrastante com boa parte da América do Sul, onde foram justamente os movimentos sociais que protagonizaram a cena política nos últimos anos e levaram ao poder governos populares e, agora, dão sustentação a esses em países como a Venezuela, Bolívia, Equador, Paraguai e de certa forma também na Argentina.
Candidatos de partidos com programas típicos da esquerda revolucionária ficaram restritos a algumas postulações do PSOL ou então às do PCB e do PSTU onde tiveram. Na árdua e improvável tarefa de encontrar grandes partidos de esquerda, o que encontramos, ainda que raramente, são projetos de esquerda perpassando por alguns partidos já se amoldados ao estabilishment. Assim seria a candidatura, por exemplo, de Maria do Rosário em Porto Alegre e Luiziane Lins em Fortaleza, ambas do PT, de Sérgio Miranda em Belo Horizonte, essa do PDT, ou de Jandira Feghali pelo PCdoB carioca – muito pouco e talvez pare por aí.
A esquerda não pode se furtar de buscar meios que tornem compreensível sua mensagem contra a alienação e a favor da urgência de se construir uma nova sociedade. Pois a catástrofe para a esquerda é quando perde a consciência do seu papel de agente revolucionário contra o sistema para tentar reformá-lo e domesticar o capitalismo. Acaba na verdade sendo reformada pelo sistema e domesticada pelos interesses do capital.
2 comentários:
Friburgo, 29/10/08
Sobre o comentário "A ESQUERDA EM 2008" elaborado didaticamente pelo amigo, ainda que o não tivesse sido, só o fecho, de meu ponto de vista, está realmente espetacular por toda verdade nele contida.
"A ESQUERDA NÃO PODE SE FURTAR DE BUSCAR MEIOS QUE TORNEM COMPREENSÍVEL SUA MENSAGEM CONTRA A ALIENAÇÃO E A FAVOR DA URGÊNCIA DE SE CONSTRUIR UMA NOVA SOCIEDADE. POIS A CATÁSTROFE PARA A ESQUERDA É QUANDO PERDE A CONSCIÊNCIA DO SEU PAPEL DE AGENTE REVOLUCIONÁRIO CONTRA O SISTEMA PARA TENTAR REFORMÁ-LO E DOMESTICAR O CAPITALISMO. ACABA NA VERDADE SENDO REFORMADA PELO SISTEMA E DOMESTICADA PELOS INTERESSES DO CAPITAL".
Um grande abraço do amigo Morani, que declina seus agradecimentos pela deferência em colocar os seus comentários inseridos entre tantos outros em seu espaço.
Nizar disse em 31/10
Hudson Luiz
Tudo bem?
Na verdade, não existe uma esquerda que chegue ao poder e possa executar todas as seus princípios do dia para a noite.
É necessario muito tempo, até décadas. Ou pela via armada, que num país continental como o nosso, não terá sucesso.
Nas últimas eleições, tiveram resultados satisfatórios para a esquerda, pois o PT e os partidos de sustentação do Presidente Lula, venceram na maioria das principais cidades.
Isto significa, que os projetos poderão continuar. Significa também que estaremos fortes em 2010.
As tranformações sociais do governo Lula, tem dado ao nosso povo melhoria de vida. Mais de 30 milhões já passaram das classes D e E, para a classe C.
Temos faculdade para todos.
O poder aquisitivo triplicou.
A economia está estável pela primeira vez na história.
Os combustíveis não tem preços alterados há mais de 5 anos (isto é inédito)
Os empregos com carteira assinada, subiram de 8.000 por mês(2002), para 250.000 poe mês (de 2003 a 2008)
O risco Brasil desapareceu. Os investimentos estão chegando ao Brasil.
Pagamos o FMI, que era uma das nossas principais bandeiras a cumprir.
Temos reservas suficientes para não sermos tão afetados pela crise econômica mundial.
Continuamos crescendo.
É possível continuar a relação de mudanças feitas pelo governo Lula, por várias páginas.
O que precisamos na verdade é ter em mente que estas mudanças estão sendo fundamentais para outras mudanças no futuro.
Com esta consciência e com a união dos partidos que de esquerda se unindo é que poderemos continuar com as vitórias sociais que tanto sonhamos.
Um abraço !
Nizar El-Khatib
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