sábado, 24 de julho de 2010

As eleições de 2010 e as de 1945

O governo Lula é assim interpretado por dois dos principais pensadores da atualidade: Para o sociólogo franco-brasileiro Michael Löwy a melhor definição é a de um governo social-liberal. Já o filosofo húngaro István Mészáros reconhece avanços em alguns campos e ao mesmo tempo a manutenção, noutros campos, do establishment tradicional.

Mas o que será um eventual retorno dos tucanos ao palácio do Planalto? Uma segunda onda neoliberal, dessa vez mais empedernida a fim de evitar o retorno das forças progressistas, conjugada ao alinhamento automático com os EEUU na política externa.

Talvez ainda não tenhamos superado aquilo que Florestan Fernandes, fundador do PT, chamou de modernização conservadora. Contudo analisando dados divulgados pela recente pesquisa Vox Populi sobre os programas iniciados pelo governo Lula com melhor avaliação vemos o seguinte: Bolsa Família, 31%; Minha Casa Minha Vida, 22%; ProUni ,9%; Luz para Todos, 6% e o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), 6%. Todos esses são programas sociais de larga escala, fato inédito no país que um dia Eric Hobsbawm chamou de ‘monumento à desigualdade social’.

E é agora em 2010 que o Brasil decidirá o seu futuro. A decisão a ser tomada pelo povo brasileiro em outubro próximo será crucial para a próxima década e geração. Em outubro estará em jogo os rumos políticos da América Latina, o destino da maior reserva de petróleo descoberta nos últimos 30 anos, além, obviamente, da continuidade ou não dos programas de resgate social.

Pode até parecer esdrúxula, mas é nesse bojo que ouso fazer uma analogia entre a atual campanha à Presidência da República e a de 1945, pois ambas guardam alguns traços peculiares entre si.

Em 1945 Getúlio Vargas, detentor de popularidade que nenhum político brasileiro obtivera até então, apoiou o candidato do Partido Social Democrático a sua vaga. O nome deste candidato, Eurico Gaspar Dutra, general do Exercito e um sujeito tacanho, fleumático, provinciano, débil, néscio e desprovido de qualquer carisma. Seria não fosse o poderoso cabo eleitoral, um candidato anódino.

Pela oposição aglutinava-se em torno da União Democrática Nacional parte da intelectualidade brasileira de centro e direita, além de setores do mais fino conservadorismo tupiniquim. Grandes latifundiários e empresários, profissionais liberais e as viúvas da “República do Café com Leite”. Todos ciceroneando o Brigadeiro Eduardo Gomes, presidenciável da UDN. Eduardo Gomes era o inverso de Dutra. Herói nacional, um dos sobreviventes do “18 do Forte”, simpático, carismático, católico fervoroso e ainda por cima ‘boa pinta’ – solteiro, conquistou o voto de muitas mulheres graças ao porte garboso.

Eduardo Gomes era tido e havido como franco favorito. Tanto que num discurso no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, declarou: Não necessito dos votos dessa malta de desocupados que apoia o ditador para eleger-me presidente da república!

A malta de desocupados a que se referia o ilustre Brigadeiro era o movimento queremista e, em última análise, os trabalhadores brasileiros que identificavam em Getúlio o ‘Pai dos Pobres’.

Todavia a popularidade de Getúlio, sobretudo entre as classes mais baixas, levaram Dutra à vitória com 55% dos votos válidos, enquanto o Brigadeiro teve apenas 35%.

Claro que qualquer analogia ente o Brasil de 1945 e o de hoje, entre Getúlio e Lula ou entre Dutra e Dilma é forçar a barra. Porém, as forças que envergam as candidaturas – Serra de um lado, Dilma de outro – a popularidade de Lula e, o mais importante, a identificação que o povo brasileiro tem para com ele, me levam a crer que, embora os cenários sejam diversos, há também espaço para muitas semelhanças.

Dilma está muito mais preparada para eventualmente assumir a Presidência da República do que Dutra estava em 1945. O país hoje conta – dento daquilo que Mcpherson chama de democracia formal – com instituições bem mais sólidas e preparadas que àquelas relegadas pelo Estado Novo.

Já nas semelhanças, Dilma representa a continuidade – o que Dutra tanto queria representar e depois tentou romper – dum modelo de nacional desenvolvimentismo adaptado para a conjuntura do século XXI. Já Serra representa as elites atadas aos interesses internacionais de uma ordem (neoliberal) que ruiu em todo o planeta – assim como Eduardo Gomes representava um Brasil amarrado ao passado meramente exportador de matérias primas, não por acaso Roberto Campos era um dos intelectuais preferidos da UDN.

A identificação do trabalhador brasileiro para com o Presidente Lula poderá levar Dilma Rousseff, a mulher de confiança de Lula desde a crise do ‘mensalão’, a uma vitória sobre as forças políticas atadas a um Brasil que jamais serviu aos trabalhadores.

Nenhum comentário: