domingo, 20 de setembro de 2009

10 + – 8ª Posição: Bringing It All Back Home

Bringing It All Back Home (Bob Dylan)

Por Rubens Leme da Costa


http://www.beatrix.pro.br/mofo/dylan.htm

Gravado rapidamente, Bringing It All Back Home marca uma espetacular virada em sua carreira [de Bob Dylan]. Muitos consideram seu melhor trabalho até hoje, não apenas pelas músicas, mas também pela evolução como letrista.

O primeiro ponto a se destacar é o título do álbum: "Trazendo tudo de volta para casa" fazia uma referência que o rock havia nascido na América, nos anos 50, e não com as bandas britânicas que invadiam a América. Dylan tentava, dessa maneira, fazer um resgate não apenas do rock, mas também de si mesmo.

A capa trazia várias referências: no colo do cantor havia um gato batizado de Rolling Stone; atrás apareciam capas de discos de Robert Johnson, Lenya, Von Schmidt e The Impressions; à sua frente uma capa da revista Time; dentro da lareira o seu disco Another Side Of Bob Dylan. A morena que aparece logo atrás dele era Sally Grossman, esposa de Albert Grossman, empresário do cantor.

No disco ainda conta com algumas fotos, tais como o cantor tocando com Joan Baz, uma foto do cantor Peter Yarrow- do trio Peter, Paul & Mary -, além da presença do poeta beat Allen Ginsberg.

O disco traz dois momentos distintos: o lado A era essencialmente elétrico mostrando seu futuro e o lado B, acústico retratatando seu passado.

Bringing It All Back Home abria com "Subterranean Homesick Blues", que seria o primeiro compacto do disco. A canção já dava mostras do novo som do cantor, cheio de guitarras influencidas por Chuck Berry, com uma letra bem sarcástica.

Uma curiosidade dessa canção é a presença do poeta Allen Ginsberg no vídeo promocional. Dylan fica em pé, com cartazes na mão contendo trechos da letra que ele vai descartando enquanto a música é tocada. Ela alcançou apenas a 39ª posição nas paradas.

Bob Dylan possuía uma profunda admiração pelo escritor: "Ginsberg é um dos dois santos que eu conheço pessoalmente. Ele é o único escritor que eu respeito. Gosto de outros, mas não tenho o mesmo respeito que tenho por Allen. Ele tem uma grande qualidade: ele não é poeta apenas no papel. Eu não me considero um poeta da mesma maneira que não me considero um cantor que faz música de protesto. Mas Allen é um poeta verdadeiro. Ele chegou a musicar seus poemas."

Outro destaque do disco é "Maggie's Farm". Em 1961 Dylan cantava "Hard Times in the Country", em que narrava a exploração de um fazendeiro sobre seus empregados. Dylan também gostava muito da canção "Penny Farm", gravada pelo lendário músico Pete Seeger, em 1950. Dessas duas, nasceu "Maggie's Farm", em que o cantor canta que não trabalhará mais na fazenda de Maggie. Essa canção fez um enorme sucesso na Inglaterra, em 1978, quando a conservadora Margaret Thatcher subiu ao poder. A canção acabou dando nome a uma história em quadrinhos da revista inglesa Time Out.

"Love Minus Zero/No Limit" pode ser considerado uma anti-canção de amor, com Dylan usando uma metáfora de uma mulher isolada no mundo, mas que tenta evitar todas as armadilhas comuns em um relacionamento amoroso.

"On The Road Again" é uma sucessão de imagens grotescas, absurdas que tanto fascinavam o cantor nessa época. "Bob Dylan's 115th Dream" tem como grande curiosidade um ataque de risos do cantor logo no início da música. Dylan quebra a tensão da gravação rindo e depois a canta de um fôlego só. É com ela que o lado A é fechada.

O lado B, totalmente acústico, é o que traz os grandes momentos do disco. São apenas quatro canções, todas clássicas. Abre com "Mr. Tambourine Man", emblemática música que tenta narra a busca da transcedência de um artista. Nessa letra Dylan fala de todas as angústias de um ser humano. Há quem enxergue nela uma apologia às drogas já que "Tambourine Man" poderia ser um curandeiro e que essa transcedência que Dylan tanto busca venha através das drogas ilícitas., tese refutada pelo cantor: "as drogas nunca fizeram parte da canção. Parte da magia da canção vem dos "tambourine men" que encontrei pela vida. O mais impressionante é que essa intricada letra foi escrita quando o cantor tinha apenas 23 anos.

A segunda canção do lado B é "Gates Of Eden", uma canção sobre a salvação espiritual. A música teve como inspiração o poeta William Blake, que escreveu um texto chamado The Keys Of The Gates, que por sua vez tinha sido inspirado em The Gates of Paradise. Dylan joga com a ambiguidade mais uma vez e até hoje se discute se o cantor fala do Eden de uma maneira positiva ou negativa ou se é apenas uma representação de uma busca interior.

"It's Alright Ma (I'm Only Bleeding)" pega o título emprestado da canção de Arthur "Big Boy" Crudup "That's All Right, Mama", primeiro compacto de Elvis Presley, fato confirmado pelo cantor. Nela, Dylan tenta destruir todos os mitos da sociedade atual e fala das mazelas e traz uma das mais famosas frases de sua autoria "he not busy being born, is busy dying" (ele não está ocupado em nascer e sim em morrer). É uma canção que contesta a condição humana e alerta para a revolução sexual que viria a seguir. Um pesadelo em forma de letra.

O disco fecha com a não menos clássica "It's All Over Now, Baby Blue", que funciona como um adeus em diversos níveis. Nela Dylan aborda Carl Jung e o fenômeno da sincronicidade, dá seu adeus à esquerda, às ilusões amorosas e às ilusões plantadas na juventude. "A estrada é para os jogadores e é melhor usar seu bom senso", avisa o cantor logo no início da segunda estrofe. A melodia triste e lenta soa exatamente como um adeus, uma metáfora também ao velho estilo Dylan de cantar.

Lançado em março de 1965, Bringing It All Back Home foi um tremendo sucesso, apesar de confundir a crítica. Alguns desciam a lenha por Dylan ter aderido à guitarra elétrica, enquanto outros elogiavam a postura e consideravam o disco uma obra-prima.

Mas Dylan começou a enfrentar problemas e ser acusado de ter traído a música folk e apostando numa fórmula mais comercial, indo de encontro ao rock. Essas acusações o perseguiriam por todo ano de 1965.

Ironicamente, Dylan encontraria paz e respeito em sua excursão pela Inglaterra entre os meses de abril e junho, tendo na platéia os Beatles e os Rolling Stones. Dylan havia virado uma estrela ainda maior após os Beatles falarem como o cantor havia influenciado o quarteto. Foi nessa excursão que começaram as filmagens do documentário Don't Look Back, que seria lançado comercialmente em 1967 e foi dirigido por D. A. Pennebaker. De uma hora para outra, Dylan foi colocado no altar do mundo pop, deixando de ser apenas um cantor folk favorito dos universitários e foi alçado a condição de mito. Uma posição que o incomodou: "eu não me vejo com uma estrela e por isso não quero passar a imagem que sou isso. Eu prefiro me comportar da mesma maneira do início de minha carreira, quando eu era um desconhecido."


Faixas:


Lado 1

1. "Subterranean Homesick Blues" – 2:21
2. "She Belongs to Me" – 2:47
3. "Maggie's Farm" – 3:54
4. "Love Minus Zero/No Limit" – 2:51
5. "Outlaw Blues" – 3:05
6. "On the Road Again"– 2:35
7. "Bob Dylan's 115th Dream"– 6:30

Lado 2

1. "Mr. Tambourine Man" – 5:30
2. "Gates of Eden" – 5:40
3. "It's Alright, Ma (I'm Only Bleeding)" – 7:29
4. "It's All Over Now, Baby Blue" – 4:12


Músicos:

Al Gorgone, John Hammond, Jr., Bruce Langhorne e Kenneth Rankin (guitarras); Paul Griffin, Frank Owens (piano); William E. Lee, Joseph Macho, Jr. e John Sebastian (baixo) e Bobby Gregg (bateria).

Produção: Tom Wilson

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