terça-feira, 15 de setembro de 2009

O STF E OLGA BENÁRIO

Por Rui Martins no sítio “Direto da Redação”

www.diretodaredacao.com

Berna (Suiça) - A história é feita de heróis mas também de covardes e vendidos, aos atos de coragem se contrapõem os de traições. Vitórias são sufocadas por derrotas, longas que parecem eternas, e a luz do sol desaparece nas cavernas das prisões dos fascistas de todos os tempos.


Chegamos na encruzilhada, temida mas que parecia impossível de tão absurda, porque além de driblar a lei é também um ato de submissão a um governo estrangeiro, ressurreição e cópia conforme de um momento de trevas na história recente da humanidade.


Olga Benário Prestes, a jovem alemã presa grávida na antiga prisão da Frei Caneca, no Rio, era judia e comunista. Seu feto tinha sido gerado por Luiz Carlos Prestes, o Cavaleiro de uma Esperança que não chegou a concretizar. E a justiça brasileira, na sua Corte Suprema, o STF, rejeitou o que poderia ter impedido o crime hediondo mas legal – o de se deportar para a Alemanha nazista, uma judia com destino certo à morte num campo de concentração, tendo no seu ventre uma menina brasileira, nascida no campo da morte de Ravenscbruck, órfã de mãe já nos seus primeiros meses e que só veria o pai ao ter dez anos.


Esse hediondo crime legal, que ainda hoje envergonha nosso país e desqualifica nosso sistema judiciário, foi cometido dentro dos preceitos, prazos e exigência da lei, com arrazoados, falas e decisões assinadas por togados juízes da nossa mais alta magistratura – o Supremo Tribunal Federal. Mas os nomes da vergonha, daqueles que se sujeitaram aos desejos do Estado Novo e de seu capanga, chefe do Doi-Codi da época, Felinto Muller, se perpetuam e podem ser lidos, pelos amantes do Direito como os autores da pena de morte, decisão tomada por pusilânimes ou covardes.


Diz a Bíblia, que a justiça divina se aplica no decorrer de mil gerações. Amen, que assim seja. O relator do processo que negou habeas-corpus a Olga Benário foi o ministro Bento de Faria, o presidente do STF, Edmundo Lins, e os ministros Hermenegildo de Barros, Plínio Casado, Laudo de Camargo, Costa Manso, Otávio Kelly e Ataulfo de Paiva.


Coincidência ou ajuste de contas divino, Felinto Muller, o delegado Fleury daqueles anos, morreu carbonizado no único acidente internacional da Varig, alguns quilômetros antes de pousar no aeroporto de Orly.


A lei brasileira garantia que uma mulher em estado de gravidez avançado não poderia mais ser extraditada e que, depois de nascido o filho ou filha, já não poderia mais ser expulsa e extraditada. Mas, como dizia o ditador da época, “a lei, ora a lei”(expressão que se tornou antológica, repetida e observada mesmo por togados do STF), e logo surgiram juristas para justificar o desconhecimento da lei, como Clóvis Beviláqua, mesmo se a medida “visando a expulsanda, fosse atingir o nascituro”.


Triste episódio, triste lembrança, triste história do nosso Direito que poderá conhecer um remake, porque a honra, a coragem e a humanidade não são transmissíveis como os genes, mas se constroem no decurso da vida.

Um comentário:

Blog do Morani disse...

No dia em que se fizer uma relação dos erros cometidos pelo STF - Superior Tribunal Federal - esse, cometido contra OIga Benário, deverá ser o primeiro em grandeza de maldades e de baixarias dos doutos homens da época contra uma judia grávida. Quem sabe não tenha sido vingança contra o Cavaleiro da Esperança - Luiz Carlos Prestes? Isso pode ter sido um dos ingredientes, mas o que houve mesmo foi a submissão servil às forças que preponderavam à época, pois era clara a possibilidade da mulher de Prestes ser assassinada pelos nazistas. Quer dizer: jogaram àquela malta de homens violentos uma vítima que poderia ter sido imolada aqui mesmo nos secretos porões de nossa polícia política, mesmo carregando em seu ventre uma brasileira inocente.
A Justiça Divina alcançou um; praza os céus que essa mesma Justiça tenha cobrado dos demais senhores juízes suas dívidas para com aquela mulher e para com o próprio Prestes.