terça-feira, 30 de agosto de 2011
Venezuela: um país mudando o eixo
Em um pequeno mercado de um bairro na região oeste da cidade, não se pode comprar duas caixas de leite. Uma caixa por pessoa é o limite determinado pela senhora que atende atrás do balcão gradeado. O motivo comentado pelas ruas: mais um boicote das distribuidoras de alimento ao tabelamento dos preços da cesta básica. O racionamento informal não é novidade na Venezuela. O enfrentamento entre o governo do presidente Hugo Chávez e setores do empresariado ligados à oposição é intermitente, e perpassa toda a sociedade venezuelana nas grandes e nas pequenas ações.
Os boicotes da oposição são uma realidade na Venezuela. Havia o boicote ao processo eleitoral, que terminou no ano passado com a participação nas eleições de deputados. Mas seguem se repetindo casos de boicote alimentar. O sufocamento e a queda de popularidade do presidente são os objetivos. A resposta do governo vem na forma de incentivos morais – e institucionais – às tomadas de fábricas pelos trabalhadores e à criação de cooperativas que produzam e distribuam alimentos. Nas estações de metrô que ligam uma ponta da cidade à outra, painéis destacam o aumento de produtividade nas indústrias ocupadas pelos trabalhadores e mostram operários felizes com seu trabalho. Todos os painéis, como muitas outras coisas em Caracas, carregam um slogan como uma marca do sucesso da revolução: “Hecho en socialismo”.
Caracas está profundamente dividida. Não há meio termo: ou se está com o processo revolucionário ou se está contra ele. Em cada um desses grandes grupos existem variações de comprometimento e ideário, mas ninguém está indiferente às mudanças ocorridas na Venezuela desde que o Comandante Hugo Chávez venceu sua primeira eleição, em 1998. Na verdade, o processo já iniciara antes, com o Caracazo de 1989 – uma rebelião popular contra o governo de Carlos Andrés Pérez – e a tentativa de Chávez de tomar o poder pelas armas em 1992. Mas o avanço institucional da revolução bolivariana teve como impulso a chegada do Comandante à presidência e a divisão política que tomou conta do país a partir daí.
Na capital, o chavismo se espraia pela região central e pelo oeste da cidade. A leste, redutos de anti-chavismo, de defesa do neoliberalismo e até de certa indiferença política. Porém, sempre com o ódio por Chávez à flor da pele. Não é desgosto, não é indiferença. As elites venezuelanas nutrem verdadeiro ódio pelo líder idolatrado pelo povo. Povo este que não deixa por menos, e devolve o ódio das elites com ódio às elites. E com ainda mais respeito por Chávez.
O aniversário do presidente, comemorado no dia 28 de julho, foi momento de grande comoção popular em Caracas. Em frente ao Palácio Miraflores, a sede do governo federal, milhares de pessoas se aglomeraram para ouvir Chávez falar. Na Praça Bolívar, centro político da cidade, outras milhares participaram das comemorações cantando, dançando e ouvindo poesias e discursos. Pessoas de todas as idades, vestidas com as cores da Venezuela ou com o vermelho revolucionário. Nem a chuva e o calor que se alternaram durante todo o dia fizeram o povo se recolher. O gigante que esse povo tem vencido dia-a-dia é muito maior do que o clima instável.
Foram espalhados pela Praça Bolívar alguns painéis para que fossem deixados recados de aniversário ao presidente. Mas o povo segue sua própria ordem, sua própria lógica, e os desejos de saúde e muitos anos de vida se direcionaram menos ao aniversário de Chávez do que à doença que o líder enfrenta. Sobre o câncer muito se fala e pouco se diz efetivamente. A oposição já oscilou entre acusar Chávez de inventar a doença e defender a idéia de que ele não terá condições de saúde para seguir no poder. O governo, por sua vez, divulgou que Chávez estava saudável quando já sabia da doença. Nenhuma informação sobre o assunto é confiável, de lado a lado. Nenhuma informação sobre qualquer assunto repassada pela oposição é confiável.
O discurso anti-chavista ganha forte eco nos meios de comunicação privados. Globovisión e Venevisión lideram os ataques desde que a concessão da RCTV venceu e não foi renovada, em 2007. Não há a falsa neutralidade que caracteriza parte da mídia brasileira. A mídia privada venezuelana é abertamente contra o governo, assim como a mídia estatal é abertamente a favor. Há ainda um crescimento importante da chamada “mídia alternativa, comunitária e independente”. Em dez anos, o número de rádios comunitárias saltou de zero para quatrocentas, e o número de emissoras de TV comunitárias foi de zero para cinqüenta. O governo apóia esses veículos, que por sua vez apóiam o governo – mas de forma extremamente crítica. O apoio é ao “processo”, não necessariamente a Chávez.
A mídia comunitária é construída pelo povo, mas a participação popular não se esgota aí. Os Conselhos Comunais são um mecanismo importante de inclusão das comunidades no processo decisório e o interesse é efetivo. Há dificuldades, há uma burocracia corrupta no meio do caminho entre o poder popular e o governo, mas as pontes vão sendo construídas – e derrubadas – na dinâmica do processo.
Parte importante dessa dinâmica são as diversas organizações sociais espalhadas pela Venezuela, incluindo um grande número de coletivos operando em Caracas. Tais coletivos levam variadas oficinas às comunidades, de forma que possuem papel importante na formação política dos venezuelanos. São oficinas culturais, que vão desde a operação de rádios comunitárias até o hip hop e o circo, sempre de forma politizada e politizante, sempre com um fundo político fundamental. Os coletivos são, de modo geral, independentes do governo, mas muitos trabalham ombro a ombro com a parte institucional da revolução. Os muros grafitados estão por toda Caracas lembrando à população sua própria história e a luta atual, com referências a Bolívar, Sucre, Miranda, Che Guevara, Fidel Castro e Hugo Chávez.
Com as oficinas, a mídia alternativa e os muros, a política está por todos os lados. A polarização não deixa espaço para meios termos ou para a indiferença. Às vezes Chávez segue o povo, às vezes o povo segue Chávez. Liderança e liderados, lideranças e liderado, difícil determinar até que ponto as ordens vêm de baixo, até que ponto vêm de cima. Fato é que, nos últimos anos, a Venezuela se reinventou. Nas praças, discute-se o rumo do país, o petróleo e a revolução. “Há dez anos éramos todos ignorantes” é uma frase que se ouve facilmente, sempre complementada com o olhar sonhador da mudança em processo: “hoje sabemos quem somos e pra onde queremos ir”.
Alexandre Haubrich é jornalista e editor do Jornalismo B
domingo, 28 de agosto de 2011
Música de Domingo - Engenhiros do Hawaii
Por Melissa Laus Mattos
Tudo começou em Porto Alegre no ano de 1984. Devido à greve na faculdade de arquitetura, as aulas se estenderiam até janeiro de 85 e diante da situação a faculdade organizou happenings com os estudantes que produzissem arte na escola.
Humberto Gessinger (que na época tocava guitarra) ficou sabendo que Carlos Maltz tocava bateria. Os dois esbarraram em Marcelo Pitz, (baixista), e juntos decidiram participar da bagunça, ainda com a participação de Carlos Stein na guitarra (Nenhum de Nós), que logo deixou a banda.
Engenheiros do Hawaii???!
Na faculdade, os estudantes de arquitetura e engenharia se envolviam em rixas curriculares, filosóficas, estilos de vida opostos... Enfim, o pessoal da arquitetura inventou um apelido pra acabar com os inimigos. "Todo estudante de arquitetura é meio arrogante, acha que os engenheiros estão abaixo. Tinha um pessoal na engenharia que usava aquelas roupas de surfista, e, para irritá-los, nós fazíamos questão de chama-los de "engenheiros" e, mais do que isso, engenheiros do hawaii, que é um paraíso meio kitsch".
Na época, Porto Alegre e o Brasil presenciavam uma explosão de bandas punk, quase sempre com nomes heróicos: Cavaleiros do apocalipse, Virgens Nucleares, Legião Urbana, Titãs, Replicantes, Garotos de Rua etc... O que segundo Humberto também contribuiu para a adoção do nome: "Sempre me assustou essa coisa heróica da música pop, porque te leva a ser meio semideus. Engenheiros do Hawaii era um nome desmistificador, ninguém nos levaria muito a sério. É um nome que até hoje nos protege de nos encararem como sacerdotes".
11 de janeiro de 1985
Essa foi a data do primeiro show, por sinal coincidindo com a abertura do Rock in Rio I. Enquanto no Rio são soltas centenas de pombas da paz os três engenheiros apresentavam com um repertório variado que ia de "Ô Mônica, abrace o elefante...", passava pelo jingle do chocolate Sem Parar, Lady Laura (Roberto Carlos) até a abertura do seriado Hawaii 5.0, além de uma ou duas músicas próprias, todas tocadas em compasso de reggae. "O Marcelo adorava e era a coisa mais fácil de tocar" lembra Humberto.
Saindo da capital
Na semana seguinte tocaram na faculdade de medicina (palco das primeiras vaias), em um bar, em outro, em outro... De bar em bar resolveram viajar pelo interior do Rio Grande. "Chegávamos nas rádios de manhã com uma fita para o cara da rádio, ele tocava e fazíamos o show à noite. Foi quando aprendemos qual é o botão de volume e o do tom da guitarra".
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quinta-feira, 25 de agosto de 2011
Blog do Miro: Grileiro da Cutrale e laranjas da mídia
A mídia ruralista voltou a babar seu ódio contra o MST, que ontem ocupou novamente as terras griladas pela empresa Cutrale em Iaras, no interior de São Paulo. Na TV, âncoras e comentaristas criticaram a “invasão” e repetiram as cenas da destruição dos pés de laranja... em setembro de 2009. Apesar do Incra reafirmar que a área pertence a União, a mídia insiste em satanizar os sem-terra.
A ocupação da Cutrale faz parte da jornada de luta pela reforma agrária – que inclui um acampamento de 4 mil pessoas em Brasília e várias ações nos estados. A mídia nada fala das reivindicações do MST ou da absurda concentração fundiária no país. Prefere defender a “vítima” Cutrale – neste sentido, a ocupação serviu para noticiar, mesmo que de forma pejorativa, a luta pela reforma agrária.
A omissão criminosa
Nos momentos de confronto, a mídia hegemônica sempre toma partido. Ela fica ao lado dos poderosos, neste caso os barões do agronegócio, contra os trabalhadores. Ela até chega a ocultar denúncias que fez em períodos de maior calmaria. O caso da Cutrale é emblemático. As redações da imprensa conhecem bem as irregularidades desta empresa, mas preferem o silêncio criminoso.
Em maio de 2003, por exemplo, a revista Veja – talvez em mais uma ação mercenária - fez uma longa reportagem sobre a Cutrale. Ela revelou que a empresa é uma das mais ricas do mundo e que construiu o seu império de maneira predatória e ilegal. “O brasileiro José Luís Cutrale e sua família detêm 30% do mercado global de suco de laranja, quase a mesma participação da Opep no petróleo”.
Exploração, sonegação e remessa ilegal
Ainda segundo a revista, “o principal segredo do negócio consiste em adquirir a fruta a preço baixo – a preço de banana, brincam os fornecedores –, esmagá-lo pelo menor custo possível e vender o suco a um valor elevado”. Em 2001, o governo FHC chegou a investigar a altíssima lucratividade da Cutrale (nos anos 1980, ela teve taxas de retorno na ordem de 70%, um fenômeno raro).
“Uma autoridade da Receita Federal relatou a Veja que a estratégica para elevar a lucratividade do grupo passa por contabilizar parte dos resultados por intermédio de uma empresa sediada no paraíso fiscal das Ilhas Cayman. Com isso, informa a autoridade da Receita, a Cutrale conseguiria pagar menos impostos no Brasil”.
“Agressividade gerencial”
Em síntese, a revista Veja criticou a “agressividade gerencial da família Cutrale”, que já virou “uma lenda no interior paulista. Os plantadores de laranja no Brasil têm poucas opções para escoar a produção. Há apenas cinco grandes compradores da fruta e Cutrale é o maior deles. Por essa razão, acabam mantendo com o rei da laranja uma relação que mistura temor e dependência”.
“Por um lado, eles precisam que ele compre a produção. Por outro, assustam-se com alguns métodos adotados pela Cutrale para convencê-los a negociar as laranjas por um preço mais baixo”. Vários produtores relataram à revista a brutal pressão para baixar preços ou mesmo para adquirir suas fazendas, inclusive com sobrevôos ameaçadores de helicóptero e outros métodos terroristas.
Uma coleção de processos na Justiça
A bombástica reportagem simplesmente foi arquivada, assim como também foram esquecidos os inúmeros processos na Justiça contra a Cutrale por desrespeito aos direitos trabalhistas, crimes ambientais e pressão contra os lavradores. Somente de 1994 a 2003, a empresa foi alvo de cinco ações no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) por formação de cartel.
Para criminalizar a jornada nacional de luta pela reforma agrária, a mídia omite os crimes da Cutrale. A empresa vira uma santa; o MST é o demônio. A mídia “privada” sequer esclarece que as terras em Iaras não pertencem legalmente à Cutrale. Elas compõem o lote do Núcleo Monções, que possui cerca de 30 mil hectares pertencentes à União. Ou seja, elas foram griladas – roubadas!
Laranjas ou vendidos da mídia
Em 2007, a Justiça Federal cedeu a totalidade do imóvel ao Incra. Mas a empresa permanece na área com base em ações judiciais protelatórias. Desde que grilou as terras e passou a monopolizar a produção, milhares de pequenos e médios agricultores foram à falência e 280 mil hectares de pés de laranja foram destruídos. Mas a mídia só repete as cenas do trator em setembro de 2009.
Diante da riquíssima família Cutrale, com uma fortuna avaliada em US$ 5 bilhões, os colunistas da mídia são realmente laranjas! Já alguns pegam "carona" e se vendem!
sábado, 20 de agosto de 2011
Aécio? Mais com menos? Tenha dó!
Outro aparte, Senador?
Que o senador Aécio Neves expresse ideias e propostas para o Brasil, nada mais legítimo e democrático. Que ele o faça na mídia comercial e partidarizada (Folha de São Paulo), nada mais óbvio.
Mas, que ele use os exemplos de seus dois governos e o de seu substituto, aí fazemos mais um aparte. Seu pretexto é sempre o mesmo: uma suposta superioridade de gestão pública em Minas Gerais. O desfecho também: isso seria uma vacina contra a corrupção.
Ao criticar o inchaço da máquina pública, nomeações sem critérios técnicos e defender o zelo com o dinheiro do contribuinte, o senador mineiro aposta no esquecimento das denúncias sobre seu próprio governo e o de Anastasia.
A gestão e a propaganda da gestão
Primeiro, do ponto de vista da gestão: desde 2003 foram mais de 400 dispositivos abarcados por suas “leis delegadas”, instrumento muito mais precário que as medidas provisórias que ele critica no governo federal. Tais leis delegadas criaram um governo paralelo (o Escritório de Prioridades Estratégicas), ao lado do governo tradicional: este preenchido por cargos de indicação política e ausentes de critérios técnicos. São centenas filiados a partidos aliados de seu projeto, alguns com condenações, com investigações judiciais em andamento, com bens indisponíveis, que foram nomeados no atual governo, fruto de seus acordos políticos. Além do mais, que explicação ele dá para a nomeação de Papaleo Paes (AP), Wilson Santos (MT) e Jungmann (PE) alocados em empresas do governo mineiro?
A descontinuidade de gestão tem como prova as reformas e mini reformas administrativas feitas nos últimos nove anos aqui nas Gerais. Criam cargos, funções, alocam servidores cá, transferem para acolá, mudam tabelas salariais (só a educação tem quatro “modelos de remuneração”) e gastam fortunas com consultorias de duvidosa proficiência.
E os resultados? O fracasso da pseudo solução gerencial baseada no “estado para resultados” pode ser visto nos números do próprio governo: Minas produziu um falso déficit zero à base da contabilidade criativa (ou seja, marreta contábil) e seus resultados sociais são fortemente influenciados pelos programas sociais do governo federal. Qualquer análise contrafactual (a que exclui fatores exógenos no impacto de políticas públicas regionais) mostra a esquelética situação de Minas.
Aliás, nosso estado é o mais vulnerável em termos de desindustrialização, influenciado pela reprimarização da economia: ou seja, ficamos cada vez mais dependentes de commodities.
O complexo de vira lata
Em segundo lugar, questionamos suas indefectíveis pérolas.
Ele afirma que o governo Lula e o de Dilma “subverteram” princípios disseminados nos manuais contemporâneos de gestão e cita os Estados Unidos como exemplo de máquina administrativa enxuta.
Os tais manuais a que ele se refere são lixo conceitual criado na década de 1960 para dar contas dos dilemas da acumulação capitalista nas empresas privadas e que foram transmitidos ao estado, como um vírus letal: baseavam-se em estímulos financeiros aos executivos médios das empresas privadas, como forma de motivação. Isso fracassou no mundo e essa escória foi assimilada pela indigência mental de “acadêmicos” com complexo de vira lata (parafraseando Nelson Rodrigues) e transformada na nova ordem dos subalternos. Por isso Aécio diz que Lula e Dilma “subverteram” seus manuais. Ora, os manuais são dele e não constituíam ordem estabelecida no Estado brasileiro! Ao invés de usar literatura de aeroporto para se instruírem, seus assessores deveriam ler “O Novo Espírito do Capitalismo” (Boltansky, Chiapello) e ver que a solução capitalista para o capitalismo fracassou no próprio berço de origem. Por que seriam remédio para o setor público?
Além do mais ele cita, novamente, os Estados Unidos como exemplo de gestão e enxugamento. Vamos desenhar para ver se ele entende: o déficit público dos EUA (formal) já ultrapassa os 15 trilhões de dólares. Essa cifra pode ser bem maior! Mas “só” isso já equivale a 100% do PIB daquele país. Especialistas dizem que tal déficit supera o que foi divulgado, se consideradas outras variáveis. Tudo isso é causado pelo financiamento de uma política pública nada exemplar: guerras que, no governo Bush, custaram US$ 6 trilhões! O mercado financeiro se derrete, por conta disso. A dita responsabilidade fiscal nunca existiu nos EUA. Os calotes financeiros são comuns lá, em tempos de crise. É isso que Aécio sugere para o Brasil?
E olhe que os EUA e os gigantes que quebraram o mundo em 2008 usaram as ditas ferramentas gerenciais em seus “planejamentos estratégicos” e gestões “orientadas para resultados”.
Quanto à corrupção, perguntamos a Aécio Neves: por que não deixa instalar CPI´s na Assembleia Legislativa de Minas Gerais? Por que seu governo teve menos CPI´s do que na Ditadura Militar? Por que não topa esclarecer o caso “Arco Iris”, o superfaturamento nas obras do Mineirão, do Centro Administrativo, o escândalo do IEF, o jatinho da Banjet, maracutaia Fasano/IPSEMG etc?
sexta-feira, 19 de agosto de 2011
Boaventura de Souza Santos: O sequestro da democracia
Via Carta Maior
Os violentos distúrbios ocorridos na Inglaterra não devem ser vistos como um fenômeno isolado. Eles representam um perturbador sinal dos tempos. Sem se dar conta, as sociedades contemporâneas estão gerando um combustível altamente inflamável que flui nos subsolos da vida coletiva. Quando chegam à superfície, podem provocar um incêndio social de proporções inimagináveis.
Trata-se de um combustível constituído pela mistura de quatro componentes: a promoção conjunta da desigualdade social e do individualismo, a mercantilização da vida individual e coletiva, a prática do racismo em nome da tolerância e o sequestro da democracia por elites privilegiadas, com a consequente transformação da política na administração do roubo “legal” dos cidadãos e do mal estar que provoca.
Cada um destes componentes têm uma contradição interna: quando se superpõem, qualquer incidente pode provocar uma explosão.
- Desigualdade e individualismo. Com o neoliberalismo, o aumento brutal da desigualdade social deixou de ser um problema para passar a ser uma solução. A ostentação dos ricos e dos multimilionários transformou-se na prova do êxito de um modelo social que só deixa miséria para a imensa maioria dos cidadãos, supostamente porque estes não esforçam o suficiente para ter sucesso na vida. Isso só foi possível com a conversão do individualismo em um valor absoluto, o qual, paradoxalmente, só pode ser experimentado como uma utopia da igualdade, a possibilidade de que todos prescindam igualmente da solidariedade social, seja como seus agentes, seja como seus beneficiários. Para o indivíduo assim concebido, a desigualdade unicamente é um problema quando ela é adversa a ele e, quando isso ocorre, nunca é reconhecida como merecida.
- Mercantilização da vida. A sociedade de consumo consiste na substituição das relações entre pessoas pelas relações entre pessoas e coisas. Os objetos de consumo deixam de satisfazer necessidades para criá-las incessantemente e o investimento pessoal neles é tão intenso quando se tem como quando não se tem. Os centros comerciais são a visão espectral de uma rede de relações sociais que começa e termina nos objetos. O capital, com sua sede infinita de lucros, submeteu à lógica mercantil bens que sempre pensamos que eram demasiado comuns (como a água e o ar) ou demasiado pessoais (a intimidade e as convicções políticas) para serem comercializados no mercado. Entre acreditar que o dinheiro media tudo e acreditar que se pode fazer tudo para obtê-lo há um passo muito menor do que se pensa. Os poderosos dão esse passo todos os dias sem que nada ocorra a eles. Os despossuídos, que pensam que podem fazer o mesmo, terminam nas prisões.
- O racismo da tolerância. Os distúrbios na Inglaterra começaram com uma dimensão racial. O mesmo ocorreu em 1981 e nos distúrbios que sacudiram a França em 2005. Não é uma coincidência: são irrupções da sociabilidade colonial que continua dominando nossas sociedades, décadas depois do fim do colonialismo político. O racismo é apenas um componente, já que em todos os distúrbios mencionados participaram jovens de diversos grupos étnicos. Mas é importante, porque reúne a exclusão social com um elemento de insondável corrosão da autoestima, a inferioridade do ser agravada pela inferioridade do ter. Em nossas cidades, um jovem negro vive cotidianamente sob uma suspeita social que existe independentemente do que ele ou ela seja ou faça. E esta suspeita é muito mais virulenta quando se produz em uma sociedade distraída pelas políticas oficiais de luta contra a discriminação e pela fachada do multiculturalismo e da benevolência da tolerância.
- O sequestro da democracia. O que há em comum entre os distúrbios na Inglaterra e a destruição do bem estar dos cidadãos provocada pelas políticas de austeridade dirigidas pelas agências classificadoras e os mercados financeiros? Ambos são sinais das extremas limitações da ordem democrática. Os jovens rebeldes cometeram delitos, mas não estamos frente a uma “pura e simples” delinquência, como afirmou o primeiro ministro David Cameron. Estamos frente a uma denúncia política violenta de um modelo social e político que tem recursos para resgatar os bancos, mas não para resgatar os jovens de uma vida de espera sem esperança, do pesadelo de uma educação cada vez mais cara e irrelevante dado o aumento do desemprego, do completo abandono em comunidades que as políticas públicas antissociais transformaram em campos de treinamento da raiva, da anomia e da rebelião.
Entre o poder neoliberal instalado e os rebeldes urbanos há uma simetria perturbadora. A indiferença social, a arrogância, a distribuição injusta dos sacrifícios estão semeando o caos, a violência e o medo, e aqueles que estão realizando essa semeadura vão dizer amanhã, genuinamente ofendidos, que o que eles semearam nada tinha a ver com o caos, a violência e o medo instalados nas ruas de nossas cidades. Os que promovem a desordem estão no poder e poderiam ser imitados por aqueles que não têm poder para colocá-los em ordem.
domingo, 14 de agosto de 2011
Música de Domingo - Oswaldo Montenegro
Uma pequena homenagem a meu querido pai – que faz, desde os meus dez anos de idade, o papel de pai e mãe – e um muito obrigado a meus filhos Alencar e João por me amarem tanto.
O resto Oswaldo Montenegro canta na composição de Roberto Carlos.
sábado, 13 de agosto de 2011
David Harvey: "vivemos em uma sociedade na qual o próprio capitalismo se tornou besta fera rampante"
O capitalismo bestial ataca nas ruas
Tradução pescada no Viomundo
“Adolescentes niilistas e bestiais”. Foi como o Daily Mail apresentou-os: os jovens enlouquecidos, vindos de todas as vias da vida, que correram pelas ruas sem pensar, desesperadamente atirando tijolos, pedras e garrafas contra os policiais, saqueando aqui, incendiando ali, levando as autoridades a uma também enlouquecida caçada de salve-se quem puder/agarre o que conseguir, enquanto os jovens iam alterando seus alvos estratégicos, saltando de um para outro.
A palavra “bestial” saltou-me à vista. Lembrou-me que os communards em Paris em 1871 foram mostrados como animais selvagens, como hienas, que mereciam ser (como foram, em vários casos) sumariamente executados, em nome da santidade da propriedade privada, da moralidade, da religião e da família. Mas em seguida a palavra trouxe-me outra associação: Tony Blair atacando a “mídia bestial”, depois de ter vivido por tanto tempo confortavelmente alojado no bolso esquerdo de Rupert Murdoch, até que Murdoch meteu a mão no bolso direito e de lá tirou David Cameron.
Evidentemente haverá o debate histérico de sempre entre os sempre prontos a ver a agitação das ruas como questão de pura, simples e imperdoável criminalidade, e os ansiosos por contextualizar eventos em termos de polícia incompetente; de eterno racismo e injustificada perseguição aos jovens e às minorias; de desemprego em massa entre os jovens; de pauperização incontrolável da sociedade; de uma política autista de austeridade que nada tem a ver com a economia e tudo tem a ver com a perpetuação e a consolidação da riqueza e do poder individuais. Haverá até quem condene o sem sentido e a alienação de tantos trabalhos e empregos e tal desperdício da vida de todos os dias, de tão imenso, mas desigualmente distribuído, potencial para o florescimento humano.
Se tivermos sorte, haverá comissões e relatórios que dirão tudo, outra vez, que já foi dito sobre Brixton e Toxteth nos anos Thatcher. Digo “sorte”, porque os instintos bestiais do atual primeiro-ministro parecem tender mais a mandar usar canhões d’água, a convocar a brigada do gás lacrimogêneo e a usar balas revestidas de borracha, ao mesmo tempo em que ele untuosamente pontifica sobre a perda da bússola moral, o declínio da civilidade e a triste deterioração dos valores da família e da disciplina entre os jovens sem lar.
Mas o problema é que vivemos em sociedade na qual o próprio capitalismo se tornou besta fera rampante. Políticos-feras mentem nos gastos, banqueiros-feras assaltam a bolsa pública até o último vintém, altos executivos, operadores de hedge funds e gênios do lucro privado saqueiam o mundo dos ricos, empresas de telefonia e cartões de crédito cobram misteriosas tarifas nas contas de todos, varejistas aumentam preços, por baixo do chapéu artistas vigaristas e golpistas aplicam seus golpes até entre os mais altos escalões do mundo corporativo e político.
Uma economia política de saqueio das massas, de práticas predatórias que chegam ao assalto à luz do dia, sempre contra os mais pobres e vulneráveis, os simples e desprotegidos pela lei – isso é hoje a ordem do dia. Alguém ainda crê que seja possível encontrar um capitalista honesto, um banqueiro honesto, um político honesto, um comerciante honesto ou um delegado de polícia honesto? Sim, existem. Mas só como minoria, que todos os demais consideram idiotas. Seja esperto. Passe a mão no lucro fácil. Fraude, roube! A probabilidade de ser apanhado é baixa. E em qualquer caso, há muitos meios para proteger a fortuna pessoal e impedir que seja tocada pelos golpes das corporações.
Tudo isso, dito assim, talvez choque. Muitos de nós não veem, porque não queremos ver. Claro que nenhum político atreve-se a dizer essas coisas e a imprensa só publicaria, se algum dia publicasse, para escarnecer de quem dissesse. Mas acho que todos os que correm pelas ruas agitando a cidade sabem exatamente a que me refiro. Estão fazendo o que todos fazem, embora de modo diferente – mais flagrante, mais visível, nas ruas. O Thatcherismo despertou os instintos bestiais do capitalismo (o “espírito animal” do empreendedor, como o chamam timidamente) e, desde então, nada surgiu que os domasse. Destruir e queimar é hoje a palavra de ordem das classes dominantes, de fato, em todo o mundo.
Essa é a nova normalidade sob a qual vivemos. Isso deveria preocupar o presidente do inquérito que logo será nomeado. Todos, não só os jovens agitadores, devem ser chamados à falas. O capitalismo bestial deve ser levado a julgamento por crimes contra a humanidade, tanto quanto por crimes contra a natureza.
Infelizmente, isso é o que os agitadores nem veem nem exigem. Tudo conspira para nos impedir de ver ou exigir exatamente isso. Por isso o poder político tão facilmente se traveste na roupagem da moralidade e de uma razão repugnante, de modo que ninguém veja a corrupção nua e a irracional estupidez.
Mas há réstias de esperança e luz em todo o mundo. O movimento dos indignados na Espanha e na Grécia, os impulsos revolucionários na América Latina, os movimentos camponeses na Ásia, todos esses começam a ver através da imundície que o capitalismo global, predatório, bestial lançou sobre o mundo. O que ainda falta para que todos vejamos e comecemos a agir? Como se poderá começar tudo outra vez? Que rumo tomar? As respostas não são fáceis. Mas uma coisa já se sabe: só chegaremos às respostas certas, se fizermos as perguntas certas.
David Harvey é um geógrafo britânico, formado na Universidade de Cambridge. Professor da City University of New York e trabalha com diversas questões ligadas à geografia urbana.
terça-feira, 9 de agosto de 2011
Londres em chamas
Com Londres literalmente em chamas, não dá pra ficar sem lembrar do som punk dos anos 1970 com as duas maiores bandas do gênero : The Clash (London’s Burnig) e Sex Pistols (Anarchy in the UK).
segunda-feira, 8 de agosto de 2011
Geraldo Thadeu fala...fala...fala.. e não esclarece nada
O nobre e probo deputado Geraldo Thadeu em entrevista a um programa da Rádio Cultura de Poços de Caldas foi peremptório ao negar as acusações feitas pela revista Época no fim de semana e chegou, segundo o Pensa Poços, até a se emocionar.
A entrevista na Rádio Cultura fez parte da peregrinação pelos meios de comunicação da cidade a fim de dar explicações. Obviamente que o deputado tem o direito de se defender e, mais ainda, caso a revista das Organizações Globo esteja de alguma forma agindo de má fé, é dever do deputado buscar meios legais de fazê-la reparar possíveis danos morais.
No entanto algumas dúvidas ainda persistem e eu gostaria que o deputado Geraldo Thadeu as esclarecesse:
1-A revista Época afirma com todas as letras que ao procurar o deputado “(...)primeiro ele tentou negar a doação das passagens. Informado sobre os comprovantes, disse que, como não havia regras claras, podia fazer o que quisesse com sua cota(...)”. Então, o deputado doou ou não passagens para o empresário Fernando Marques? Essa doação é ilegal, como afirmam procuradores da República, ou utilizar dinheiro público – do contribuinte que paga impostos – é algo moralmente aceitável e dentro dos parâmetros da Lei?
2-O fato de ter recebido oficialmente R$ 406 mil de empresas do grupo União Química em forma de doação de campanha e agora atuar para modificar um projeto aprovado pelo Senado que autoriza a produção e venda de medicamentos genéricos para animais, o que, caso obtenha êxito, favorecerá dentre outras empresas a uma do grupo União Química, é antiético? Ou deputados defenderem interesses de empresários que contribuíram com suas campanhas eleitorais não possui nada de extraordinário ou que vá de encontro à ética na vida pública?
3-Segundo a matéria de Época Vossa Excelência, o deputado Geraldo Thadeu, confirmou ter levado o empresário Fernando Marques para um encontro com o então ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, em busca de apoio para a construção de uma fábrica de medicamentos em Brasília. Vossa Excelência disse que não se tratava de tráfico de influência – o que está nas entrelinhas da matéria –, mas, sim, de preocupação com o desenvolvimento de Brasília. Então fica no ar mais uma dúvida: é comum entre os deputados federais, que não seja um dos oito eleitos pelo Distrito Federal, levar empresários para encontro com ministros de Estado a fim de juntos tratarem de temas referentes ao desenvolvimento regional do Distrito Federal?
Ademais, será que Geraldo Thadeu pode compartilhar conosco algum caso especifico em que deputados brasilienses se interessaram por assuntos referentes ao desenvolvimento regional do Sul de Minas? Obviamente sei que o voto no Brasil não é distrital, mas também não me parece usual deputados federais mineiros interferirem diretamente em assuntos que digam respeito ao desenvolvimento econômico regional do Distrito Federal, de São Paulo ou do Rio Grande do Sul. Ou então deputados federais fluminenses se interessarem diretamente no desenvolvimento da Bahia, do Pará ou de Santa Catarina, inclusive intermediando reuniões entre empresários e ministros de Estado.
domingo, 7 de agosto de 2011
O nobre e probo deputado Geraldo Thadeu
O nobre e probo deputado federal Geraldo Thadeu, por enquanto PPS, mas de malas prontas para o PSD, deve ter tido uma baita dor de cabeça nesse fim de semana ao ver que a população de Poços de Caldas foi surpreendida com uma matéria da revista Época onde o personagem principal é justamente vossa excelência. E não é uma matéria cheia de elogios como as que sempre são veiculadas pela imprensa poços-caldense. Tampouco reportagem mostrando o deputado em alguma inauguração de obras do governo federal, coisa que Geraldo Thadeu adora fazer parecendo que ele é o responsável por tais obras.
Geraldo Thadeu, que já foi prefeito de Poços de Caldas entre 1997-2000 e está no terceiro mandato consecutivo como deputado federal – o primeiro pelo PSDB e os dois últimos pelo PPS – é personagem duma matéria publicada pela revista Época onde vem à tona suas relações com o empresário Fernando Marques, dono do laboratório União Química Farmacêutica. Segundo a matéria Geraldo Thadeu cedeu a Fernando Marques cerca de R$ 100 mil da cota de passagens aéreas que a Câmara lhe dá para o exercício do mandato parlamentar. Atitude já classificada como ilegal por procuradores da República. Bem que o deputado tentou negar tais doações, mas viu-se obrigado a admitir a atitude uma vez que a Revista tinha em mãos recibos que comprovavam a denúncia.
A fonte de Época é Daniel Tavares, ex-assessor de Geraldo Thadeu, que faz outras denúncias. Por exemplo, enquanto trabalhou para o deputado ficou encarregado de prestar serviços a Marques toda vez que este desembarcasse em Brasília. Tavares se aproximou tanto de Marques que acabou mudando de emprego e indo trabalhar para o próprio empresário. Nesse período diz ter participado da entrega de duas picapes importadas para o deputado, sendo este gesto uma retribuição de Fernando Marques à cota de passagens doada pelo parlamentar. Diz ainda, sem apresentar provas, que fez vários pagamentos a Geraldo Thadeu a pedido de Fernando Marques.
Por uma dessas coincidências da vida Geraldo Thadeu hoje luta para modificar um projeto aprovado pelo Senado que autoriza a produção e venda de medicamentos genéricos para animais. Se tiver sucesso, a mudança vai beneficiar a Agener União Saúde Animal, divisão veterinária da União Química. Seu propósito é derrubar a exigência de um teste de resíduo. Trata-se de um exame que identifica quanto tempo o medicamento fica no tecido muscular do animal. O objetivo é evitar riscos para a saúde humana. Mais, Geraldo Thadeu recebeu como doação de campanha R$ 406 mil de três empresas de Marques, esse valor é quase metade de todas as doações declaradas pelo deputado.
Minha dúvida agora é saber se a imprensa independente e imparcial de Poços de Caldas vai simplesmente ignorar o assunto, fazendo de conta que não há nada de podre no Reino da Dinamarca, ou se apenas publicará a versão do nobre e probo deputado Geraldo Thadeu.