Revista Época
Edição 114 (24/07/2000)
Os efeitos de um vírus palaciano
O governo reage a investigações em empresas vinculadas a Eduardo Jorge, o ex-secretário de FH que se define como “uma doença”
O presidente Fernando Henrique Cardoso, nas duas últimas semanas, não divertiu nenhum interlocutor com o que ele próprio considera uma de suas maiores virtudes: transformar em piadas certos fatos que o incluem como protagonista ou coadjuvante indispensável. Abatido, tenso, apático, o presidente não tem respondido de pronto às indagações que ouve. Limita-se a fitar quem pergunta com olhar vago. As denúncias contra Eduardo Jorge Caldas Pereira – ex-secretário-geral da Presidência que multiplicou seus lucros na iniciativa privada graças ao tráfico de influência – explicam a mudança.
Desde a última segunda-feira, Eduardo Jorge recorre a tranqüilizantes para tentar manter a serenidade. Tem crises de choro. Passa horas trancado no escritório de casa, solitário, reunindo documentos e esboçando o texto de uma defesa judicial. No dia 6 de julho, telefonou para o gabinete de FH no Palácio do Planalto tentando explicar a entrevista concedida ao jornal Valor Econômico. Entre outras revelações, ele informara que o juiz foragido Nicolau dos Santos Neto ajudava o governo a selecionar candidatos a juiz classista para auxiliar o andamento do Plano Real. Foi a última conversa com o antigo chefe. Eles trabalharam juntos por 17 anos, desde que Eduardo Jorge ocupou a chefia de gabinete de Fernando Henrique no Senado. “Tornei-me um vírus. Pareço uma doença ambulante”, reclamou Eduardo Jorge com um amigo.
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Ele e o advogado José Gerardo Grossi tentam explicar ao Ministério Público, ao Congresso Nacional e à imprensa que os negócios do ex-secretário-geral de FH não se misturaram com a dilapidação dos cofres públicos promovida pelo juiz Nicolau durante as obras de construção do novo fórum trabalhista de São Paulo. Elegeram Luiz Francisco de Souza, procurador da República, o maior adversário da defesa que elaboram. “Vou até onde precisar ir. Quebrarei todos os sigilos necessários”, ameaça Luiz Francisco.
A família Caldas Pereira e os negócios do ex-secretário sofrem o contágio desencadeado pelo vírus. Na última quinta-feira, o gupo Meta obrigou Eduardo Jorge a desligar-se de seu conselho. Ele tinha 10% das ações da Metacor e Metaplan, empresas especializadas em corretagem de seguros para o governo. A Meta era apenas uma das companhias a que o ex-secretário presidencial se ligou ao trocar o governo pelo lobby. Em 1998 ele criou a EJP Consultores Associados, uma consultoria política. Também é sócio da LC Faria Consultores. No papel, tem apenas 1% das ações. O Ministério Público diz que a participação real é maior. Eduardo Jorge recusa-se a revelar o nome de seus clientes. Afirma que jamais usou a influência política adquirida nos quatro anos em que despachou na ante-sala do gabinete do presidente para intermediar negócios no governo. Várias denúncias sugerem o contrário. Ele participou de reuniões no Ministério dos Transportes para defender interesses da Transroll, empresa de transporte de cargas. Conseguiu que a legislação mantivesse uma reserva de mercado beneficiando seu cliente. Em 1998, grampo telefônico ilegal montado no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) flagrou conversas em que Eduardo Jorge cobrava de seu presidente, André Lara Resende, operação de socorro para o frigorífico Chapecó, de Santa Catarina. A empresa recebeu um aporte de R$ 54 milhões sem dar as garantias necessárias.
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Todas as empresas que mantiveram vínculos com Eduardo Jorge, tendo-o como sócio ou consultor, serão investigadas pelo Ministério Público. Os procuradores querem rastrear as ligações do ex-secretário da Presidência com funcionários do governo. O escritório Caldas Pereira Advogados e Consultores Associados, que reúne dois irmãos e uma sobrinha do ex-secretário de FH, foi contratado pela Organização das Cooperativas Brasileiras em julho de 1997 para tentar reduzir a carga tributária imposta pela Receita Federal. Receberia R$ 5,04 milhões se tivesse sucesso. O trabalho foi malsucedido. Mesmo assim, os advogados receberam R$ 645 mil. A acusação incomodou Eduardo Jorge. Marcos Jorge Caldas Pereira, seu irmão e chefe da banca, atua como advogado tributarista há 15 anos e o escritório é um dos mais tradicionais de Brasília.
Há outros integrantes da família Caldas Pereira que estão ou já foram bem posicionados na administração de Fernando Henrique. Maria Delith, uma das irmãs de Eduardo Jorge, é diretora-executiva do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). Ganha um salário de R$ 17,5 mil. O sociólogo Fernando Jorge Caldas Pereira chefia o escritório brasiliense da MCI, empresa contratada pelo Palácio do Planalto e pelo PSDB para realizar pesquisas de opinião pública. De 1996 até hoje a MCI recebeu R$ 9,5 milhões do governo. Outro irmão de Eduardo Jorge, o almirante da reserva Tarcísio Jorge, era presidente da Casa da Moeda. Foi demitido na primeira semana de julho. Recebia R$ 10,4 mil por mês.
Assessores do Palácio do Planalto tentam isolar o vírus da crise. Alegam que todas as associações do ex-secretário-geral da Presidência com empresas privadas e suas tentativas de lobby ocorreram depois que ele saiu do governo. Em abril de 1998 Eduardo Jorge deixou a sala que ocupava no 3º andar do palácio, a 20 metros do gabinete presidencial, e assumiu a coordenação da campanha de reeleição. Não voltou mais para o governo. A amigos, Eduardo Jorge Caldas Pereira ressalta a admiração que ainda cultiva por Fernando Henrique. “Perguntam-me qual o limite da lealdade que tenho para com o presidente. Digo sempre que essa lealdade não tem limites”, define nos desabafos. O presidente Fernando Henrique delimitou a extensão do cordão sanitário que usará, a partir desta semana, para impedir que o governo siga contaminado pelas suspeitas que atingem Eduardo Jorge. Em agosto, quando o Congresso Nacional suspender o recesso, não trabalhará para evitar a convocação do ex-assessor. Mas usará toda a força parlamentar de que dispõe para barrar a tentativa da oposição que pretende instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a apurar o caso. “Uma CPI é desnecessária. Eduardo Jorge não é o governo”, desabafou FH com um de seus líderes. O presidente precisa convencer congressistas e promotores de que o ex-secretário tem mesmo o figurino que ele deseja que tenha.
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4 comentários:
Pois é Hudson:
Nesse "imbroglio" todo, sobre o tal Eduardo Jorge, o que foi feito ao pobre do Procurador dsa República Luiz Francisco de Souza? Calaram-no para sempre, pois que não dá mais entrevistas, não toca mais no assunto dessa pouca vergonha que emporcalhou todo o governo (?) Fernando Henrique - mais um patife que só fez perseguir os pobres, os aposentados chamando-os de vagabundos e tantos o outros mais.
Ele, o Vampiro, chegou a reclamar que os idosos aposentados estavam vivendo muito! E ele, o canalha? Não estava na hora de "bater as botas?"
Pois bem: mostrem-me um só governo - desses todos no período de 40 anos - que tenha pautado seu comportamento orientado pela bússola da ética. Não há um só sem uma sujidade, por menor que seja. E ainda que seja insignificante, face a outros mais sujos, ainda assim se torna imperdoável. A mim, meu caro amigo, não há um só político(a)que seja íntegro(a). Será que antes de eu morrer terei a felicidade de ter um cidadão apenas preocupado em governar com o povo e para o povo? Um país é de um povo em geral, não de uma súcia de homens de momento, de quadrilheiros, de mentirosos e mal intencionados. E é isso que sempre tivemos desde priscas Eras, desde quando se instalou a Primeira República. Congratulo-me pelo dia em que eu me afastar definitivamente deste mundo que parece mais um lupanar de consciências fétidas e mal formadas, salvo erro ou omissão.
Abraços.
Recordar é viver. Todo mundo rouba e diz que faz. Quero saber o que foi feito com o dinheiro ROUBADO pelo grupo TERRORISTA da Dilma.
Agora o Hudson foi no ano 2000 buscar assunto. Proponho que ele pesquise também sobre o escândalo do Dom Pedro I, que marcava pangarés como se fossem cavalos "imperiais"... Se fuçar vai descobrir que o Serra tem ligação com o imperador... rsrsrs.
J Evaristo
Você me deu uma ideia. Com certeza os tucanos andam aprontando desde os tempos de D. Pedro. Ou mlhor, desde o dia em que Cabral pôs os pés aqui.
Falando sério. O caso do EJ é didático, afinal ele hoje é o vice-presidente do partido da ética, moral e bons costumes.
Entendo, mas se seguir esse ideia chegamos fácil a conclusão de que esse povo do PSDB é muito bom de relações enquanto os do PT caem como moscas a qualquer denúncia. Veja que são opositores e nao creio que o PT e os que integram a rede de aparelhamento sejam tão incapazes de encanar ao menos um rival.
Abç.
JE
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